Rennó Silva fuma cigarro eletrônico há dois anos e largou o vício no tabaco que o acompanhava desde os 15 anos; tem planos de, aos poucos, deixar também o dispositivo. Emanuel Monte, contudo, mesmo com o vape, sentiu necessidade de continuar fumando o cigarro convencional, ainda que com menor frequência. Experiência de usuários e de especialistas se divergem com relação à eficácia do cigarro eletrônico na recuperação do tabagismo. O principal problema é a falta de estudos conclusivos sobre riscos do dispositivo, comercializado pela primeira vez no mundo em 2002 e com venda e distribuição proibida no Brasil.
Para a coordenadora do programa de controle de tabagismo do Hospital de Messejana, Penha Uchoa, dispositivo não é eficaz para curar dependência, mas apenas troca um vício por outro. Ela evidencia que não existem estudos científicos que comprovem que cigarro eletrônico possa ser utilizado em tratamentos, como adesivos de nicotina e medicamentos de redução da ansiedade na abstinência. "O pensamento da Sociedade Brasileira de Pneumologia é uniforme que não é indicado para tratamento medicamentoso, que existem riscos que já estão sendo definidos em trabalhos científicos", afirma.
O otorrinolaringologista do Instituto José Frota (IJF) Roberto Alencar considera também que o uso deve ser desestimulado. "Muitos dele tem nicotina e ela causa dependência. É você sair de uma fogueira e entrar no fogo", diz. O cigarro eletrônico gera fumaça por meio da vaporização de líquidos, que podem ser essências com diferentes sabores e, também, a nicotina. Normalmente, o dispositivo é usado por quem quer parar de fumar devido a possibilidade de reduzir a concentração da substância de forma gradativa para diminuir os efeitos da abstinência.
"A melhor forma é fazer o tratamento, pacientes que conseguem parar de fumar são os que participam de grupos", explica a pneumologista do Hospital Universitário Walter Cantídio Simone Fortaleza. Ela também pontua que quem quer largar o tabagismo deve procurar tratamentos de terapia de reposição de nicotina com adesivos e medicamentos que diminuem a necessidade de fumar.
O fotógrafo Rennó Silva, 22, começou a fumar vape em outubro de 2017 por sentir que sua rotina de fumante estava o atrapalhando física e psicologicamente. Após pesquisar sobre o dispositivo, conseguiu comprá-lo com ajuda de grupos pela internet. A medida foi eficaz. "No dia que chegou meu dispositivo eu larguei. Eram 20 cigarros por dia e quando eu comecei a usar o eletrônico eu não sentia falta do cigarro", relata.
Desde então, ele conseguiu reduzir a um terço a quantidade de nicotina que usa. Seu plano é até o final do ano reduzir o nível a zero, largando o vício. "Foi uma transição que para mim só trouxe benefícios, economizou dinheiro, economizou saúde. É uma coisa que eu não me arrependo mesmo. É uma saída real para largar o cigarro de uma maneira menos dolorosa", indica.
Quando começou a usar cigarro eletrônico há dois anos, o publicitário Emanuel Monte, 30, não largou o cigarro tradicional e fuma-o até hoje. Apesar de não ter largado o vício, diminuiu bastante o uso durante os oito meses que preferiu o vape; de uma carteira inteira para dois a três cigarros por dia. "Para mim, o eletrônico sacia o hábito, a vontade de estar segurando e puxando alguma coisa, tragando e respirando. Quando bate a vontade de dar uma acalmada, só o tradicional que acalma", aponta. Segundo ele, só não deixou o cigarro porque não houve uma decisão. Ele considera que, caso queira parar de fumar definitivamente, deve apostar no cigarro eletrônico.
Como funciona o cigarro eletrônico
BOCAL
O fumante traga e um sensor detecta o movimento de ar para ativar o nebulizador. Em alguns modelos é necessário que seja acionado um botão para cumprir essa função.
CARTUCHO
Contém o líquido que vai ser evaporado. Em alguns modelos, esse cartucho é descartável e em outros pode ser utilizado refil. O líquido pode conter nicotina em diferentes concentrações e essências flavorizantes de vários sabores.
NEBULIZADOR
Aquece gotículas de nicotina, que rapidamente se transformam em vapor para serem tragadas. A fumaça gerada não tem cheiro (a não ser que seja utilizada essência), pois o cigarro não queima tabaco e tem água na composição.
BATERIA
Responsável pelo funcionamento de todo o mecanismo. Tem duração de dois a três dias após carga completa
LUZ
Indica que vapor está ponto para ser tragado. Em alguns modelos mais simples, simula uma brasa.
Prós e contras do cigarro eletrônico
Prós
Exposição a menos substâncias químicas tóxicas, quando comparado ao cigarro comum.
Ao contrário do cigarro comum, não usa combustão, evitando a liberação de substâncias cancerígenas
Não deixa os dentes amarelados.
Não provoca mau cheiro.
É menos poluente, devido à não liberação de gases provenientes da combustão e ao menor descarte.
É mais barato, quando pensado a longo prazo.
O fumo passivo parece ser menos tóxico, já que fumaça é composta principalmente por vapor de água.
Parece haver um menor risco de doenças pulmonares em comparação ao cigarro comum, pela não presença das 4.700 substâncias tóxicas.
Contras
Não há pesquisas conclusivas que comprovem a falta de riscos. Podem haver substâncias bastante danosas presentes que ainda não foram descobertas.
Há opções mais seguras e com maior embasamento científico para largar o fumo, como fármacos e chicletes ou adesivos de nicotina.
A presença da nicotina pode criar vício em usuários que começam pelo vape e fazer com que fumantes que querem largar o cigarro não percam a dependência, mas apenas troquem-a.
A nicotina presente no cigarro eletrônico é causadora de diversos problemas cardiovasculares.
Há estudos que mostram que ex-fumantes voltaram a fumar, agora com cigarros eletrônicos.
Presença de flavorizantes nas essências pode incentivar uso do dispositivo em público cada vez mais jovem.