Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
Michelle criticou a aliança entre André Fernandes (PL) e Ciro Gomes (PSDB) para o governo do Ceará. A fala tensiona a direita e expõe a disputa pelo capital político de Bolsonaro
Foto: JÚLIO CAESAR
Lançamento da pré-candidatura de Eduardo Girão ao governo do Ceará, marcada por críticas da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro
De passagem por Fortaleza ontem, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro rachou a direita no Ceará ao criticar a aliança entre o deputado federal André Fernandes (PL) e o ex-presidenciável Ciro Gomes (PSDB) para o Governo do Estado, classificando-a como "precipitada".
Durante o lançamento da pré-candidatura do senador Eduardo Girão, a quem se referiu como postulante ao Abolição, Michelle foi além, ressaltando os ataques sucessivos de Ciro contra os Bolsonaro e pedindo convergência em torno do nome do Novo: "Todos aqui são Girão", disse, enquanto organizava os aliados presentes para uma foto, entre os quais Fernandes, que "deveria ficar pendurada no espelho do banheiro".
A ênfase da esposa do ex-presidente Jair Bolsonaro deve criar dificuldades para a costura que o dirigente do PL no Ceará vem tentando fazer, de modo a reforçar o palanque da oposição na corrida do ano que vem. Ao descartar uma chapa encabeçada por Ciro contra o governador Elmano de Freitas (PT), que vai pleitear a reeleição, Michelle aposta numa composição "puro-sangue", com quadros do PL - a expectativa é de que Girão se filie à legenda para concorrer ao Executivo.
Mais que constrangimento, portanto, a posição da presidente do "PL mulher" pode tensionar o partido, inviabilizando uma adesão a essa tratativa com o PSDB de Ciro.
As falas de Michelle em território cearense se situam ainda num quadro mais geral de briga pelo capital político de Bolsonaro, que começou a cumprir pena de 27 anos de prisão em regime fechado. Privado de liberdade, sem poder articular palanques nem escolher diretamente seus representantes nos estados, Bolsonaro passa agora a depender do diálogo com os filhos (Carlos, Flávio e Jair Renan) e com Michelle, que tem assumido protagonismo nessa queda de braço familiar. A sinalização contundente de que é contra um acerto com Ciro, além da defesa de Priscila Costa para o Senado, mostram que Michelle não vem esperando aval nem de Flávio nem de Carlos para começar a estruturar as candidaturas do PL. Numa tabelinha com Valdemar da Costa Neto, presidente nacional do partido, a ex-primeira-dama assume aos poucos o vácuo que a retirada de cena de Bolsonaro inevitavelmente produz.
A dúvida agora é sobre os efeitos da visita de Michelle ao Ceará, deixando para trás um cenário de conflagração interna que André Fernandes vai precisar solucionar. Para tanto, apenas repetir que Bolsonaro chancelou pessoalmente uma ligação para Ciro talvez não seja suficiente. O jovem parlamentar do PL, uma das estrelas da sigla em 2024, terá pela frente a missão de arbitrar um conflito que opõe alas não somente dentro da própria agremiação, mas no âmbito da direita local. Afinal, o receio de uma negociação com Ciro se estende a outros partidos, tais como o Novo de Girão. Para esse grupo, o pior cenário seria o da candidatura dupla, com o senador e o ex-ministro pelejando pelo voto do eleitorado conservador. Caso esse racha se confirme, então, o maior beneficiado terá sido o bloco governista.
O fim do casamento entre o ministro do Supremo Gilmar Mendes e a advogada Guiomar Feitosa deve ter mais impacto político no Ceará do que o "divórcio" entre Camilo Santana e Ciro Gomes em 2022. Irmã de Chiquinho Feitosa, Guiomar é personagem influente nos círculos jurídicos de Brasília. Gilmar, por seu turno, é relator de processos cujo desfecho teria influência decisiva para o desenho eleitoral das chapas em 2026. Logo, o desenlace matrimonial foi lido como um acontecimento de interesse que extrapola a seara afetiva.
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