Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
Foto: Aurélio Alves / Fco Fontenele
Evandro Leitão e José Sarto
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A menos de um mês da posse de Evandro Leitão (PT) como prefeito de Fortaleza, a base do petista, encorajada pelo sucessor de José Sarto (PDT), faz avançar a passos largos a tese da "herança maldita" - para a qual talvez o próprio chefe do Executivo esteja contribuindo ao se manter em silêncio, sem desfazer nem reiterar os nós nos quais se vê enredado pelos vitoriosos de 2024.
É natural do jogo que o governo de chegada superdimensione as dificuldades eventuais encontradas pelo caminho da transição com o governo de saída, de modo até a justificar antecipadamente qualquer demora na execução de programas e ações previstas para a nova administração. Do outro lado, mesmo uma parcela de má vontade ou de resistência se inscrevem no espaço precificado da disputa entre blocos diferentes que, embora tenham deixado as eleições para trás, seguem medindo forças.
Feita essa ressalva, trata-se então de separar o ruído tão-somente do que é estratégia menos republicana, digamos assim, seja a de pespegar no adversário malfeitos superiores aos verificados, seja a de tornar acidentada a mudança de gestão a fim de criar embaraços para o candidato vencedor.
Alinhamento: discurso e prática
Para maximizar os dividendos políticos de seu grupo, não basta fazer parecer maior o atropelo da reta final do mandato único de Sarto. É preciso mostrar também que a promessa de ganho com o alinhamento administrativo (prefeitura, governos estadual e federal e ministério) não se constituía apenas como retórica eleitoral esvaziada de sentido prático.
É o que Evandro tem feito agora, ao redobrar agendas em Brasília, das quais retorna com recursos empenhados ou assegurados para sanar problemas imediatos da capital cearense, tais como o do IJF, pivô da rusga mais recente entre o petista e o prefeito atual. A estratégia é inteligente não somente por se tratar de uma tradução eficaz do discurso de campanha, mas por apontar caminhos para o governo futuro, cujo sucesso depende da capacidade de conversão do capital da aliança em benefícios concretos para os fortalezenses.
Obviamente que o exercício de contraste com uma gestão mal avaliada potencializa as qualidades de quem sucede - daí os esforços do entorno de Evandro contra Sarto, que não tem sabido responder à altura a essa blitzkrieg.
Há um inegável elemento de comicidade em todo o episódio do "rompimento de Schrödinger" do senador Cid Gomes (PSB), para quem só haveria ruptura com o governador Elmano de Freitas na hipótese de ele mesmo (Cid) comunicar tal fato de público, no que talvez tenha alguma razão. Sabe-se, no entanto, que o ex-governador foi meridianamente claro sobre o assunto em conversa com aliados, dando as relações com o Abolição por encerradas.
A esse respeito, Cid poderia dizer até que reconsiderou a posição, atribuindo-a a um rompante ocasional, e recuou - como também retrocedeu Elmano, ao abrir mão de seu candidato em favor de Romeu Aldigueri. Seria até pedagógico, afinal não se veem tantos gestos assim na política.
Na mesma coluna de 30/10, registrei que Elmano, que já tinha movido peças no seu time, "ainda se queixava de relativa demora na resolutividade, daí a possibilidade de mais uma dança das cadeiras pouco tempo depois daquela primeira chacoalhada". A ver como se sai essa segunda rodada de mudanças.
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