O primeiro debate oficial entre os dois candidatos a presidente dos Estados Unidos surpreendeu até os mais experientes analistas. Isso, pela quantidade de ataques e falta de propostas dos oponentes. Segundo especialistas, faltaram ideias mas sobraram acusações e interrupções.
Para Manuel Furriela, reitor do Centro Universitário FMU e especialista em Direito Internacional, o debate foi confuso. Não pelo formato, mas porque os debatedores, em especial, Donald Trump, interrompiam as falas um do outro constantemente.
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"Trump é um comunicador experiente e usou da sobreposição para desestruturar questões que seriam mais delicadas no debate. Joe Biden partiu para uma estratégia parecida, mas o primeiro foi mais assertivo", aponta.
Pelo desempenho, foi possível extrair estratégias de campanha a serem repetidas, explica Furriela. Na avaliação dele, Trump tentou esvaziar questões polêmicas e fugir de problemas graves, como a crise da Covid-19, que o presidente chamou constantemente de "vírus chinês". Já Biden, com discurso moderado, buscou demonstrar mais segurança.
"Pareciam dois cachorros brigando numa praça", avalia Bosco Monte, professor de Relações Internacionais e presidente do Instituto Brasil África. Esse comportamento, segundo ele, já era esperado de Donald Trump, que utilizava a mesma estratégia na eleição contra Hillary Clinton, em 2016.
Mas, de acordo com o professor, Biden acabou "comprando a briga". O resultado, sintetiza, foi uma discussão cheia de acusações e insultos, desrespeitosa inclusive com o mediador Chris Wallace, que precisou, por diversas vezes, pedir respeito ao tempo de fala e pedir comedimento aos participantes.
"Essa retórica de Donald Trump, de confrontação e beligerância, é destinada a sua claque. Mas, com isso, ele perdeu a chance de explicar outros assuntos, como racismo e crise econômica, e reverter uma possível votação que a oposição vai ter", analisa Monte.
Por outro lado, de acordo com o professor, Biden desperdiçou oportunidade de destacar sua candidata a vice, Kamala Harris, advogada, mulher negra e ativista, que já ocupou vaga no Senado e se opõe a diversas medidas de Trump, como a revogação do Obamacare e as restrições em políticas de imigração.
Doutor em Sociologia e professor da Universidade do Vale do Acaraú (UVA), Marcos Paulo Campos destaca o fato dos debates nas eleições americanas ocorrerem quando os eleitores já estão muito decididos, pois os candidatos já foram vistos e defenderam suas ideias durante as prévias dos partidos. Para ele "o candidato vai mandar o recado para os seus. Trump precisa ser agressivo, se impor, ir contra as regras, pois se apresenta assim desde o início. Já Biden vai ser ele mesmo, mais moderado", explica.
Durante o debate da última terça-feira, Joe Biden citou a pauta ambiental e a Amazônia, afirmando que países sofrerão sanções "se continuarem queimando a floresta", sem mencionar diretamente o Brasil.
Na avaliação de Campos, ao fazer isso, Biden se direcionou aos democratas que apoiam a causa ambiental como um tema cosmopolita e ainda quis atingir republicanos e até democratas que "gostam de ver os Estados Unidos dando ordens a outros países", explica.
Campos resume o debate como confronto marcado pelas posturas de um "republicano radical que tenta animar todo o eleitorado republicano e um democrata moderado que tenta obter um pedaço moderado do eleitorado republicano."