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Justiça impede que Guaramiranga emita licenciamento ambiental
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Justiça impede que Guaramiranga emita licenciamento ambiental

Decisão atende ao pedido do MPCE e determina ainda que o município de Guaramiranga se abstenha de nomear, dar posse ou permitir o exercício dos 17 cargos comissionados
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GUARAMIRANGA fica na Serra de Baturité (Foto: AURÉLIO ALVES)
Foto: AURÉLIO ALVES GUARAMIRANGA fica na Serra de Baturité

A Justiça atendeu ao pedido do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) e determinou que o Município de Guaramiranga, localizado na Serra de Baturité, a 105,76 km de Fortaleza, abstenha-se de exercer as atividades de fiscalização e licenciamento ambiental.

A decisão, divulgada na quarta-feira passada, 16, mantém as atribuições, provisoriamente, a cargo da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace).

Na decisão, o juiz Daniel Gonçalves Gondim, da Comarca de Guaramiranga, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 12, 13 e 16, da Lei Municipal nº 461/2025, que criou o órgão com cargos comissionados em vez de providos por concurso público e sem definir suas atribuições.

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O documento expedido pela Justiça determinou que o município de Guaramiranga se abstenha de nomear, dar posse ou permitir o exercício dos 17 cargos comissionados, sob pena de multa diária de R$2 mil, até o julgamento do mérito ou correção legislativa.

A liminar destaca ainda que a criação dos cargos sem descrição legal viola o artigo 37, II, da Constituição Federal de 1988 e a jurisprudência consolidada no Tema 1010 do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o qual “é inconstitucional a criação de cargos em comissão sem a descrição das atribuições legais ou para o desempenho de atividades estritamente técnicas, burocráticas ou operacionais”.

De acordo com a legislação, os órgãos ambientais devem contar, obrigatoriamente, com uma equipe multidisciplinar formada por servidores efetivos de nível superior, como engenheiro ambiental, biólogo, geólogo, entre outros.

Conforme o documento, a duração das atribuições se estendem até a comprovação da completa estruturação do órgão municipal, nos moldes da Lei Complementar (LC) nº140/2011, Emenda à Constituição (EC) mº 126/2025 e Resolução Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) nº 07/2019.

Prefeitura de Guaramiranga vai recorrer da decisão

O advogado ambiental Daniel Pagliuca explica que o licenciamento ambiental pode ser realizado pelos municípios, desde que atendam aos requisitos mínimos pontuados pela legislação, incluindo equipes formadas por técnicos com nível superior e concursados, além de conselho municipal ativo.

A mensagem de criação da Autarquia do Meio Ambiente foi enviada à Câmara pela prefeita de Guaramiranga, Ynara Mota (Republicanos), em fevereiro. Segundo Daniel, a agilidade mostrou um interesse muito grande da administração em relação ao assunto.

“O Ministério Público se antecipou ao início dessas atividades, caso isso seja regulamentado, para que só possa fiscalizar e licenciar depois de cumpridos todos os requisitos que a norma ambiental diz para que o Município possa exercer efetivamente esse poder fiscalizador e licenciador”, detalha.

Procurado pelo O POVO, o advogado da prefeita de Guamiranga, Álvaro Viana Souza, ressaltou que a decisão da Justiça não foi para extinguir a Autarquia do Meio Ambiente, somente a forma como os cargos foram descritos. Segundo ele, o Município irá recorrer da decisão.

“A competência de licenciamento do Município, passada a Semace de forma suplementar - por enquanto - até esta revisão. Ressaltamos que a decisão é provisória, reversível, conforme consta na decisão judicial e que o município irá recorrer”, afirma o advogado.


Fragilidade ambiental e especulação imobiliária

Um outro processo administrativo tramita na Promotoria de Justiça de Guaramiranga, conforme o Ministério Público do Ceará. A ação investiga os artigos que dispõem sobre autorização que a autarquia poderia dar para o corte e supressão de vegetação que fazem parte do bioma Mata Atlântica, atribuição que seria de competência do órgão estadual.

No artigo 6 da Lei Municipal nº 461/2025, o documento atribui à Autarquia a “Autorização de Corte de Árvores Isoladas de Espécie Nativa (CAI)” que “ocorre comumente em áreas urbanas para construção de edificações ou mesmo por medida de segurança”.

Ainda no mesmo artigo, também é atribuído ao órgão a “Autorização de Supressão de Vegetação (ASV)”, permitindo “a supressão de vegetação nativa de determinada área para fins de uso alternativo do solo visando a instalação de empreendimentos de utilidade pública ou interesse social”.

Guaramiranga está situada na Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra de Baturité. Criada pelo Decreto Estadual nº 20.956, em 1990, a área tem um total de 32.690 hectares. Segundo ambientalistas, o avanço da especulação imobiliária e o desmatamento na região estão agravando a destruição ambiental na área e resultando na perda de serviços ambientais essenciais, como o fornecimento de água.

Daniel Pagliuca lamenta a precariedade por trás do funcionamento de diversos órgãos ligados ao meio ambiente que, por vezes, não contam com equipes especializadas e valorizadas, nem estrutura adequada para a realização das atividades.

“Isso precisa de muito conhecimento técnico. Ter um empreendimento, por exemplo, imobiliário ou industrial, envolve muito dinheiro, muito impacto ambiental e precisa de gente capacitada para fazer essa implementação. Se você não tem essa capacitação, você pode estar autorizando, licenciando, ou mesmo em determinados momentos, pela não capacidade técnica, pela não capilaridade desses órgãos, estar produzindo algum tipo de impacto ambiental negativo”, avalia.

Durante a sessão de votação da criação da autarquia, realizada na Câmara Municipal, no dia 20 de março, manifestantes exibiram cartazes e protestaram contra a medida, enquanto outros apoiavam a implementação da autarquia.

 

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