Já passava das 21 horas quando uma edição extra do Diário Oficial da União (DOU) oficiava a sanção, com vetos, do projeto de lei que define um teto para o ICMS sobre combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo. O presidente Jair Bolsonaro vetou a principal medida de compensação das perdas dos estados incluída pelo Senado e referendada na Câmara. Com as mudanças, os repasses da União para o Ceará servirão para cobrir apenas 1,38% dos prejuízos causados com o projeto.
O veto mais sentido pelos estados é relacionado à previsão de que a União compensasse os estados e municípios para que mantivessem os gastos mínimos constitucionais em educação e saúde na comparação com o que estava em vigor antes de a lei do teto passar a valer.
Mas também foi vetada compensação da perda de receitas para os cinco Estados sem dívida com a União, que seria feita em 2023, com recursos da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) e com a priorização na contratação de empréstimos da União.
Dessa forma, a compensação será feita apenas para Estados que estão endividados com a União, por meio do abatimento da dívida, quando a perda de arrecadação com o ICMS ultrapassar 5%, na comparação com 2021. Esse ressarcimento será feito de forma temporária, durante seis meses.
Segundo a titular da Secretaria da Fazenda do Ceará (Sefaz-CE), Fernanda Pacobahyba, a recomposição que o Estado receberia cairá de R$ 460 milhões nos próximos seis meses para R$ 30 milhões. A perda calculada com a aprovação supera R$ 2,1 bilhões. A Sefaz-CE deve recalcular as perdas dos municípios cearenses.
A garantia de manutenção da verbas foi condicionante para aprovação do projeto no Senado e tratada nos estados como contenção de dano maiores em relação ao texto que veio da Câmara.
Em outra frente, o Governo também começou a articular no Congresso mudanças significativas na PEC dos Combustíveis, recuando da promessa de compensar os estados que zerassem o ICMS sobre o diesel e o gás de cozinha. A prioridade agora é turbinar os programas sociais. As mudanças ocorrem a 100 dias das eleições.
O valor do Auxilio Brasil subiria de R$ 400 para R$ 600. Pacote prevê ainda uma bolsa- caminhoneiro de R$ 1 mil mensais e o aumento no vale-gás a famílias de baixa renda (hoje, de R$ 53 a cada dois meses).
Os benefícios também só valeriam até o fim deste ano e serviriam para atenuar as pressões dos preços vistas pelo presidente Jair Bolsonaro como ameaças à reeleição.
“A gente quer que chegue à ponta o beneficio. Não adianta dar RS 30 bilhões, e os Estados, insensíveis à população, não zerarem (o ICMS). Se a gente tivesse a compromisso dos Estados em zerar, talvez esses auxílios emergenciais fossem desnecessários", afirmou ontem o líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ).
Na época da tramitação do PLP 18 no Senado, o Governo anunciou que zeraria os impostos federais sobre gasolina e etanol se os estados aderissem à alíquota zero para diesel e gás de cozinha. A primeira parte foi mantida na sanção do texto, mas a promessa de uma compensação de perdas via PEC dos Combustíveis não. Os estados não eram obrigados a aderir.
Para Fernanda Pacobahyba, neste ponto em específico, o recuo representa certo alívio, já que os R$ 29,6 bilhões não compensariam as perdas caso os estados zerassem os tributos estaduais. Desta forma, os estados estariam desobrigados a aderir à proposta. Mas critica a sanção do projeto de lei do ICMS, definindo como um atentado ao federalismo brasileiro.
"Na prática, para o estado do Ceará, teremos apenas a compensação das dívidas da União. Para o Ceará são irrisórias, da ordem de R$ 5 milhões por mês. Em seis meses são apenas R$ 30 milhões de compensação".
Fernanda acrescenta que as perdas com ICMS colocam em risco investimentos públicos e repasses aos municípios, além do Fundeb (fundo de desenvolvimento da educação básica). Ela ainda diz que a medida coloca em risco políticas sociais estaduais, como o Cartão Mais Infância Ceará, que beneficia 150 mil famílias pobres com parcelas mensais de R$ 100.
REDUÇÃO DE IMPOSTOS
O PLP 18, sancionado ontem, estabelece um limite de cobrança do ICMS em produtos relacionados a combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo ao classificá-los como itens essenciais. A mudança proíbe os estados de cobrarem ICMS acima da chamada "alíquota geral, que varia de 17% a 18%. Hoje, o ICMS dos combustíveis pode chegar a 35%. No Ceará, é 29%. Os estados podem perder em torno de R$ 100 bilhões em arrecadação com a mudança.
LEI ELEITORAL
Apesar do aval da equipe econômica à ideia de implementar o "voucher" para caminhoneiros de R$ 1 mil (que é uma medida de benefício nova), há dúvida se a medida fere a legislação eleitoral.
Pec dos Combustíveis têm restrições legais e fiscais
Na avaliação do doutor em Direito Constitucional, membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e colunista do OP , Hugo Segundo, é importante destacar que o ICMS é um imposto estadual, principal financiador dos estados e que pelas regras do pacto federativo, a PEC dos Combustíveis proposta pela União seria inconstitucional por ser uma intromissão sobre as finanças dos estados.
Sobre o PLP 18, ele avalia que tratar combustíveis e energia como itens essenciais, para efeito de tributação, é positivo. Mas, do ponto de vista prático, surtirá pouco efeito ao consumidor.
"Beneficiar o Auxílio Brasil deve ser bem melhor do que diminuir o ICMS, pois não havia garantia nenhuma de que o preço dos combustíveis cairia na bomba. O estado perderia arrecadação, a União gastaria muito compensando os estados e a possibilidade dos preços não caírem seria grande".
O problema é o momento em que a proposta chega ao Congresso. Especialistas alertam que a criação de uma bolsa-caminhoneiro de até R$ 1 mil por mês a 100 dias das eleições, por exemplo, esbarra em restrições jurídicas e fiscais. As movimentações têm sido acompanhadas de perto por membros do Tribunal de Contas da União (TCU), órgão que fiscaliza o uso do dinheiro público, segundo fontes ouvidas pelo Estadão.
O plano em análise neste momento é usar os R$ 29,6 bilhões previstos na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Combustíveis e que seriam destinados, inicialmente, à compensação de Estados que zerassem o ICMS sobre diesel e gás até dezembro deste ano.
Diretor da Instituição Fiscal Independente, Daniel Couri avalia que, ainda que a criação da bolsa-caminhoneiro possa ser questionada pela proximidade da eleição, do ponto de vista fiscal ela seria permitida desde que o benefício fosse criado por uma PEC, que é a intenção do governo.
"Pode-se argumentar que esse novo auxílio aos caminhoneiros fere a legislação eleitoral, mas isso pode ser resolvido via PEC", diz. "Agora, continua sendo um gasto fora do teto de gastos - isso porque já era extrateto se esse valor fosse usado para compensar os Estados, só muda o destino do dinheiro. O governo não tem espaço fiscal para gastar R$ 30 bilhões."
A preocupação, avalia Couri, é que, ainda que as propostas tenham data de validade - até o fim do ano -, há grandes chances de se tornarem gastos permanentes. Um exemplo é o próprio Auxílio Brasil, que inicialmente teria o valor de R$ 400 apenas em 2022; mas, em abril, uma medida provisória tornou esse piso permanente.
A legislação determina que, em ano de eleições, fica proibida a distribuição gratuita de bens ou benefícios pela administração pública. As únicas exceções são programas sociais que já estejam em curso. Fora isso, é preciso que o governo publique um decreto de "estado de calamidade pública" ou de "situação de emergência". (Com AE)
Avanço na aprendizagem para retomada
Representantes do Governo do Ceará participaram de seminário sobre o Plano de Retomada das Atividades Econômicas e Comportamentais e definiram como desafio ao Estado a retomada da aprendizagem. Prejudicada pela pandemia, a educação foi definida como eixo central para que o Estado alcance êxito em seus planos econômicos.
Segundo a titular da Fazenda estadual, Fernanda Pacobahyba, os números do balanço do Estado são muito bons, mas não conseguem dar "a exata dimensão do quanto sofreram nossas crianças e adolescentes em termos educacionais", que precisa ser recuperado com rapidez.
O titular da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e do Trabalho (Sedet), Maia Jr., mostrou a evolução do trabalho de atração de grandes negócios ao Ceará e a necessidade de o Estado estar preparado tanto em infraestrutura e governança, quanto em capital humano. Ele lembra que a internacionalização prevista para a economia do Ceará nos próximos anos exige um olhar além das fronteiras do Brasil. E a formação dos cearenses está inserida nisso.
O evento contou ainda com palestras do coordenador do Plano de Retomada, Flávio Ataliba; do titular da Seplag, Ronaldo Borges; e do deputado federal Mauro Benevides Filho, dentre outros.