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Santa Quitéria: Ibama marca audiência pública sobre mineração por 20 anos no Ceará
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Santa Quitéria: Ibama marca audiência pública sobre mineração por 20 anos no Ceará

Esta é uma das etapas obrigatórias do processo para o aval do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) e posterior licenciamento para exploração da mina de Itataia
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Galeria que usaram para fazer as pesquisas dos minérios (urânio e fosfato) (Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Galeria que usaram para fazer as pesquisas dos minérios (urânio e fosfato)

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) marcou as datas das audiências públicas do projeto que visa minerar urânio e extrair fosfato no Ceará por 20 anos. Elas acontecerão nos dias 11 e 13 de março, às 14 horas. 

Esta é uma das etapas obrigatórias do processo para o aval do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) e posterior licenciamento para exploração da mina de Itataia.

Caso haja aprovação, o Consórcio Santa Quitéria, formado pela estatal Indústrias Nucleares do Brasil e a Galvani Fertilizantes, poderia começar as quatro fases da mineração (planejamento, implantação, operação e desativação).

O intuito da audiência é dirimir dúvidas e colher críticas e sugestões ao Relatório de Impacto Ambiental (Rima) relativo ao empreendimento denominado Projeto Santa Quitéria (PSQ), localizado na Fazenda Itataia, no município de Santa Quitéria, a 222,3 quilômetros de Fortaleza.

No dia 11, o momento ocorrerá no espaço CFR Academia, na rua Coronel Antônio Ernesto de Andrade, 134, no Centro do município, com ponto de apoio e transmissão na Escola Municipal Francisco Paiva Rodrigues, na rodovia CE-366, em Riacho das Pedras.

Para o dia 13 está reservada a Quadra de Eventos São Francisco da Paróquia Nossa Senhora do Carmo, na avenida Trajano Honorato, em Lagoa do Mato, no município de Itatira, com ponto de apoio e transmissão na Escola Municipal de Ensino Fundamental Coronel Artur Themoteo, no distrito Saco do Belém, Zona Rural.

As audiências também serão transmitidas em plataforma virtual, online, no link www.youtube.com/@ProjetoSantaQuiteria. Já o EIA/Rima foi disponibilizado para consulta na internet.  

Conforme O POVO publicou em novembro de 2024, o Ibama adiou a realização do encontro que seria em dezembro.

O momento deve contar com representantes do Consórcio Santa Quitéria, Ibama, Ministérios Públicos (Federal, Estadual e do Trabalho), prefeituras, Comissão de Nacional de Energia Nuclear e, possivelmente, Secretarias Estaduais e organizações sociais e comunidades.

Até então, o órgão ambiental analisa os novos estudos das empresas, que estimavam a licença prévia para o primeiro trimestre de 2025 e a operação para o fim de 2028.

E mesmo com as atualizações das datas das audiências públicas, o Consórcio sempre frisou que não há impacto ao cronograma do Projeto Santa Quitéria. Para chegar a 2028 como querem, o caminho exige licenças prévia, de instalação e operação.

Procurado, o PSQ informou à coluna que reconhece a importância das audiências públicas como parte do processo de licenciamento ambiental e, portanto, "se empenha ativamente em apoiá-las".

Destaca ainda que as audiências são momentos importantes para promover a troca de informações, esclarecer dúvidas e ouvir as contribuições da sociedade.

"No entanto, vale destacar que, além das audiências, o projeto mantém contato constante com a comunidade por meio de uma equipe de relacionamento dedicada e dois escritórios locais (municípios de Itatira e Santa Quitéria), facilitando a comunicação contínua com as comunidades."

O Consórcio considera os escritórios como canais adicionais para que os moradores possam dialogar diretamente com a equipe do projeto e "acessar informações de forma constante e transparente."

"Assim, as audiências públicas são uma parte do processo, mas o contato direto com as comunidades é promovido de várias formas."

O que será apresentado sobre o Projeto Santa Quitéria

Na audiência pública, os detalhes do EIA/Rima serão apresentados e as dúvidas serão esclarecidas.

Conforme o documento com o estudo ambiental, o Consórcio terá que implementar medidas mitigadoras para reduzir, prevenir e controlar os efeitos negativos, como a circulação de veículos e outros impactos.

Um exemplo é que o PSQ tem estimativa de R$ 10,8 milhões em compensação ambiental e R$ 81 milhões para recuperação da área impactada ao término das atividades.

Os programas destacados incluem coexistência, gestão do patrimônio arqueológico, monitoramento da qualidade das águas superficiais e sedimentos, monitoramento de ruídos e vibrações, controle da supressão vegetal, recuperação de áreas degradadas, monitoramento da fauna terrestre e aquática, comunicação social, educação ambiental, gestão de tráfego e segurança e monitoramento de interferências em infraestruturas e serviços públicos.

Prospecção de etapas da mineração em Santa Quitéria(Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria)
Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria Prospecção de etapas da mineração em Santa Quitéria

Também serão detalhados os impactos positivos na economia, que são listados, sobretudo, em geração de empregos e oportunidades de negócios.

Como o investimento total de R$ 2,3 bilhões na região pelas empresas, abrangendo Santa Quitéria, que tem a maior extensão territorial do Ceará, com 4262,293 km². O município é o 40º Produto Interno Bruto (PIB) do Estado e tem 40.183 habitantes.

Dentre as quatro fases do projeto, são estimados 2.096 trabalhadores especializados em construção industrial na fase de implantação e 4.192 indiretos. O Consórcio prevê o aproveitamento de até 20% de residentes da região, o que engloba Santa Quitéria, Itatira, Canindé e Madalena. 

Na etapa de operação o número de empregos cai consideravelmente, com previsão de 538 diretos e de de alta qualificação, sendo 56 voltados para a instalação de urânio e 1.076 indiretos.

Ao fim dos 20 anos, na fase de desativação da mina, são prospectados 21 empregos diretos e 42 indiretos.

Quais os impactos do Projeto Santa Quitéria

O maior impacto negativo é previsto no cenário ambiental. Para mitigar, a empresa promete o chamado circuito fechado, em que as águas usadas voltam para sistemas de tratamento para serem reutilizadas nos processos industrias.

Alega ainda que não haverá liberações de líquidos das instalações e que "tudo" será reciclado dentro do processo produtivo. Segundo o EIA/Rima, isso impede que líquidos e efluentes saiam do circuito e atinjam subsolo e cursos d'água.

Já na cava da mina, local de onde se retira o minério, cita-se que a água acumulada da chuva será retirada por bombeamento.

O documento detalha que ruídos e barulhos da construção e operação "não serão ouvidos pelos moradores", pois a comunidade mais próxima está a 3,5 km. Mas o texto detalha que haverá detonações na mina.

Porém, O POVO mostrou que explosões para obras no entorno da Transnordestina assustaram moradores no interior do Ceará, a uma distância maior, a mais de 10 km do centro do município de Quixeramobim.

 

Outro ponto levantado é que a circulação de máquinas e equipamentos poderá gerar poeira.

Quando as atividades forem encerradas, a promessa é de recomposição das áreas alteradas, de modo a restabelecer, "na medida do possível", a condição natural. 

Na etapa de obras, são catalogados três impactos de baixa magnitude, quatro de média e três de alta, alcançando, por exemplo, qualidade das águas superficiais e dos sedimentos, na fase de preparação do terreno.

Também é apontada redução da cobertura vegetal nativa, perda de habitats e alteração da biodiversidade, com perda de representantes de espécies da fauna.

Espécie de morcego ameaçada de extinção encontrada na área da mina(Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria)
Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria Espécie de morcego ameaçada de extinção encontrada na área da mina

E na fase de operação são previstos dois impactos de baixa magnitude, cinco de média e duas de alta.

Após os 20 anos, para desativar, são listados cinco impactos médios, um baixo, e um alto.

Dentre as mitigações, elenca o EIA/Rima:

  • Eliminação da barragem de rejeitos
  • Redução no consumo de água
  • Aumento da autossuficiência em relação à produção da energia elétrica
  • Diminuição da área de supressão vegetal
  • Reduções nas interferências em cavidades de relevância alta

Não se espera ainda "impactos de elementos radioativos dispersados a partir de pilhas de materiais."

O que pode acontecer com os animais na área da mina de Itataia

Na área do projeto foram registradas 24 espécies de mamíferos terrestres, sendo grande parte de médio e grande porte, e é citado o risco de perda de fauna.

Como exemplos de espécies catalogadas: gato-maracajá, mocó, gato-mourisco, onça parda, macaco-prego e tatu-galinha. Todos são considerados raros em outras regiões devido à caça ou destruição do ambiente em que vivem.

Para além destes, foram vistos abelhas, insetos e aves.

O que está previsto em relação às plantas da região

Das plantas, foram catalogadas 105 espécies e para a implantação do projeto é necessária a remoção de cerca de 360 hectares (504 campos de futebol) de cobertura vegetal, o que pode refletir na fauna e flora.

A compensação prevista tanto para animais quanto plantas é o resgate de espécies para, após os 20 anos, replantar e reintroduzir à natureza. Também há medida em caso de atropelamento de animais no EIA/Rima.

Impacto social em Santa Quitéria

Em relação aos trabalhadores, devido à especialização da atividade, o estudo frisa que a maior parte virá de outras regiões.

"As comunidades, acostumadas com a tranquilidade do campo, passarão a ter, durante um bom tempo, uma vizinhança mais agitada", complementa o documento.

Neste caso, a estrada principal, a CE-366 é a que terá mais fluxo de veículos e é levantado que aumentará a busca por serviços públicos, como saúde e educação, durante 34 meses.

"Toda essa movimentação poderá ocasionar conflitos, pois nem sempre as necessidades de referências culturais da população de fora coincidem com a local."

Por outro lado, o Consórcio frisa que a economia será desenvolvida, pois os trabalhadores serão consumidores dos produtos e serviços da região, bem como haverá a arrecadação de mais tributos, sobretudo com os royalties da mineração.

Mas na fase de desativação da mina, o estudo mostra que pode haver preservação de alguns postos de trabalho, bem como negócios e fornecedores. "Os novos impactos ambientais deixarão de ser negativos e se intensificam medidas de recuperação."

Porém, há o alerta de que as lideranças e os governantes, com auxílio do plano de descomissionamento, deverão, com antecedência, planejar o futuro e buscar nova vocação para a região.

Entenda o Projeto Santa Quitéria

Descoberta na década de 1970, a reserva da Fazenda Itataia, em Santa Quitéria, é a maior jazida do País para o urânio.

A tentativa de uma nova exploração ocorre desde o início dos anos 2000 e teve, há três anos, mais uma investida pelas empresas. Com a apresentação do projeto, o Ibama pediu esclarecimentos e uma revisão do EIA/Rima foi feita.

Inédito no mundo, o processo de dissociação do urânio do fosfato é preciso para que os dois minerais encontrados no Ceará sejam aproveitados. O investimento previsto para as plantas minero-industrial é estimado em cerca de R$ 3 bilhões para 20 anos de exploração da jazida.

O objetivo é a produção anual de mais de 1 milhão de toneladas de fertilizantes fosfatados, 220 mil toneladas de fosfato bicálcico (suplementação animal) e 2,3 mil toneladas de concentrado de urânio.

Quais cidades ficam na abrangência do da mina

Santa Quitéria é o município central do projeto, que abrange ainda Itatira, com o centro urbano mais próximo da mina, além de Madalena, que será afetada mais pela rota logística.

O projeto considera 97 localidades, com foco especial em 29, incluindo oito comunidades a menos de 5 km de distância, e quatorze próximas à rodovia CE-366. 

Tem ainda Canindé, que é uma referência local para serviços especializados e é o mais populoso dos municípios estudados.

As oito comunidades próximas ao Projeto são compostas por:

  1. Morrinhos
  2. Queimadas
  3. Cantina
  4. Pajeú
  5. Barriguinha
  6. Quixabá
  7. Fazenda Ponteira
  8. Fazenda Tapera

Marsupial catalogado no estudo ambiental(Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria)
Foto: EIA/Rima Projeto Santa Quitéria Marsupial catalogado no estudo ambiental

Há também 14 comunidades localizadas perto da CE-366 que serão impactadas pelo tráfego de veículos do Projeto:

  1. Macaoca
  2. Sabonete
  3. Santana
  4. Barro Vermelho
  5. Machadinho
  6. Poço de Pedra
  7. Bola de Ouro
  8. Boa Vista
  9. Núcleo principal de Umarizeira
  10. São Joaquim
  11. Lagoa do Mato
  12. Mourão
  13. Fazenda Oriente/Novo Oriente
  14. Raposa

Veja: Projeto Santa Quitéria | Trailer O POVO+ | Exploração de urânio e fosfato gera conflito no Ceará

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