Eram 16h24min da última quarta-feira (17) quando tocamos a campainha do número 180 da rua Dr. Pedro Sampaio, no bairro Dunas. O dispositivo acionou um disparo abafado. Vestindo fardamento verde-lodo, um homem apareceu dez minutos depois. Desconfiado, não abriu a porta da mansão. Pela brecha entre a madeira e o muro, espichou a vista e quis saber do que se tratava.
À pergunta se o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado ainda morava ali, respondeu com um muxoxo. "Não mora mais... Foi embora", acrescentou o caseiro do imóvel de 3.700 metros quadrados que serviu de residência nos últimos três anos ao delator da Operação Lava Jato. Em seguida pediu licença para cuidar dos afazeres.
A poucos metros da Praia do Futuro, a casa ocupa quase todo o quarteirão da via. O muro de pedra alto impede qualquer visão de seu interior. Luxuosa, a construção tem 79 metros de frente por 49m de fundo.
São 1.300 m² de área construída, distribuídos em quatro suítes, quadra poliesportiva, piscina, deck e oito vagas na garagem. Símbolo dos benefícios concedidos a um dos principais responsáveis pelo esquema que dilapidou a Petrobras, a mansão agora está à venda.
A placa com a oferta foi afixada na porta de entrada de veículos cerca de dois meses atrás, informa a imobiliária, cuja carteira de clientes inclui unidades de altíssimo padrão no Brasil e em Miami, nos Estados Unidos. Quem quiser ocupar o lugar que já foi de Machado terá de desembolsar R$ 3,9 milhões.
Foi nesse palacete que o ex-senador cearense se recolheu após admitir que havia desviado aproximadamente R$ 100 milhões em propinas e ser obrigado a devolver R$ 75 milhões. Era 2016, e Machado causara terremoto político no País ao revelar que distribuíra dinheiro sujo para duas dezenas de políticos e grampeara figuras de proa do MDB e de outros partidos.
Entre elas, o ex-ministro do Planejamento Romero Jucá (MDB), réu em duas ações, uma delas instruída a partir da delação do cearense. E o senador e correligionário Renan Calheiros, investigado em oito processos.
Machado e a esposa viveram na mansão até o início deste ano. Diferentemente do que se supunha, a casa não era própria, mas alugada - o imóvel pertence hoje ao proprietário da imobiliária que tenta vendê-lo.
Nessa época, o ex-dirigente da Transpetro podia ser visto na igreja Nossa Senhora de Lourdes, em Dunas, ou numa sorveteria próxima no mesmo bairro.
Como não antecipou a execução da pena de três anos de prisão (dois anos e três meses em regime domiciliar e o restante no semiaberto) prevista no acordo de delação premiada celebrado com a Procuradoria-Geral da República, o empresário não usa tornozeleira eletrônica.
Réu em três ações penais por lavagem e corrupção que tramitam na Justiça Federal do Paraná, uma delas acolhida na semana passada pelo juiz Luiz Antônio Bonat, substituto de Sergio Moro na 13ª Vara de Curitiba, o delator-bomba aguarda sentença em liberdade.
É assim que Machado tenta manter sua rotina em Fortaleza ao lado de dois dos três filhos, também implicados nas investigações e colaboradores da Lava Jato. Longe da mansão, continua indo à academia do shopping aos sábados, por exemplo. Mas mudou de templo religioso. Passou a frequentar a igreja de Santa Terezinha.
Durante a semana, restringe a circulação e limita visitas, encerrando-se com a esposa nos 500 m² da nova casa, o apartamento nº 400 de um condomínio de luxo na esquina das ruas República do Líbano e Oswaldo Cruz. Lá, um imóvel não sai por menos de R$ 6 milhões. É vizinho de Solange Almeida, Isaías CDs e Eunício Oliveira (MDB).
Um funcionário da antiga capela frequentada pelo delator lamenta não vê-lo mais há algum tempo. Relata que a última vez foi em março. Segundo ele, o ex-senador ajudou a construir a igrejinha quatro anos atrás, quando era somente areia às margens de uma avenida na Praia do Futuro.
"Ele ofereceu dinheiro para o material de construção", lembra o fiel, para quem o delator era simpático. "Sua esposa acompanhava o cotidiano da capela. Eles frequentavam juntos a missa aos domingos. Agora não vejo mais ninguém", disse.
Na tarde da última sexta-feira, dois dias depois de bater à porta da mansão, a reportagem tocou o interfone do prédio novo onde Machado reside. O porteiro perguntou se havia hora marcada. Não havia. Então pediu um minuto para consultar o secretário do delator. Menos de um minuto depois, comunicou que Sergio Machado não estava.