Decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Nunes Marques, determinou que o Ceará "não crie obstáculos ao exercício das atividades da Petrobras" no Porto do Mucuripe. A decisão anula a validade de decreto estadual publicado em 2018 e impede a transferência da tancagem de Fortaleza para o Porto do Pecém.
Em atendimento ao pedido da Petrobras na Ação Cível Originária (ACO) 3294, o Supremo suspendeu a chamada pública do Complexo do Pecém e os decretos estaduais, de 2018, que previam a assinatura de um termo de compromisso para manutenção temporária das atividades na atual tancagem do Mucuripe, estabelecendo prazo para transferência de atividades para o Pecém, os considerando ilegais.
Nunes Marques ainda citou a Superintendência Estadual de Meio Ambiente (Semace), que, segundo alega a Petrobras nos autos, também agiu ilegalmente ao condicionar a renovação da licença de operação à adequabilidade do empreendimento ao decreto estadual, agora considerado ilegal.
A Petrobras questionava a previsão do decreto de "encerramento compulsório das atividades" com combustíveis líquidos claros e de gás liquefeito de petróleo (GLP).
Num primeiro momento, o Juízo da 5ª Vara Federal do Ceará deferiu pedido de tutela de urgência da empresa. Posteriormente, reconheceu sua incompetência e remeteu o processo ao STF.
Por sua vez, o estado do Ceará sustentava "não haver decisão judicial relativa ao Decreto 32.883/2018 e pedia a revogação da tutela de urgência, alegando risco inverso relacionado à operação da Petrobras, como incêndios e explosões em local densamente habitado".
Em seu direcionamento, o ministro Nunes Marques ajuíza que, "em cristalina tentativa, pelo estado, de furtar-se à observância de decisão judicial”, ao impedir a renovação da licença de operação da Petrobras no Mucuripe.
Ontem, o Governo do Ceará, via Procuradoria-Geral do Estado (PGE), respondeu que “está se inteirando do conteúdo da recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que é de caráter complexo, para tomar as providências, inclusive avaliar eventual recurso cabível.”
Ao O POVO, a Companhia Docas do Ceará (CDC), administradora do Porto do Mucuripe, afirma que, apesar de não estar envolvida diretamente na devida Ação, "recebe a decisão com satisfação, pois trata-se de um importante ativo, essencial à Grande Fortaleza e ao estado, social e economicamente".
Vale destacar que os proventos relativos à movimentação de granéis líquidos e GLP representam entre 40% e 50% do faturamento do Porto.
O POVO acompanha esse processo há anos. Em 2017, o Complexo do Pecém buscou um parceiro privado para construção da infraestrutura de tancagem. Após demora na confirmação da escolha da Vopak Brasil, após entrave com o consórcio Transpetro/BR/Liquigás entrando com recurso administrativo contestando a decisão, havia previsão de início das obras em 2021, até que veio a desistência da empresa.
Um novo interessado só foi confirmado em 2022, com a assinatura de contrato com a Dislub Equador, que em julho passado encaminhou o projeto aos órgãos ambientais para licenciamento. A ideia da empresa é iniciar as obras de construção em maio de 2023 e operar em 2025.
O POVO também entrou em contato com a Petrobras para buscar posicionamento sobre a decisão. Ainda foi questionado se o processo impediria a operação da empresa no Pecém, caso se instaure um mal estar entre as diretorias, o que poderia também ter contribuído para o fim da operação da empresa com o navio regaseificador no Píer 2 do Pecém, mas não houve retorno até o fechamento da edição.
TRANSFERÊNCIA DA TANCAGEM
A discussão sobre a transferência do parque de tancagem do Porto do Mucuripe para o do Pecém já se arrasta há quase 20 anos. Dentre as razões alegadas estão os riscos à segurança ambiental e à população que reside no entorno do Porto do Mucuripe. Dois incêndios já ocorreram nos anos de 1984 e 1992. Além da limitada capacidade de armazenamento atual na área.
Em 2003 e 2004 vieram os primeiros decretos estaduais prevenindo sobre a necessidade de relocalização das distribuidoras e incentivava a reinstalação em área adequada do Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CIPP). À época já se previa a eventual adoção de medidas jurídico administrativas coercitivas para a compulsória desocupação da área indicada pelos estabelecimentos industriais mencionados.
Outros decretos foram publicados posteriormente, como em 2012, que o Governo do Estado estipulou prazo até 31 de dezembro de 2015 para as empresas instaladas no Mucuripe se transferirem ao Complexo do Pecém, sendo que não havia a infraestrutura de tancagem no Pecém. O Governo não cumpriu a promessa de construção até o fim do prazo e o decreto perdeu sua eficácia.
Por outro lado, em função dos decretos, não foram mais autorizadas licenças estaduais para obras de expansão e de readequação no parque de tancagem já existente. O que reduziu ainda mais a capacidade operacional das distribuidoras.
A decisão do STF se refere ao mais recente decreto estadual, que determinou novo prazo para empresas iniciarem a transferência para o Pecém. A decisão veio após a Seinfra publicar edital, em 2017, para que o Complexo do Pecém encontre parceiro privado para construção de parque de tancagem. No entanto, o parceiro só foi escolhido neste ano e a obra não deve entrar em operação antes de 2025.
Empresas instaladas
No parque de tancagem do Mucuripe atualmente operam a Petrobras Distribuidora (BR), a Shell (Raízen), Ipiranga, SP Combustíveis e Ale Distribuidora. No anúncio da instalação de parque de tancagem no Pecém, a Dislub Equador confirmou a intenção de instalar infraestrutura de combustíveis no Ceará no novo espaço a ser construído, investimento que até então estava congelado por falta de espaço na tancagem de Fortaleza.