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A guinada de Elmano na Segurança
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Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.

A guinada de Elmano na Segurança

Desde a nomeação de Roberto Sá, o governador passou a adotar uma terminologia beligerante, mais frequente no vocabulário de uma direita bolsonarista do que num quadro de partido de esquerda
Governador Elmano de Freitas (PT) e a guinada no discurso de enfrentamento à violência (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Governador Elmano de Freitas (PT) e a guinada no discurso de enfrentamento à violência

Ao menos no plano do discurso, o governador Elmano de Freitas (PT) deu uma guinada no âmbito da Segurança Pública, entendida como área-problema não apenas da sua gestão, mas das de Cid Gomes (PSB) e de Camilo Santana (PT), dois antecessores imediatos na administração.

Desde a nomeação de Roberto Sá para a SSPDS, conforme a coluna havia indicado, o chefe do Executivo passou a adotar uma terminologia beligerante, mais frequente no vocabulário de uma direita bolsonarista do que num quadro de partido de esquerda.

Em entrevista ao O Globo no fim de semana, o governador não apenas admitiu a mudança, mas foi além: disse que o seu campo político precisa tratar a segurança noutros termos - no que tem razão -, algo que o próprio governo de Lula tem se mostrado resistente a fazer.

Sob pressão de uma eleição municipal da qual depende também seu sucesso político futuro, Elmano tem avançado num terreno no qual pré-candidatos situados à direita nadavam sem concorrência até ontem. Óbvio que apenas discurso não produz resultado, mas a modulação na postura e na estratégia do Abolição já é sinal de uma reposição do governador.  

Do Ronda ao Ceará Pacífico

A tônica dos anos de Cid (2006/2014) à frente do Governo foi a política do Ronda do Quarteirão, um policiamento de vizinhança e proximidade cuja definição se opunha àquilo que se via representado, por exemplo, na Ronda de Ações Intensivas e Ostensivas (Raio), criada apenas dois anos antes da chegada do Ferreira Gomes ao poder.

As condições a partir das quais o Ronda foi instituído, porém, eram até semelhantes às de agora: altos índices de criminalidade e autoridades públicas demandadas por ações concretas. A resposta de Cid se deu com essa tentativa de aliar inteligência e tecnologia numa "nova polícia" - na técnica e na roupagem (viaturas luxuosas, fardamento diferenciado etc.). Durante a lua de mel, havia euforia à passagem do Ronda pelas ruas da Capital.

A resposta de Camilo

Corta para 2015: em meio a outra crise na segurança depois do esgotamento do modelo do Ronda, o então governador Camilo Santana atacou em duas frentes quando instado a conter a escalada dos números de homicídios.

Primeiro, com o "Pacto pelo Ceará Pacífico", um programa interssetorial englobando atividades planejadas e distribuídas entre atores diversos da sociedade civil, com base em eixos que incluíam desde emprego até saúde e educação.

Ou seja, houve, naquele momento crítico, a compreensão de que a violência era um problema cuja resolução exigia uma análise multifatorial. A cargo da vice-governadora à época, Izolda Cela, o Ceará Pacífico teve, no entanto, dificuldades para se tornar efetivo, sendo gradativamente desmobilizado em favor de outro tipo de política: a do Raio.

Foi principalmente no 2º mandato de Camilo que o policiamento ostensivo se interiorizou, tornando-se o que o Ronda havia sido para Cid: uma marca.

A política da caçada

A aposta de Elmano na linha-dura contra a criminalidade é mais do que uma volta no parafuso na inflexão levada a cabo por Camilo após a insuficiência do Ronda e do Raio. Embora todos esses gestores tenham recorrido ao aparato policial como ferramenta no enfrentamento da violência, a retórica predominante nunca havia sido a de "caçar bandidos", a despeito de todas as barbaridades.

A virada que se vê agora, portanto, é sobretudo decorrente de uma mudança no ecossistema político, com o avanço do bolsonarismo no Congresso (vide Lula emparedado e as votações sucessivas de itens de um receituário punitivista passando de roldão). É nesse cenário, e às portas de uma eleição, que as declarações recentes de Elmano e também de Camilo sinalizam para uma releitura da pauta da segurança sob uma outra chave.

Foto do Henrique Araújo

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