Três poços no município de Santa Quitéria, a 223,46 quilômetros de Fortaleza, apresentaram concentração de urânio sete vezes acima do permitido nas águas e foram interditados. A medida busca evitar o risco de contaminação na população local.
O caso foi identificado no distrito de Trapiá há cerca de 10 dias, segundo confirmou a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (Sesa). A concentração além do recomendado para o consumo humano se deu de forma natural, de acordo com a pasta.
"Conforme portaria de potabilidade GM/MS nº 888/21, o valor máximo permitido é de 0,03 miligramas de urânio por litro de água", acrescentou a Sesa em nota ao O POVO.
Mas em 14, de 15 pontos de coleta feitos pela Secretaria, a concentração estava sete vezes acima deste limite. A pasta realiza medições periódicas de água e solo na região, onde existe "alta concentração" de urânio na forma natural.
Uma audiência pública foi realizada na última segunda-feira, 14, no distrito de Trapiá. Na ocasião, a Sesa apresentou as informações e as medidas definidas pelo Governo do Estado, que incluem o envio de 15 carros-pipa para compensar a interdição dos poços.
"A Sesa ressalta que, de acordo com a série histórica de anos anteriores, até o momento não foram identificadas condições clínicas e epidemiológicas de doenças sob suspeita de contato com o metal no distrito, que fica a um raio de 70 km de distância da jazida de Itataia", explicou a Secretaria.
A menção diz respeito à maior jazida de urânio do Brasil, atualmente. Descoberta na década de 1970, a reserva nunca foi explorada comercialmente até hoje. Apenas lavras para medir o tamanho foram executadas pela estatal Indústria Nucleares do Brasil (INB).
Estudos chegaram a investigar a contaminação da população que habita o entorno da mina pelo urânio em estado natural, mas os resultados não foram conclusivos.
Ao O POVO, o Governo do Estado do Ceará afirmou que as decisões de interdição dos três poços e envio de 15 carros-pipa por dia para o abastecimento dos moradores do distrito aconteceu "logo que os laudos saíram", há "cerca de dez dias".
Para atenuar os efeitos do "comprometimento da qualidade da água" por causas naturais, o Estado definiu as seguintes medidas:
Ao O POVO, o governo informou ainda que, com a emissão dos laudos há cerca de 10 dias, "a comunidade foi informada imediatamente por técnicos da Cagece, já com imediata oferta de água por carro-pipa."
Sobre a adutora de água tratada, o Estado informou que "vem do Açude Paulo Sarasate, conhecido como Araras, através do Sistema de Abastecimento de Água da comunidade de Sangradouro, gerenciada pelo SISAR-BAC (Sistema Integrado de Saneamento Rural - Bacia Acaraú e Coreaú) e localizada às margens do açude."
Com previsão de entrar em operação entre esta quarta-feira, 16, e a próxima quinta-feira, 17, "a adutora tem aproximadamente 16.400 metros de extensão, com previsão de bombeamento de 18 metros cúbicos por hora (m³/h)."
"O Governo do Ceará destaca que outras medidas serão adotadas de acordo com a necessidade, com o objetivo de proteger os cidadãos e cidadãs da comunidade de Trapiá", concluiu a nota enviada ao O POVO.
Responsável pelo projeto que quer explorar urânio e fosfato na Fazenda Itataia, o Consórcio Santa Quitéria reforçou que a concentração de urânio na água do distrito de Trapiá não está associado à exploração da jazida - a qual está a 70 km de distância dos poços interditados pelo Estado.
Formado pela INB com a Galvani Fertilizantes, o Consórcio destaca ainda que "o fosfato é o bem mineral preponderante na jazida" da reserva localizada em Santa Quitéria.
O chamado Projeto Santa Quitéria mira a exploração de urânio pela INB, que tem o monopólio do minério no Brasil, com o objetivo de fabricar o chamado yelow cake e enviar para o exterior para produção de pastilhas de urânio a serem usadas nas usinas nucleares de Angra dos Reis.
Já o fosfato, quando dissociado do urânio, deve ser matéria-prima de fertilizantes e alimentação animal produzidos pela Galvani. O objetivo da empresa é diminuir a dependência do Brasil de itens importados e aumentar o fornecimento no Nordeste do País.
"No momento, o Projeto está em fase de licenciamento ambiental junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, não tendo iniciado nenhuma construção ou operação na cidade de Santa Quitéria", observou.
Colaborou Révinna Nobre, especial para O POVO