A Petrobras perdeu R$ 102,5 bilhões em valor de mercado desde que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou que Roberto Castelo Branco deve sair do comando da Petrobras para dar lugar ao general Joaquim Silva e Luna. As quedas foram avaliadas pelo mercado como "risco Bolsonaro", pela pretensão intervencionista nos rumos da companhia. Ontem, no fechamento da B3, as ações da Petrobras foram as maiores perdedoras do dia, com quedas de 20,48% (PETR3.SA) e de 21,51% (PETR4.SA).
A ingerência põe em risco a forma como investidores observam o setor de petróleo no País, em momento em que a companhia tem farta agenda de desinvestimentos, que inclui a Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste (Lubnor), sediada em Fortaleza. A mudança na diretoria, se representar uma alteração na política de trabalho, pode fazer com que os planos de concluir a venda até o fim do primeiro semestre, sofra alterações.
Para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Ceará (Ibef-CE), Ênio Arêa Leão, observa-se que a venda não deve ser prejudicada, mas pode contribuir para que o valor do ativo caia. "Sempre que diminui a credibilidade do Brasil e a credibilidade sobre a política de preços, são afetados os preços dos ativos brasileiros e aqueles que têm relação com o preço de petróleo", afirma.
Somente ontem, o Ibovespa teve a pior cotação no ano, com queda de 4,87%. O dólar fechou cotado a R$ 5,47, alta de 1,56%, acentuando a desvalorização do real. A desconfiança do mercado pairou inclusive sobre outros ativos importantes, como Banco do Brasil e Eletrobras, ainda puxando resultados negativos de bancos privados e desconfiança ao setor de energia, colocado como próximo alvo pelo presidente.
Em meio ao cenário negativo no mercado financeiro, o presidente veio a público ontem afirmar que é possível reduzir o valor do combustível em ao menos 10% sem canetada e disse: "Mudanças teremos no governo sempre que se fizer necessário".
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A ideia, porém, deve ter resultado prático diferente. Arêa Leão acredita que se a política de preços da Petrobras foi adaptada, até pode haver redução nas bombas, mas ela estará baseada no repasse de prejuízos à companhia e subsídios oferecidos pela União. O que, no fim de tudo, sairia do bolso de todos os contribuintes.
Antônio José Costa, assessor de Economia do Sindipostos, detalha que a faixa de custo do litro da gasolina na Capital já está entre R$ 5 e R$ 5,40. Sobre o diesel, diz que, caso o decreto zerando os impostos federais seja confirmado, a redução na bomba não deve passar de 10% a 12%, que é o quanto compõe na soma. "É preciso cair o custo da Petrobras, cair a margem do posto, mas precisa cair principalmente os impostos. Mas, para reduzir imposto é necessário uma ampla reforma tributária. Para o varejista e a distribuidora, as margens já são mínimas."
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O silêncio do ministro Paulo Guedes sobre a demissão sumária de Roberto Castello Branco, um liberal pós-graduado em Chicago indicado pelo próprio Guedes, também não passou despercebido. Célio Fernando Melo, economista, presidente da Associação dos Profissionais de Investimentos do Nordeste (Apimec-NE) e diretor da BFA Investimentos, avalia que a forma como a demissão é realizada demonstra uma falta de capacidade de gestão, de primeiro publicizar o problema antes de tentar resolvê-lo internamente. Também interpreta como mais uma indicação do governo de que se apegou de vez à pauta populista. "Mostra uma fragilidade na governança, mesmo as estatais estando sujeitas à interferência. O mercado, porém, precifica as rupturas na gestão."
A oficialização da mudança no comando já é observada como inevitável pelo conselho de administradores da companhia. O trabalho agora visa manter os demais membros que fazem parte da atual gestão e evitar intervenções maiores no núcleo principal da estatal. Hoje, 23, é realizada uma reunião ordinária, na qual estava na pauta a recondução de Castello Brando e toda diretoria executiva cujos mandatos encerram ao fim do próximo mês. Agora, a principal análise será a entrada do general no conselho e sua condução à presidência.
"Castello Branco e a diretoria têm conduzido muito bem a Petrobras, e sua recondução era o que aconteceria antes da interferência de (Jair) Bolsonaro", disse um dos conselheiros, em condição de anonimato. (Com Agência Estado)
Como os investidores observam as mudanças
Entre os acionistas da Petrobras, o temor é que mais ingerências políticas determinem um rumo de desastre para o futuro da companhia. O temor geral desde a indicação do general da reserva Joaquim Silva e Luna fez com que, apenas na sexta-feira, 19, a perda de valor de mercado se aproximasse de R$ 30 bilhões.
O tombo na primeira reação não é pequeno, é superior ao valor de mercado da BR Distribuidora. As críticas são, principalmente, quanto ao modo como a demissão está sendo encaminhada, sem que o conselho de administração tivesse oportunidade para, internamente, avaliar a indicação do general Luna ao cargo. Castello Branco é muito bem visto no mercado pelo trabalho de recuperação da Petrobras desde que, em 2016, chegou a ser uma das empresas mais endividadas do mundo.
Gabriel Sampaio, assessor de investimentos da Mesa de Renda Variável da Verk Investimentos, escritório do BTG Pactual no Ceará, ressalta que, nesses dias, acabam havendo algumas distorções. "A extensão da queda pode ter sido exagerada, ou não. Mas o investidor deve ter em mente os motivos pelos quais decidiu investir na companhia. É preciso ver como as coisas vão se desenrolar."
Desde o início dessa crise gerada pela mudança de comando, a companhia perdeu praticamente 1/5 de seu valor de mercado no dia do anúncio. Durante o fim de semana, mesmo com mercado fechado, as grandes empresas de investimento mudaram sua avaliação sobre a Petrobras. O BTG Pactual mudou a recomendação sobre as ações da Petrobras para neutro. Já o Bank of America tirou Petrobras da carteira e a XP trocou a recomendação de compra para venda.