Restrito a grandes consumidores e sem a influência das bandeiras tarifárias, o Mercado Livre de Energia ou Ambiente de Contratação Livre representa apenas 18% do que é consumido no Ceará hoje, de acordo com a Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel). Mas as mudanças ocasionadas pela crise energética geram expectativa de aumento no setor, que possui potencial para chegar a 25% de toda a energia consumida no Estado, segundo estima o Sindicato das Indústrias de Energia e Setor Elétrico do Estado do Ceará (Sindienergia-CE).
Na prática, o Mercado Livre é um ambiente cuja negociação pela geração da energia é feita diretamente entre o consumidor e o distribuidor/gerador ou pelo comerciante de energia – geralmente empresas especializadas em estabelecer os contatos entre geradores e consumidores. O preço do megawatt/hora nesta modalidade não é regulado por leilões e são estimados em até 32% abaixo do preço regulado no chamado mercado cativo, mas os contratos são registrados na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
E engana-se quem pensa que não vai mais pagar impostos. Além dos embutidos no contrato pelo gerador, há também o custo de transmissão, pois a distribuidora de energia continua fazendo com que a indústria seja conectada. A modalidade, no entanto, ainda não teve as regras estendidas para todos os consumidores. Hoje, a migração só é permitida para aqueles que possuem demanda acima de 500 quilowatts (kW), o que corresponde a demanda de pequenas indústrias, supermercados de médio porte e shoppings.
“Dentro do Estado, existe muitos clientes que são potencialmente livres, ou seja, que estão dentro desses critérios, mas ainda desconhecem o Mercado Livre ou têm receio dos riscos de se optar pela modalidade. A gente imagina que o percentual saltaria de 18% para 25% sem nenhuma mudança regulatória. Ou seja, existe ainda um espaço para a ampliação do consumo pelos clientes”, estima Paulo Siqueira, diretor de Gestão Energética do Sindienergia.
Siqueira conta que redes de supermercados são exemplos de empresas cujo potencial muitas vezes é desconhecido, porque, individualmente, nenhuma das lojas se enquadra no mercado livre, mas a rede consegue aderir ao modelo ao somar o consumo de todas as unidades. Hospitais, shoppings e edifícios comerciais, além das indústrias, fazem parte dos que já negociam o valor do megawatt no Ceará, de acordo com ele.
Para Jurandir Picanço, consultor da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), a explicação para uma baixa participação desta modalidade no consumo local está no porte das empresas instaladas no Estado. Com o parque fabril composto por uma maior quantidade de pequenas e médias unidades, “quem é de grande porte já entrou no Mercado Livre”, diz ele.
“O que ocorre é que o Mercado Livre é próprio só de empresas de maior porte. A participação da indústria, das outras empresas de grande porte comparado ao mercado total não prevalece, é um número pequeno. E nós não temos a mesma proporção de consumo industrial que tem Minas Gerais e São Paulo”, explica.
Minas Gerais, inclusive, é o único estado brasileiro onde o consumo pelo Mercado Livre de Energia superou o mercado cativo. São 51% de participação, de acordo com os dados de junho da Abracell. Já São Paulo apresenta 37% da base de consumo dentro da modalidade. Mas a unidade da federação que mais tem participação proporcional é o Pará (55%).
No País, o Boletim da Energia Livre indica que os índices são maiores onde há maior participação das indústrias dentro do consumo de energia dos estados. Assim, Sul e Sudeste apresentam todos os estados – exceto o Rio de Janeiro – com mais de 30%. Já no Nordeste, a Bahia é que mais conta com o comércio de energia fora do mercado cativo, um total de 34%.
Perguntado sobre como ampliar a margem para percentuais tão altos como no Sul, Siqueira aponta para um Projeto de Lei 914 que tramita no Congresso e visa reduzir o patamar necessário para ter acesso ao mercado livre, chegando, gradualmente, a 65 kw. De acordo com o diretor, o PL estabelece uma meta de 4 anos para que todos os consumidores de alta tensão pudessem acessar a modalidade e, no quinto ano, abriria para toda a população.
“No meu entendimento, há um excesso de conservadorismo. Não é nenhum movimento estranho. Estamos há 10 anos atrasados e, em um ranking de 55 países, estamos no penúltimo lugar. No Chile, por exemplo, 100% das empresas estão a priori no mercado livre”, compara.
Regras do Mercado Livre
O que é?
O mercado livre de energia elétrica, ou Ambiente de contratação Livre (ACL), é o ambiente em que os consumidores podem escolher os fornecedores de energia. Nesse ambiente, consumidores e fornecedores negociam entre si as
Quem pode participar?
Consumidores livres – devem possuir, no mínimo, 2.000 kW de demanda contratada para poder contratar energia proveniente de qualquer fonte de geração.
Consumidores especiais – devem possuir demanda contratada igual ou maior que 500 kW e menor que 2.500 kW. Esses consumidores podem contratar energia proveniente apenas de usinas eólicas, solares, a biomassa, pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) ou hidráulica de empreendimentos com potência inferior ou igual a 50.000 kW, as chamadas fontes especiais.
Como funciona?
O consumidor, após fechar o contrato e realizar a portabilidade, tem acesso à energia normalmente, a partir da rede elétrica da qual já fazia uso. Mas os megawatts consumidos por ele são contabilizados da geração da empresa com a qual fechou contrato de compra. Assim, ele não está sujeito aos aumentos de energia operados pela distribuidora (no caso do Ceará, a Enel) e nem às bandeiras tarifárias.
Mas os encargos e a transmissão, que são custos regulados, não podem ser negociados. Os contratos no mercado livre são fixados entre quem quer migrar para esse ambiente e comercializadoras e/ou geradoras. São contratos bilaterais, acertados entre as duas partes, mas têm como pano de fundo regras definidas pela Aneel. Todos os contratos de energia no mercado livre, independentemente do tipo de fonte, são contabilizados mensalmente pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que é a operadora desse mercado.
Fonte: Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel) e Enel Energia Livre