O debate envolvendo a reforma da Previdência de servidores municipais esquentou ânimos dentro e fora da Câmara de Vereadores de Fortaleza. Duas propostas de emenda à lei orgânica estão no Legislativo.
Na prática, os textos formam as bases para que o sistema previdenciário da Capital seja de fato reformado, o que deve ocorrer na sequência e por meio de lei complementar.
Sob pressão de servidores e de entidades sindicais, a Casa aprovou na última quarta-feira, 10, em primeira discussão, uma das emendas, a 04 (ver infográfico).
O texto impõe mudanças como a da desvinculação dos salários de servidores aposentados e os ativos. Antes, a aposentadoria era reajustada na mesma data e proporção das mudanças promovidas nos salários dos que servidores ativos.
As mudanças no sistema previdenciário fortalezense atendem a determinação fixada na Constituição Federal. Quando a Previdência Social foi reformada a nível federal, em 2019, a emenda 103 obrigou que estados e municípios também alterassem suas previdências, a partir das respectivas assembleias legislativas e câmaras municipais.
A idade mínima, por exemplo, outra alteração contida na emenda 04, segue o que foi aprovado nacionalmente: 65 anos para homens e 62 para mulheres. Àquele período, em Brasília, jogar sobre os demais entes da federação a responsabilidade de fazerem as próprias reformas foi um movimento do governo Bolsonaro entendido como um meio de "repartir" o desgaste político natural dessas matérias.
Protestos foram registrados na Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE) em dezembro de 2019. Debaixo de manifestações, o plenário aprovou a matéria após somente 10 dias de tramitação.
O tempo de discussão na Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) tende a ser maior, pois a segunda discussão só pode ser retomada 10 dias após a primeira. Mas a intensidade da reação de servidores é similar.
A gestão do prefeito José Sarto (PDT) prometeu que a condução do tema será com diálogo. O secretário de Articulação Política, Ésio Feitosa (PSB), sentou nessa quinta-feira com representantes de 17 entidades sindicais.
"A nossa atual previdência é totalmente deficitária. O município de Fortaleza precisa aportar, de recursos próprios, somente neste ano, mais de 400 milhões de reais para pagar aposentados e pensionistas e, se nada for feito, haverá uma escalada que alcançará R$ 1 bilhão já nos próximos 10 anos", argumentou Feitosa ao site da Prefeitura.
Ao O POVO, o parlamentar de oposição Guilherme Sampaio (PT) destacou que não se opõe ao fato de que é necessário alterar a Previdência em função da obrigatoriedade, mas sim ao conjunto de novas regras encaminhado à Casa, com revogação, por exemplo, de anuênios e licença prêmio.
"A imensa maioria dos vereadores participou (do debate) sem sequer conhecer a matéria. Os artigos que estão sendo revogados, caso seja aprovada a matéria, boa parte deles nada tem a ver com a reforma da Previdência em nível nacional", criticou Sampaio, para quem a mobilização social resultará em recuo da administração municipal.
Quando fala na perda de anuênios e gratificações, Sampaio se refere ao texto de número 02, que ainda será levado à votação e traz consigo série de revogações. Sobre isso, o líder do governo Sarto na Câmara, Gardel Rolim (PDT), explica que não se tratam de direitos perdidos.
Argumenta que para que a Lei Complementar de reforma vá ao Legislativo com nova proposta de alíquota - porcentagem retirada do salário para contribuição com a Previdência -, tempo de contribuição, previdência complementar e outros elementos, "precisaríamos revogar alguns artigos da lei orgânica e reescrever outros."
E adiciona: "Acredito muita na força do diálogo, antes de deflagrarem qualquer paralisação, vamos conseguir superar as diferenças no diálogo."
Em nota, Ronaldo Martins (Republicanos) sublinhou que o ente federativo que não possui o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP) será "extremamente prejudicado, ficando impossibilitado de receber recursos de transferências voluntárias e financiamentos internos e externos, recursos esses essenciais para o investimento em saúde, infraestrutura e diversas outras necessidades da nossa cidade."
A vereadora Adriana do Nossa Cara (Psol) criticou a tramitação em urgência, um mecanismo que encurta prazos do Legislativo e que, para ela, atrapalhou o debate na Casa e com a sociedade.
"Não poder mais receber uma pensão, seu filho não receber uma pensão, sendo que o filho é uma criança com deficiência. É golpe nos servidores. Não concordamos com a forma e o método, 'tratorando' a possibilidade de discussão."