Aos 22 anos, Rebeca Andrade já enfrentou muito. A falta de apoio ao esporte no Brasil, a exigência puxada da ginástica, o fato de ser negra dentro de uma modalidade historicamente branca — e recheada de relatos de racismo. Enfrentou ainda três cirurgias de lesões graves no mesmo joelho. Contusões dolorosas, procedimentos dolorosos, reabilitação dolorosa. De certa forma, a pressão de ser a primeira mulher medalhista brasileira na modalidade em Jogos Olímpicos e a forte competição na final do salto sobre a mesa, então, pareciam pequenas.
Na madrugada de ontem, ela deixou mais duas marcas. Hoje, a jovem paulista outrora chamada de "Daianinha de Guarulhos" ouviu o hino nacional no posto mais alto do pódio na Olimpíada de Tóquio. Foi a segunda medalha de ouro da ginástica brasileira na história, depois do título de Arthur Zanetti nas argolas em 2012, e a primeira mulher do País a ficar com mais de uma medalha em apenas uma medalha em apenas uma edição de Jogos.
Prata no individual geral, atrás da norte-americana Sunisa Lee, a brasileira era a favorita no salto, principalmente após a desistência da lenda Simone Biles, que enfrenta um quadro chamado "twisties", problemas físicos e psicológicos relacionados a exercícios da ginástica. Na final única de quatro aparelhos, ela liderou este em específico.
Pressionada, ela teve desempenho abaixo do que fez na final do individual. Mas suficiente. "Eu estou muito feliz. Trabalhei bastante durante todo esse tempo. Não sei nem o que dizer. Realmente não foram os meus melhores saltos. Só que isso é ginástica, isso acontece, é do esporte. Mas tirei uma nota suficiente para me dar o primeiro lugar e estou muito feliz!", comemorou a campeã, em entrevista à Rede Globo, já com a medalha dourada no pescoço.
O favoritismo foi confirmado com a pontuação de 15.083. A prata ficou com a americana Mykayla Skinner e o bronze com a sul-coreana Yeo Seojeong.
Não fosse o adiamento das Olimpíadas, a nova campeã sequer teria competido. Em 2019, ela fez a terceira cirurgia no joelho e teve 8 meses de recuperação. O primeiro dos procedimentos foi em 2015, quando ela tinha 16 anos e cogitou abandonar o esporte. Em 2016, competiu nos Jogos do Rio de Janeiro (RJ), ficando com uma discreta décima colocação. Nos treinos do Pan-Americano de Lima-2019, rompeu o ligamento cruzado anterior do joelho.
Rebeca conquistou a segunda medalha de ouro, décima ao todo, do Brasil na Tóquio-2020. A primeira foi do potiguar Ítalo Ferreira, no surfe. A paulista ainda tem uma boa chance de subir ao pódio. Na madrugada desta segunda-feira, por volta das 5 horas, ela leva seu "Baile de Favela" à competição de solo.
Já na madrugada de amanhã, Flávia Saraiva compete na trave. No masculino, o Brasil tem dois competidores. Hoje, Arthur Zanetti busca o segundo ouro nas argolas, também próximo às 5 horas e Caio Sousa tenta surpreender no salto, às 6h51min.