Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)
Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)
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Para quem ainda tem dúvida do protagonismo do Ceará no campo de pesquisas sobre violência e segurança pública, segue uma novidade: o Laboratório de Estudos da Violência (UFC), da Universidade Federal do Ceará (UFC), coordenará o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Violência, Poder e Segurança Pública (INVIPS), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O INVIPS pretende ser uma rede de impacto nacional e internacional no conhecimento sobre os fenômenos da violência e do crime e sua repercussão sobre a sociedade brasileira. Para tanto, ações de pesquisa, ensino e extensão entre os laboratórios serão promovidas tendo como resultado a construção de um banco de dados de relevo e a disseminação de boas práticas nas áreas de segurança pública e justiça.
O instituto reunirá um total de 15 grupos de pesquisa de referência, com atuação em 10 estados brasileiros: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo. Caberá ao professor César Barreira, fundador do LEV, coordenar o INVIPS, enquanto o atual coordenador do laboratório, Luiz Fábio Paiva, assume a coordenação técnico-científica do novo instituto.
O INVIPS atuará ainda em cinco eixos centrais na produção de conhecimentos e na formação de recursos humanos: dinâmicas e efeitos da violência e do crime; fenômeno das facções criminosas no Brasil; segurança, instituições e atores; controle social e justiça; e fronteiras e economias ilegais.
Para César Barreira, o fato de o Ceará assumir a coordenação do novo instituto é o "coroamento de um trabalho desenvolvido pelos pesquisadores e pesquisadoras do LEV nos últimos 30 anos". "É muito importante a gente destacar o fato de que existe toda uma dificuldade muito grande das pessoas de outras regiões, principalmente do Sul, em aceitar essa nossa liderança, mas esse INCT, para mim, foi um reconhecimento dessa liderança que não é necessariamente uma coisa pessoal, mas algo coletivo", argumenta.
Nessa esteira, segundo Barreira, muitos estados do Nordeste vêm apresentando uma produção técnica de fôlego, indo além do que se produz no eixo Rio-São Paulo. "O grande número de livros publicados, teses e dissertação com essa temática fazem com que a gente assuma um caráter nacional. Temos uma massa crítica muito importante que, de certa forma, está nos impulsionando. Antes, a pesquisa era 100% concentrada no Rio e em São Paulo. Hoje, nossas pesquisas já passam a ocupar um lugar de leitura para pesquisadores de outros países, mas ainda temos o problema de nossa produção ser muito em português e isso dificulta uma maior disseminação", afirma.
Dentro dessa perspectiva alguns temas se impõem a partir do Ceará, como a dinâmica regional das facções e o papel do Estado na rota internacional do tráfico internacional de drogas por ser uma via de passagem para a Europa. "Para se compreender as dinâmicas locais do crime é preciso compreender o contexto nacional e isso precisa passar por pesquisas produzidas não só no Ceará, mas em estados como Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, por exemplo", explica.
O reconhecimento nacional do trabalho do LEV chega em meio a um período de impasses no campo da segurança pública tanto na esfera estadual quanto nacional. A emergência de novos grupos criminosos armados a partir de dissidências de facções maiores como o Comando Vermelho e os Guardiões do Estado tem provocado uma nova onda de violência letal representada por uma série de chacinas e pela interiorização dos assassinatos.
No entanto, essas ocorrências ainda não impactavam os números globais de crimes violentos letais intencionais (CVLIs) do Ceará. O cenário mudou em outubro quando os índices de homicídios voltaram a subir, depois de dois anos de relativa estabilidade, devendo se manter elevados também em novembro. Interlocutores da coluna que atuam nos órgãos de segurança têm me procurado para externar essa preocupação. As vulnerabilidades das políticas de segurança pública certamente serão exploradas no próximo ano, durante a campanha eleitoral.
Em âmbito nacional, a possibilidade de Flávio Dino deixar o cargo à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública para assumir como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) abre margem para muitas incertezas sobre os rumos a serem tomados pelo governo federal. A primeira delas é sobre o futuro do próprio ministério: ele será mantido como está ou será desmembrado em dois?
O diálogo franco entre a academia e os governos nunca é uma arte fácil, mas é necessária. Nos momentos de crise, as ameaças e as oportunidades muitas vezes se tornam indistintas. Antecipar cenários e realizar diagnósticos precisos fazem a diferença na condução de ações e políticas de médio e longo prazo. Poder contar com o conhecimento gerado por uma rede como o INVIPS é um artigo de luxo para os governantes. Convém utilizar-se dessa produção sem moderação.
Ricardo Moura é jornalista, doutor em sociologia e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre a Violência
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