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Motoristas de aplicativo relatam queda de renda, insegurança e bloqueios enquanto plataformas defendem modelo atual
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Economia

Motoristas de aplicativo relatam queda de renda, insegurança e bloqueios enquanto plataformas defendem modelo atual

Pesquisa aponta que 60,5% deixariam os apps se tivessem outra opção, enquanto trabalhadores relatam jornadas longas, prejuízos e falta de transparência
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PESQUISA aponta que 74,6% do trabalhadores gastam até R$ 3,5 mil para se manter na atividade (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal PESQUISA aponta que 74,6% do trabalhadores gastam até R$ 3,5 mil para se manter na atividade

O trabalho por aplicativo, que há dez anos se apresentava como alternativa rápida de renda e promessa de autonomia, vive hoje um cenário de desgaste entre quem está na ponta.

É o que aponta pesquisa nacional realizada pela GigU — fintech social que oferece ferramentas financeiras e de segurança a motoristas e entregadores — que ouviu mais de mil trabalhadores em todo o País e identificou que 45,4% deles pretendem continuar nas plataformas nos próximos anos, mas apenas até encontrar algo melhor. 

Enquanto isso, 32,9% não pretendem continuar e querem sair dessa área assim que possível. O
percentual daqueles que pretendem continuar porque encaram os aplicativos como principal
fonte de trabalho soma 21,7%.

Para 77%, as plataformas não se preocupam com o bem-estar do trabalhador.

 

A pesquisa mostra também que quase quatro em cada dez trabalhadores ganham até R$ 5 mil por mês, mas 74,6% gastam até R$ 3,5 mil para se manter na atividade. Combustível, manutenção, seguro, alimentação e aluguel de veículos consomem boa parte do faturamento.

O resultado é uma margem estreita: 44,2% relatam dificuldade para pagar as contas, e 43,2% já atrasaram despesas básicas, como água, luz e gás.

Ganhos menores e custos crescentes apertam renda de motoristas

Enquanto tentam fechar a conta, motoristas e entregadores acumulam jornadas longas. Enquanto tentam fechar a conta, motoristas e entregadores acumulam jornadas longas. De acordo com Luiz Gustavo Neves, CEO da GigU, os dados revelam um setor tensionado entre custos altos e remuneração estagnada.

“Tudo subiu — carro, manutenção, combustível —, mas o valor por quilômetro permanece praticamente o mesmo”, afirma.

A falta de transparência é outro ponto de questionamento para mais da metade dos entrevistados. Além disso, 15,5% deles relataram ter sido bloqueados sem explicação das plataformas.

Para o secretário-geral da Associação dos Motoristas de Aplicativos do Ceará (Amap), Rafael Keilon, bloqueios e punições ainda são um ponto sensível.

“Hoje, o motorista deixa cerca de 70% da renda com custos e comissões. Quem roda de carro alugado praticamente trabalha para não dever. E quando vem um bloqueio injusto, muita gente nem consegue se defender”, afirma Keilon.

Apesar disso, ele reconhece avanços recentes no suporte, como a possibilidade de uso de gravação pelo próprio app para contestar acusações injustas.

A visão das plataformas

A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa empresas como Uber, 99 e iFood, afirma que não teve acesso à pesquisa da GigU e, por isso, não comenta seus resultados.

A entidade defende que o setor tem buscado “um modelo regulatório equilibrado”, com mais proteção social e segurança jurídica.

Como contraponto, cita uma pesquisa realizada pelo Cebrap em 2024, segundo a qual:

  • mais de 80% dos motoristas afirmam não querer deixar os aplicativos;
  • 75% dos entregadores querem continuar na atividade;
  • motoristas trabalham, em média, 19 a 27 horas semanais;
  • entregadores, 9 a 13 horas semanais.

A entidade diz que o setor tem participado de discussões com o Governo Federal para construir “um modelo regulatório equilibrado” e afirma que as plataformas mantém canais abertos para atender dúvidas e reclamações sobre bloqueios e suporte.

 

Consenso sobre “mínimo por km”

Se há divergências nos diagnósticos, há um ponto em comum entre motoristas, especialistas e parte das empresas: a necessidade de regras claras.

Para a Amap, o “mínimo aceitável” numa regulação justa incluiria:

  • valor mínimo por quilômetro,
  • valor mínimo por tempo de corrida,
  • adicional noturno, como já previsto na CLT.

A falta de um piso faz com que corridas de R$ 1 por km continuem sendo ofertadas. “Se você não aceita, outro aceita. E assim a categoria inteira perde”, diz Keilon.

Neves, da GigU, reforça que qualquer regulação que aumente custos para motoristas tende a piorar o cenário. Mas vê espaço para avanços. “Os motoristas pedem a foto do passageiro há anos. Isso reduziria riscos. Uma regulamentação pode ajudar nisso”, ressaltou.


Pressionados pela renda e pela insegurança

A pesquisa indica que o trabalhador de aplicativo brasileiro não rejeita os apps — ele rejeita as condições atuais. Para 96,4% dos entrevistados, o principal pedido é claro: aumento nos ganhos por corrida.
Outros fatores apontados como fundamentais:

  • redução das taxas das plataformas (75,1%);
  • mais segurança (58,8%);
  • mais transparência (57,2%);
  • suporte mais eficiente (54%).

Enquanto a discussão nacional sobre o tema avança lentamente, trabalhadores seguem tentando sobreviver em um modelo que, para muitos, ficou desequilibrado demais.

“Se os ganhos voltassem ao que eram em 2018, a categoria já estaria satisfeita”, resume Keilon.

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