A dificuldade da indústria de bebidas em retomar a produção diante da falta de insumos já está afetando o consumidor final. Em supermercados e restaurantes de Fortaleza, alguns rótulos de cerveja sumiram das gôndolas e cardápios. E os preços também estão mais caros. Em determinadas marcas, a alta é superior a 11%. Ainda assim, a ameaça de um desabastecimento generalizado para as festas de fim de ano está, por enquanto, descartada.
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 É o que assegura o diretor da Associação Cearense de Supermercados (Acesu) e gestor da Maxi Rede, Engel Rocha. "Desabastecimento geral a ponto de zerar estoque é mais difícil, mas estamos vendo faltas pontuais. Por exemplo, às vezes, vende só a long neck da Brahma Duplo Malte, mas está faltando a versão latinha, e aí no lote seguinte pode ser o contrário".
Ele explica que para garantir que todos sejam atendidos, ao menos em parte, os fornecedores estão priorizando alguns produtos ou rótulos, o que faz com que algumas marcas fiquem fora do mercado momentaneamente. "Mas acredito que, embora a situação só vá se normalizar mesmo em 2021, até o fim do ano as coisas estarão melhores".
Este não é um problema local. Indústrias de diversos segmentos estão com dificuldade de atender a demanda, seja porque o processo de retomada nas fábricas não é tão simples após tanto tempo parado, seja porque está faltando matéria-prima. No caso de bebidas, estão faltando, principalmente, insumos para embalagens.
Soma-se a isso, o fato de que, na pandemia, aumentou significativamente o consumo de bebidas alcoólicas. Para se ter uma ideia, a Ambev, líder do mercado cervejeiro no Brasil e dona das marcas Brahma, Antarctica, Bohemia e Skol, teve crescimento de 25,4% no volume de vendas no país no terceiro trimestre de 2020, ante mesmo período de 2019. Foram mais de 21,8 milhões de hectolitros vendidos, segundo balanço da empresa.
Na Heineken, vice-líder que detém rótulos como Heineken, Schin, Devassa, Baden Baden, Eisenbahn, Cintra e Glacial, a alta no terceiro trimestre foi de 13% no Brasil, usando a mesma base de comparação.
Como boa parte dos insumos, como o malte, vem de fora, a disparada do dólar também está influenciando no preço dos produtos. A Heineken anunciou reajuste em função do dólar na tabela do mercado brasileiro desde setembro.
E isso, aos poucos, começa a chegar ao consumidor. No Mercadinho São Luiz, por exemplo, uma long neck de Heineken que custava em torno de R$ 4,49, agora, sai por R$ 4,99. Alta de 11%. Já o preço da Brahma Duplo Malte subiu de R$ 2,75 para R$ 2,99, reajuste de 8,7%.
O gerente de vendas do São Luiz, Ednardo do Nascimento, diz que a venda de cervejas cresceu mais de 40% este ano. Mas, em função de toda essa conjuntura, de dois meses para cá, há uma irregularidade maior no fornecimento dos produtos. De 100% do que é pedido, em média, entre 60% a 70% é entregue. Há escassez de cinco a seis rótulos no mercado.
"Faltar cerveja não aconteceu, mas, por exemplo, a cerveja Antarctica Cristal já nos foi informado que não vai ter até dezembro, só vão entregar em janeiro, porque estão priorizando a produção de outras cervejas do grupo", afirmou Ednardo.
Ele reforça, no entanto, que como o volume de pedidos é grande e semanal, não tem risco de desabastecimento. "Também estamos buscando outros fornecedores, inclusive, regionais, para botar dentro do mix de produtos".
A ameaça de ruptura na compra - quando um determinado produto deixa de ser consumido porque o item não está disponível - é uma dificuldade a mais que bate à porta do segmento de restaurantes e bares. Este último, por exemplo, ainda não foi autorizado a funcionar em Fortaleza.
"O preço da cerveja não foi o único que subiu. Carnes e laticínios também aumentaram muito. O que é muito ruim para o nosso negócio, ainda mais em um momento tenso como este, em que muitos restaurantes já ficaram pelo caminho", afirmou o vice-presidente do Sindicato de Restaurantes, Bares, Barracas de Praia, Buffets e Similares do Estado do Ceará (Sindirest - CE), Antonio Moraes Neto.
Nas barracas da Praia do Futuro muitos estabelecimentos estão tendo que comprar de supermercados e depósitos com estoque maior, a preços acima dos fornecedores habituais, para evitar que determinados rótulos faltem no cardápio, afirma a presidente da Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPFuturo), Fátima Queiroz.
Ela diz que o problema atinge, principalmente, as cervejas premium. "É complicado e apesar de estarmos comprando mais caro, 80% das barracas daqui ainda não repassaram esse custo ao cliente. Mas isso vai ser uma questão de tempo porque os distribuidores já avisaram que vai ter reajuste na tabela e aí não vamos ter como segurar".