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Os voos de Ruediger: o alemão de 81 anos que fez do kitesurfe sua morada no Ceará
Reportagem

Os voos de Ruediger: o alemão de 81 anos que fez do kitesurfe sua morada no Ceará

O alemão Ruediger Ran encara a depressão, supera o peso da idade e faz do kitesurfe sua casa no Ceará. Há dez anos, ele viaja à Praia da Taíba para reencontrar a juventude encarar o mar do alto de uma pipa
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TAIBA, CE, BRASIL,24-10-2019: Ruediger Ran, Alemão de 81 anos vem para o Brasil praticar kite surf.  (Foto: Fabio Lima/O POVO) (Foto: FÁBIO LIMA/O POVO)
Foto: FÁBIO LIMA/O POVO TAIBA, CE, BRASIL,24-10-2019: Ruediger Ran, Alemão de 81 anos vem para o Brasil praticar kite surf. (Foto: Fabio Lima/O POVO)

Aos 71 anos, Ruediger Ran descobriu o kitesurfe e redescobriu-se jovem. Aos 81, ele segue renovando a juventude nos litorais cearenses a cada ano. Em plena terceira idade, o alemão encontrou um novo sentido para a vida. Era 2009. De férias no Ceará, ele resolveu arriscar no esporte que havia conhecido no litoral de Cabo Verde. Foi na Praia da Taíba, em São Gonçalo do Amarante — cidade a 62,5km de Fortaleza — que o aventureiro achou a combinação perfeita de condições e espaço para desfrutar aquilo que se tornaria o universo particular e introspectivo dele.

A mescla do kitesurfe com o litoral oeste cearense — meca do esporte sobre ondas —, mudou a vida do alemão de Ravensburg. O deslize nas águas do mar da Taíba em cima da prancha, em conexão com a pipa alçada ao céu, ajudou a tirar dele o peso da depressão.

"Minha vida são 12 meses. Em 8 meses, eu penso: 'Ah, no próximo ano tem o kite e eu posso fazer isso, posso fazer aquilo", diz, num inglês puxado no sotaque alemão.

Coube ao Ceará oferecer a paz interior que Ruediger buscava. Em 2009, a Taíba foi adotada como o porto seguro para a prática do kite — o combustível que mantém corpo e mente relativamente jovens. Desde então, a viagem para São Gonçalo do Amarante entrou no calendário anual. Troca o sul da Alemanha por quatro meses pela vastidão das areias da praia e a tranquilidade do hotel Vila Marola.

A viagem virou uma espécie de ritual. Na maioria das vezes, quem vem é apenas Ruediger, com seu estilo discreto e reservado. A independência é exigência. Não gosta depender de ninguém e cultiva hábitos bem próprios. Já íntimo do que lhe cerca, vê o ambiente se adaptar aos próprios hábitos. Se não era regra antes, a gastronomia com opções à base de lentilha entraram no cardápio do hotel por causa do hóspede cativo.

A rotina do estrangeiro é seguida à risca, entre entradas e saídas do mar durante todo o dia. Ruediger acorda cedo. Toma o café da manhã, exercita-se e parte rumo às salgadas águas. O ritmo é lento. Não há pressa. O que importa é desfrutar cada momento. O aventureiro caminha rumo ao galpão e leva os equipamentos até a beira mar. Passados os minutos de preparação, perde-se na imensidão azul-esverdeada — ou verde-azulada.

TAIBA, CE, BRASIL,24-10-2019: Ruediger Ran, Alemão de 81 anos vem para o Brasil praticar kite surf.  (Foto: Fabio Lima/O POVO)
Foto: FÁBIO LIMA/O POVO
TAIBA, CE, BRASIL,24-10-2019: Ruediger Ran, Alemão de 81 anos vem para o Brasil praticar kite surf. (Foto: Fabio Lima/O POVO)

Ruediger deslizando no mar é cena que impressiona. A aparência e as atividades não evidenciam a idade do alemão. Magro, cabelo grisalho, pele bronzeada, o corpo com músculos e veias que saltam. Era uma quinta-feira ensolarada quando ele recebeu O POVO para retratar essa história de intimidade e sintonia com o kitesurfe.

Quando a conversa se inicia, o Ruediger reservado dá lugar ao carismático aventureiro — caras, bocas, sorrisos, onomatopeias, gestos. Em uma hora de bate-papo, a emoção tomou conta do alemão ao explicar a importância do kite na vida dele, que foi da doença à leveza ao conectar-se ao mar quente do Ceará.

"O kitesurfe foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida (nos últimos dez anos). Eu me sinto vivo. É um lugar onde posso relaxar, me esquecer de tudo, das besteiras que políticos falam, das guerras, de tudo o que está acontecendo. Esse lugar, o clima, o kite, tudo me faz desligar e não pensar em nada. Só me divertir".

Em dez anos frequentando o mesmo hotel, Ruediger virou espécie de xodó para funcionários e hóspedes. São hoje laços firmes de amizade com os proprietários do empreendimento, o casal de lituanos Sigita Pipiriene e Arunas Pipiras. Hoje, não é o dinheiro que paga a estadia do kitesurfista da terceira da idade — candidato a praticante mais velho do mundo da modalidade. O preço é um só, que vale mais que euros, reais, marcos ou litas.

Especial

A vida de Ruediger vai além dos relatos. Mas estes relatos também não se fecham nestas cinco páginas de jornal. O material conta ainda com um especial online, com três textos que não foram impressos. E fica completo com mais fotos de Fábio Lima e um vídeo exclusivo. Acesse em especiais.opovo.com.br/osvoosderuediger/

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