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Declaração de André Fernandes empobrece debate público
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É doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro de contos

Kalina Gondim política

Declaração de André Fernandes empobrece debate público

O deputado do PL afirmou que irá condecorar o policial militar que mais matar traficantes e integrantes de facções no Ceará
O deputado federal André Fernandes (PL) enviou ao Estado do Ceará uma emenda parlamentar para compra de armas de fogo para a Polícia. Ele disse esperar que policiais matem "muitos bandidos" (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA O deputado federal André Fernandes (PL) enviou ao Estado do Ceará uma emenda parlamentar para compra de armas de fogo para a Polícia. Ele disse esperar que policiais matem "muitos bandidos"

A edição da última terça-feira, 28, do O POVO, trouxe na capa a lamentável informação de que, em um único dia, no Ceará, foram registrados 18 homicídios e que, durante o último fim de semana, mais de 200 pessoas foram detidas pela polícia militar.

Infelizmente, notícias como essas são cada vez mais recorrentes, a sensação de insegurança acompanha quase todos os cearenses e junto dela vem uma certa dose de impotência e desesperança.

O desespero e o medo da população são manipulados por discursos eleitoreiros que vendem soluções simplistas para problemas complexos, como a violência urbana.

A negação da realidade e a busca pela produção do consenso em torno da ideia de que a solução para a violência depende de estratégias unilaterais, como o aumento do policiamento vem adquirindo centralidade discursiva e adesão de grande parte da população.

Contudo, o reducionismo escapista produz cegueira crônica, alienação e ignorância, além de não oferecer respostas plausíveis para os problemas. Analisar as estatísticas de violência de forma isolada sem compará-las com os indicadores econômicos e sociais, é perceber o fenômeno apenas em sua aparência.

O não enfrentamento de debates como o aumento da desigualdade social, da crise econômica, do sistema público de ensino e das políticas públicas formam o terreno propício para o fortalecimento do populismo penal.

Diante desse cenário de medo e desinformação, os discursos autoritários e punitivistas sempre entram em cena quando grupos opositores desejam obter ganhos políticos com o desespero da população. O populismo penal cobra mais policiais, mais viaturas e armas do poder executivo. Por outro lado, pressiona o legislativo para criminalizar condutas e aumentar a pena dos crimes já existentes.

Nessa seara, o debate acerca dos direitos à educação, à cultura, à moradia, alimentação e profissionalização desaparecem do horizonte político. O combalido Estado social brasileiro é fagocitado pelo Estado penal.

O apelo constante ao populismo penal produz na política subjetividades autoritárias que se distanciam do ideal de justiça e bem comum. O que se deseja está no pêndulo que oscila entre encarceramento e extermínio.

Sob tal perspectiva, a noção de segurança, como um direito constitucional cede espaço para uma ideia de segurança como sinônimo da administração do medo.

O populismo penal é filho da descrença e do ódio à política e de certa forma não deixa de ser uma fake news, não no sentido de que os que o defendem mentem ao dizerem que o combate à violência exige policiamento, a desonestidade está em afirmar que essa é a única estratégia possível. Quanto mais as eleições se aproximam maior é a escalada do autoritarismo.

É nesse sentido que trago a declaração de André Fernandes (PL), no Congresso Nacional. O deputado afirmou que irá condecorar o policial militar que mais matar traficantes e integrantes de facções no Ceará.

A declaração de André Fernandes não só empobrece o debate público, como expõe, de forma contundente, a degradação ética e intelectual da política contemporânea.

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