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Instituições calculam perdas em financiamento da educação estadual de até R$ 750 milhões em 2020
Reportagem

Instituições calculam perdas em financiamento da educação estadual de até R$ 750 milhões em 2020

A pandemia de Covid-19 requer uma série de adaptações para tonar possível o ensino remoto e o retorno das aulas presenciais. Contudo, a baixa arrecadação de impostos pode se impor como entrave financeiro
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Volta das atividades presenciais no Ceará ainda não tem data para acontecer (Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Volta das atividades presenciais no Ceará ainda não tem data para acontecer

O financiamento da educação no Ceará terá um rombo que pode chegar a R$ 750 milhões em 2020, somente na rede estadual de ensino, devido à pandemia de Covid-19. O prognóstico é feito pela ONG Todos Pela Educação, em estudo em parceria com o Instituto Unibanco. Conforme especialistas, se não for reposta com recurso destinado diretamente à educação, a queda de arrecadação de impostos pode levar ao colapsamento das redes públicas de ensino. Como resultados, as escolas poderão ter de romper contratos com professores e não poderão fazer as adaptações necessárias para o retorno às atividades presenciais.

 

Subfinanciamento da educação do Ceará na pandemia
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A análise do estudo prevê três cenários para o Ceará: otimista, com déficit de 8% (R$ 240 mi) na receita para educação; neutro, com queda de 15% (R$ 450 mi); e pessimista, com baixa de 25% (R$ 750 mi). No Brasil, o desfalque nos cofres da educação será entre R$ 9 bilhões e R$ 28 bilhões. A pesquisa tem por base dados do Tesouro Nacional, informações consolidadas das receitas tributárias de abril e maio, e estimativas de especialistas que perfazem uma projeção dos tributos vinculados à manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE) em 2020.

Para Caio Callegari, coordenador do Todos Pela Educação, à frente da coordenação de produção técnica do estudo, a situação, ainda que se consolide o cenário intermediário, já é de “perdas muito significativas”. “O orçamento da educação é quase que exclusivamente, 80% dele, destinado para folha de pagamentos, tanto de profissionais contratados em regime contínuo, quanto temporários. Tal é a magnitude da queda que, se não tivermos compensação, os profissionais de educação vão ter salários atrasados ou, principalmente os temporários, correm o risco de demissão”, assevera. Pelas projeções, entre setembro e outubro deve começar a faltar recursos nos caixas para honrar os pagamentos mais básicos.

A educação básica tem por alicerce recursos advindos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que por sua vez tem como principal tributo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). No Ceará, o acumulado nos últimos dois meses mostra uma redução de 39% do repasse. Por meio de nota, a Secretaria Estadual da Educação (Seduc), afirmou que “mesmo com essa redução, a pasta tem garantido a manutenção da qualidade do ensino”.

O estudo não engloba o prejuízo que terão as redes municipais de ensino - alvo de análise futura, ainda a ser lançada também pela ONG. Callegari indica que já é possível prever também queda no financiamento na instância municipal, uma vez que os municípios também dependem da arrecadação estadual. “Muitas escolas de municípios mais pobres não vão ter condição de reabrir, ou porque não vão ter como remunerar os professores ou não vão ter condições sanitárias de abertura”, projeta.

Caio Callegari é coordenador de Produção da ONG Todos Pela Educação
Foto: Divulgação / Todos Pela Educação
Caio Callegari é coordenador de Produção da ONG Todos Pela Educação

Já uma outra pesquisa, lançada ainda em maio pela Campanha Nacional Pelo Direito à Educação juntamente com a Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), indica também três cenários, no âmbito nacional, com quedas de repasses de R$ 17,2 bi, R$ 34,8 bi ou R$ 52,4 bi - já contando com redes estaduais e municipais.

O subfinanciamento da educação não se limita à pandemia e já estaria, conforme Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em um patamar de três a cinco vezes menor (dependendo da etapa e modalidade) do que deveria estar sendo investido em tempos fora da crise gerada pela pandemia. “Em momentos de crise como o que estamos vivendo, que geram impactos estruturais para a proteção e o desenvolvimento social e, com isso, para a garantia de direitos, é preciso investir mais em saúde, educação e assistência social se quisermos não só prevenir violações como também segurar uma bola de neve que gere uma crise econômica e social ainda maior”, aponta.

As análises também são compartilhada por Luiza Aurélia Costa dos Santos Teixeira, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação - Seccional Ceará (Undime-CE), que detalha que, com a queda de recurso do Fundeb e dos fundos municipais, muitas cidades já “sinalizam que terão dificuldade de honrar os compromissos com a folha de pagamento”. “Temos municípios que demitiram os contratados temporários, reduziram o percentual dos cargos comissionados e outras medidas para driblar a crise. É um terço da receitas que não entra. Para o Ceará, em que os municípios já tinham comprometimento, é grave. Se não houver a recomposição de receita, nós vamos ter de fechar as portas das secretarias de educação, porque não vai ter o que fazer”, teme.

Com projetos de socorro emergencial em vias de tramitação no Legislativo Nacional, a Seduc indicou que “as propostas do legislativo a respeito do financiamento da educação são fundamentais, pois a promoção do ensino público de qualidade, de forma equitativa, demandará também esforços emergenciais de cooperação federativa para possibilitar que as redes estaduais e municipais tenham condições orçamentárias de garantir o acesso de todos os estudantes ao direito constitucional à educação de qualidade”.

 

Soluções em três instâncias para superar o déficit na educação
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MEC

O POVO procurou o Ministério da Educação (MEC) por meio da assessoria de imprensa, por email e telefone, ainda em 19 de junho. Sobre as perguntas enviadas, foi informado que teriam sido repassadas a área técnica para que houvesse um retorno. As perguntas seguiram sem respostas até a publicação desta matéria.

1.O MEC tem estudado e irá promover alguma medida sobre em que parâmetros sanitários e pedagógicos se dará o retorno às atividades presenciais nas escolas das redes públicas?

2.Há estudos que levam em conta a redução de arrecadação fiscal, e que servem de base para o PL 3165, que apontam para um déficit no financiamento da Educação no País em torno de R$ 31 bi. Quais medidas o MEC tem estabelecido para mitigar os problemas?

3.O Governo Federal adiantou os recursos do PDDE. Há previsão de aportar recursos adicionais para as redes estaduais e municipais para o enfrentamento à pandemia?

4.Para o retorno às aulas, as escolas terão de fazer adaptações como instalação de pias, compra de álcool em gel e EPIs, aberturas de janelas, horas extras para professores (para reposição de aulas em contraturno e para aulas com menos alunos em sala). Como o MEC apoiará financeiramente essas mudanças?

5.Como o MEC vê a possibilidade de o Fundeb não ser votado este ano (pergunta ainda feita em junho)? Qual o percentual de contrapartida da União que MEC vê como possível?

 

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