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Como entrar em 2022 com as contas no azul
Reportagem

Como entrar em 2022 com as contas no azul

Especialistas dão dicas sobre como pagar dívidas em atraso, ter melhor controle financeiro e domar o orçamento doméstico
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Walfrido Viana Furtado diz usar menos cartões de crédito e débito possíveis  (Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Walfrido Viana Furtado diz usar menos cartões de crédito e débito possíveis

 

 

O ano de 2021 foi desafiador para a economia dos brasileiros. Com a inflação atingindo dois dígitos, novas elevações em 2022, e pressões no bolso impulsionadas por produtos como combustível, energia elétrica e alimentos, manter as contas em dia e entrar 2022 no "azul" vai exigir um verdadeiro malabarismo orçamentário. 

Além disso, a desocupação no País também está elevada. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego ficou em 12,1% no trimestre encerrado em outubro.

Isso significa que pelo menos 12,9 milhões de brasileiros estão à procura de novos postos de trabalho.
Diante deste cenário, especialistas dão dicas para equilibrar as contas e começar 2022 com as finanças sob controle.

Para Davi Azim Filho, economista e membro do Conselho Regional de Economia da 8ª Região – CE, o principal é “pesquisar” antes de efetuar uma compra.

“Uma regra de ouro é pesquisar bastante, fazendo comparações não somente em estabelecimentos físicos, mas também no e-commerce, para obter o melhor preço,” aconselha.

Azim também lembra que o começo de um ano traz uma série de contas como IPTU, IPVA e material escolar, o que necessita de um controle orçamentário para conseguir pagar tudo. “Essas contas pesam muito no orçamento das famílias. Por isso é importante verificar quanto ganha e, a partir daí, equalizar as finanças”, afirma.

Outra dica é o compartilhamento de rotas para o trabalho. “Se você mora perto de um amigo que trabalha no mesmo local que você, dê carona a ele numa semana e deixe-o te levar na outra. Com isso, você diminui os custos com o combustível, que foi um dos vilões da inflação em 2021 e que deve continuar pressionando a inflação nesse ano”, explica.

Mas não é só isso. Os itens da alimentação do dia a dia também estão pesando mais no bolso. De acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), dos 12 produtos que compõem a cesta básica em Fortaleza, sete sofreram reajustes, o que fez com que a inflação fosse de 2,91%.

Assim, com a mais recente alta, para adquirir a cesta básica completa, o trabalhador precisa desembolsar pelo menos R$ 580,36. Isso equivale quase 50% do salário mínimo, que passou de R$ 1.100 no ano passado para R$ 1.212 em 2022.

Ou seja, na prática, ainda que o consumidor decida segurar o impulso de ampliar seus gastos, ele acaba gastando em uma ida ao supermercado a mesma coisa, ou muitas vezes mais, e saindo com o carrinho mais vazio. Um cenário que não deve ser muito diferente no ano que se inicia, por isso, Azim chama atenção para as escolhas. Ele aconselha a substituição de produtos, para diminuir os custos da cesta básica.

"Se, por exemplo, você está acostumado a comprar margarina, faça a substituição por manteiga" Davi Azim Filho, economista e Corecon-CE

O professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador de finanças comportamentais, Érico Veras Marques, lembra que o fundamental é não somente iniciar 2022 com as contas no azul, mas também ter cuidado para não gerar novas dívidas.

Veras classifica as dívidas em três patamares: as pequenas, que podem ser contornadas com o próprio salário; as médias, que precisa de um equilíbrio financeiro maior; e os superendividados, que devem focar inicialmente nas contas mais emergenciais como água, luz e alimentação, deixando outras como cartão de crédito e cheque especial para o futuro.

“Importante frisar que não dá para sair do endividamento de hoje para amanhã. Para isso, é preciso um planejamento e colocar na balança quais as contas mais urgentes a serem pagas. Depois, é negociar as outras dentro de parcelas que caibam no orçamento”, afirma.

No caso de pessoas que perderam o emprego ou tiveram redução na renda, Veras aconselha a revisão de gastos, como a troca do carro por um modelo mais econômico, a da casa por outra com o aluguel mais barato, além de controlar os gastos domésticos.

Outra dica dada por Veras é pensar em buscar uma linha de crédito para pagar as dívidas em atraso. No entanto, isso deve ser feito apenas quando o valor dos juros do financiamento forem menores que os juros das dívidas e que as parcelas se encaixem no orçamento das famílias.

“Se uma família ganha R$ 3 mil e gasta R$3  mil, não tem uma reserva de emergência. Por isso, não adianta ela negociar uma dívida de R$ 10 mil em parcelas de R$ 600, porque não vai conseguir pagar. Nesses casos, o aconselhável é focar nas contas essenciais e deixar as outras para um segundo momento,” finaliza o professor.

 

 

Principais dicas

 

 

Como renegociar dívidas

 

A pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), revelou que até novembro 75,6% das famílias brasileiras estavam endividadas. O número é 1% superior ao da pesquisa de outubro e 9,6% maior que o registrado em novembro de 2020, atingindo mais de 12 milhões de famílias.

“Manter orçamento familiar sob controle é um dos principais desafios das famílias, principalmente num contexto de desemprego recorde e baixa remuneração, que estamos tendo desde o início da pandemia e até antes, com a recessão de 2014 a 2016”, reflete Lauro Chaves, economista e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece).

No entanto, ele aconselha que as famílias precisam gastar menos do que ganham, e fazer uma reserva de emergência, para cobrir gastos que sempre aparecem, como despesas de saúde ou alguma manutenção. “A palavra-chave para não estourar o orçamento é disciplina. E também devemos entender que o padrão de vida que devemos ter é o que podemos, e não o que queremos.”

Mas se a pessoa está endividada, a melhor saída é tentar negociar. “O principal é pagar as dívidas essenciais como água e luz. As outras podem ser negociadas. Nesse momento de nossa economia, agentes financeiros precisam negociar, para o endividamento não ficar em patamares dificílimos de serem quitados”, afirma o economista Davi Azim.

No caso de dívidas bancárias, a melhor opção é buscar portabilidade para um banco que ofereça taxas menores. Outra opção é pegar um empréstimo, desde que a taxa de juros seja mais baixa que a da dívida.

Para Érico Veras Marques, toda dívida tem uma “história”. Uma pessoa, por exemplo, pode contrair dívidas porque perdeu o emprego ou teve uma diminuição na renda, mas quando ela voltar ao status anterior, vai colocar todas as contas em dia.

“Em casos extremos não tem jeito. O melhor é focar no que é fundamental como alimentação, água e luz, deixando o nome sujo por um tempo com as demais até aumentar a renda para poder efetuar o quitamento das dívidas”, pontua.

De acordo com Veras, um aspecto que contribuiu significativamente para o aumento do endividamento da população foi a crise econômica causada pela pandemia do covid-19. “Discutir dívidas num cenário de quase dois anos de pandemia é mais complicado, porque agora é que as coisas estão voltando a funcionar.”

 

 

O que pesou no bolso do brasileiro em 2021

 

Com inflação acima dos 10%, o setor de transportes foi o mais afetado. De acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos 12 meses terminados em novembro, a alta foi de 20,33%. O item que mais sofreu elevação foi combustíveis, com aumento de 50,43%.

“Combustível e energia são responsáveis por quase 50% da inflação em 2021. O problema é que, quando a inflação segue por esse caminho, a alta dos preços se espalha com mais facilidade entre os outros setores, como indústria e serviços. Com isso, os preços acabam precisando ser reajustados”, analisa André Braz, economista e coordenador de índices de preços da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Diante desse cenário, o Comitê de Política Monetária (Copom) vem aumentando desde março a taxa básica de juros, algo que não ocorria há seis anos. O objetivo é desestimular a tomada de crédito e controlar a inflação, deixando-a em patamares mais baixos.

Outro fator que contribuiu para a escalada da inflação foi a crise hídrica, que afetou a agricultura no Brasil, sobretudo a produção de cana-de-açúcar e café. “Com a crise hídrica, o preço do etanol acabou subindo e, por sua vez, ajudou a elevar ainda mais o preço da gasolina, porque o etanol faz parte da composição do combustível com 27%”, afirma André.

Para 2022, a previsão é de desaceleração da inflação. Conforme relatório do Banco Central (BC), a taxa deve encerrar em 4,7%, mas ainda acima da meta, que é de 3,50%.

No entanto, alcançar o objetivo pode não ser tarefa fácil, uma vez que a economia está fragilizada e o próximo ano terá eleição para presidente, o que acaba influenciando nos rumos da economia.

“Tudo vai depender das propostas dos candidatos (à Presidência), e dos nomes que irão formar o novo governo. Quando o mercado tomar ciência desses fatos, as coisas na economia podem piorar ou melhorar. Se forem apresentadas propostas que sejam tidas como factíveis, as coisas podem se acalmar. Por outro lado, se as propostas forem populistas, teremos um aprofundamento da crise”, projeta o economista.

Além das eleições previstas para outubro de 2022, o transporte público urbano também pode contribuir para um eventual descontrole da inflação.

“Durante a pandemia o transporte público foi muito afetado, e houve a falência de muitas empresas de ônibus, com a diminuição no número de passageiros e aumento do preço do combustível. Certamente deveremos ter aumento na tarifa, mas é algo que precisamos ver como as prefeituras vão fazer, até porque muitas também estão com as contas no vermelho”, finaliza.

 

 

Cearenses planejam entrar 2022 com as contas no "azul"

 

Allyson Paullyneli, analista de Finanças, bota tudo na ponta do lápis(Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Allyson Paullyneli, analista de Finanças, bota tudo na ponta do lápis

Para ficar com as contas no “azul”, o analista de investimentos Allyson Paullyneli utiliza a tecnologia. Ele trabalha com o aplicativo de gestão de finanças pessoais Mobills.

Dentre as funcionalidades do aplicativo existe uma para ajudar no controle dos gastos. “Se num mês eu planejo gastar R$ 500 com lazer e gasto R$ 600, o Mobills me alerta para eu diminuir os gastos naquele determinado setor”, explica Allyson.

Ele começou a controlar seus gastos ainda na adolescência, quando começou a receber uma mesada dos pais. “Não foi um trabalho fácil. Quando você é jovem, quer comprar muitas coisas. Mas tive que aprender a economizar e muitas vezes dizer ‘não’ quando os amigos me chamavam para sair e eu estava sem dinheiro”, lembra.

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Mas sua principal forma de controlar os gastos é anotar com o que gastou dinheiro. “Nas vezes que não anotei meus gastos fiquei sem saber para onde meu dinheiro tinha ido e quanto havia gastado,” afirma.

Allyson considera que 2021 foi um ano bom em termos financeiros. “Poupei bastante em 2021, e vou começar 2022 com minhas contas no azul, inclusive no pagamento de impostos, que deverei fazer à vista, garantindo assim um desconto e economizando mais dinheiro,” comemora.

Já servidor público Walfrido Furtado também está tentando organizar suas finanças para entrar 2022 no “azul.”

Ele se descontrolou financeiramente em 2012, quando precisou contrair um consignado. “A partir daí minha vida virou um inferno”, lamenta.

Walfrido Viana Furtado diz usar menos cartões de crédito e débito possíveis (Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Walfrido Viana Furtado diz usar menos cartões de crédito e débito possíveis

Além do financiamento, outro aspecto que contribuiu para o endividamento de Walfrido foi a crise econômica dos últimos anos e o crescimento da inflação. “Quando fiz o empréstimo a inflação estava controlada, sem muitas oscilações. Com isso, sabia o que fazer para manter os gastos sob controle”, explica.

Sem reajuste salarial há alguns anos, o servidor viu o valor de suas contas cotidianas como supermercado aumentarem, principalmente durante a pandemia causada pelo covid-19. As coisas ficaram ainda mais complicadas quando ele, a esposa e o filho foram infectados com o novo coronavírus.

Impossibilitados de prepararem a própria alimentação, os três acabaram pedindo comida via aplicativo, aumentando ainda mais os gastos familiares.

“Chegou um momento que precisei conversar sério com o pessoal aqui de casa: Ou cortamos gastos ou vamos ter problemas ainda mais graves”, afirma.

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Após a conversa com a mulher e o filho, a família de Walfrido decidiu usar menos o carro, ar-condicionado e diminuíram as idas a restaurantes.

Para 2022, o projeto é que o filho, que cursa Direito, possa conseguir um estágio e contribuir nas contas da casa, além de realizar alguns investimentos para garantir algum dinheiro no futuro.

Dicas para ter as contas equilibradas

Faça um levantamento de todos os seus gastos;

Economize um pouco a cada mês para pagar as contas anuais como IPTU, IPVA e material escolar dos filhos;

Busque descontos na hora de pagar uma conta ou efetuar uma compra

Sempre que possível antecipe obrigações como parte do material escolar dos filhos. Quanto mais próximo do início das aulas, mais caro ficará;

Reservar parte dos ganhos durante o ano;

Anote todos os seus gastos, desde as contas menores até as maiores;

Corte gastos e diminua o que puder. Se assina vários serviços de streaming, deixe apenas alguns;

Use a criatividade para fazer uma renda extra e aumentar seus ganhos;

Tome cuidado para não se endividar novamente e precisar reiniciar todo o clico novamente.

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