Após intenso embate acerca da inclusão da Parada pela Diversidade Sexual no calendário oficial do Ceará, a nova polêmica na Assembleia Legislativa (AL-CE) reside em projeto de lei apresentado pelos quatro deputados do PT na Casa sobre aplicação de multas a quem discriminar, ofender ou incitar violência contra outras religiões. Parlamentares ligados à igrejas evangélicas e de perfil conservador reagiram à iniciativa.
O argumento central é de que o conteúdo do projeto atenta contra a autonomia de líderes religiosos e, consequentemente, contra a liberdade de culto. Acompanhados pela deputada Dra. Silvana (PL) e pelos parlamentares Vitor Valim (Pros), André Fernandes (PSL) e Nelinho (PSDB), pastores evangélicos lotaram a antessala da Presidência da AL-CE. Ali, aguardavam reunião com o presidente da Casa, José Sarto (PDT), na tentativa de vetar o andamento da proposta.
Numa investida contra o texto, o presidente da Ordem dos Ministros Evangélicos do Ceará (Ormece), Paixão Cordeiro, entregou a Sarto documento que discorre sobre a suposta inconstitucionalidade da matéria, com pelo menos 30 rubricas de líderes religiosos. "Um negócio desse passando, quem vai ser prejudicado? São os cristãos. (...) Estamos voltando à inquisição."
Antes de dar entrada nas comissões, o texto é analisado pela procuradoria da AL-CE, que emite parecer sobre o projeto. Na prática, uma posição da procuradoria tem efeito nulo. Isso porque os deputados podem dar seguimento à proposta independente da posição adotada por este departamento.
"Imagina uma igreja, aí chega alguém lá dessa cultura afro, que agora não pode dizer mais afro, é matriz africana, aí chega lá no culto e diz quero entrar, mas quero trazer minha galinha aos orixás, aí o pastor diz 'tá repreendido em nome de Deus', ele vai ser multado", explica Silvana.
André Fernandes (PSL) também se opõe ao projeto. Ele diz ter consultado juristas, que o alertaram que a ideia dos petistas tem lacunas que podem abrir brecha para interpretações danosas aos religiosos.
Também estiveram com Sarto o presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, Antônio Henrique (PDT), e a vereadora Priscila Costa (PRTB), ambos evangélicos. Esposo de Silvana, o deputado federal Jaziel Pereira (PL) também foi ao encontro.
Silvana postou em rede social foto dos quatro deputados do PT na qual os chama de "inimigos da liberdade de crença". Em conversa com O POVO, a deputada detalhou que o post foi sugestão de grupo de pastores e disse que os dizeres da publicação foram uma construção coletiva.
Vice-presidente da AL-CE, Fernando Santana (PT) diz ter carinho por Silvana, sem deixar de apontar que a conduta, a seu ver, é inadequada. Ele disse que cogita processá-la pela postagem, o que ainda decidirá com advogados. "Acho que um colega parlamentar não pode estar publicando nada contra o outro, ou para benefício próprio ou para prejudicar o outro."
Segundo Elmano de Freitas (PT), os deputados não conseguem dizer qual o artigo do projeto que são contrários. Ele cita que a redação ainda será aperfeiçoada.
De acordo com o texto, estará passível de multa quem recusar-se a alugar ou vender bens móveis ou imóveis para indivíduo ou grupo que queira professar outro tipo de credo.
O líder de Camilo Santana na Assembleia, Júlio César Filho (Cidadania), destaca que a base do governador é extensa e, como consequência disso, diversa, o que torna estes embates naturais. Então, quando a matéria é de natureza religiosa, ele diz, a orientação é de liberar o voto da bancada. Para ele, a disputa ideológica é reflexo da conturbação do cenário nacional e não atrapalha a pauta da gestão do Executivo, que está pujante, segundo ele. "Uma coisa não impede a outra."
ACENO
Reservadamente, um deputado disse que, com o projeto, a intenção do PT foi acenar para segmentos mais conservadores da sociedade, o que não se conseguiu.