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Redução de juros para habitação gera reflexos sobre economia do País
Reportagem

Redução de juros para habitação gera reflexos sobre economia do País

| POLÍTICA HABITACIONAL | Movimento do banco é contrário às altas consecutivas da Selic e, segundo analistas, busca gerar mais competição entre os bancos e estimular setor da construção civil
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Medidas devem estimular a compra de novos imóveis e, consequentemente, o setor da construção civil (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Medidas devem estimular a compra de novos imóveis e, consequentemente, o setor da construção civil

Em um movimento contrário ao da taxa básica de juros (Selic), a Caixa Econômica informou da redução da taxa de juros do crédito imobiliário na modalidade indexada à poupança a partir da próxima segunda-feira, 28 de março. O movimento é interpretado por analistas como uma pressão do Governo Federal sobre os demais os bancos, especialmente os privados, neste tipo de financiamento e como estimulo à construção civil, responsável por movimentar muitos recursos e empregar grande contingente de pessoas.

As novas taxas partem de TR (taxa referencial) 2,80% ao ano, somadas à remuneração da poupança, o que representa uma queda de 0,15 ponto porcentual. O banco também lançou uma linha de crédito para reforma e adaptação de imóveis destinados a Pessoas com Deficiência (PcD) com início na mesma data. A nova linha contará com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para reforma ou adaptação de imóveis próprios, no âmbito do Casa Verde e Amarela (CVA), para famílias que tenham integrantes com deficiência.

O financiamento será de até R$ 50 mil, limitado a 80% do orçamento da obra; taxa de juros a partir de TR 4,25% a.a; prazo de 240 meses para pagamento; válido para pessoas com renda bruta mensal de até R$ 3 mil.

Mais uma novidade anunciada pela Caixa são as novas condições do Casa Verde e Amarela (CVA). A partir de 12 de abril, o financiamento às famílias com renda entre R$ 2.000,01 e R$ 2.400 do programa terão redução da taxa de juros de 0,5 ponto porcentual no crédito e aumento dos subsídios para aquisição e construção de moradias.

As medidas, para Ricardo Coimbra, economista do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), "está muito em linha com o direcionamento do Governo Federal para tentar estimular o crescimento da atividade econômica." Ele refere-se ao chamado "pacote de bondades" que teve a primeira "onda" de medidas anunciada na semana passada.

Reflexos esperados

Na prática, as medidas adotadas pela Caixa devem levar melhores condições de compra de imóveis na linha que usa a poupança e beneficiar camadas mais vulneráveis da população, com reflexos diretos sobre o setor da construção civil, segundo aponta o economista Davi Azim.

"É um esforço que se faz que parte do Governo para tentar estimular esse setor que realmente absorve muita mão de obra. Esse setor aquecido é sinal de empregabilidade. É uma coisa que há de se arriscar e é importante nesse momento de dificuldade da economia", avalia, alertando que o estímulo não deve levar às construtoras ao mesmo crescimento de anos anteriores.

Patriolino Dias e Sousa, presidente do Sindicato da Construção no Ceará (Sinduscon-CE), demonstra estar ciente disso. Ao O POVO, ele comenta que "toda mudança que melhore a tomada de crédito é vista com bons olhos." Mas ressalta que a alta de preços nos insumos tem dificultado a dinâmica do mercado, justamente, quando o valor do aço - classificado por ele como o vilão dos negócios no ano passado - estava "arrefecendo e se adequado à realidade."

O setor vem de um ano de crescimento, no qual a Caixa registrou recorde de recursos financiamentos à habitação em 2021, chegando a R$ 140 bilhões. Mas o aumento da inflação, acompanhado pela alta da Selic - como forma de conter o avanço da primeira -, diminuiu o ritmo do crédito imobiliário no País em 2022.

Inflação e juros desoneram poder de compra

"A alta da Selic atrapalha, com certeza, porque o apetite do comprador diminui, mas com a Caixa apresentando juros mais atrativos ajuda bastante", afirma o presidente do Sinduscon-CE, sinalizando o desinteresse do consumidor na compra da casa própria quando o salário sofre com alta dos preços de itens básicos e crédito comum elevado.

Os efeitos da Selic alta interferem diretamente na economia familiar, afinal, encarecem a tomada de empréstimo, o cheque especial e o rotativo do cartão de crédito, por exemplo. Aliada à inflação acelerada, como observamos agora, isso gera um impacto sobre a renda da população, desonerando o poder de compra.

"Essa é a questão: esse juro mais baixo pela Caixa realmente vai ser motivo de atração da população que, de uma forma geral, está tendo a sua renda corroída pela inflação? Existe mercado consumidor? Temos capacidade ociosa, com certeza, com relação à habitação no País, mas resta saber se, hoje, a renda agregada no País teria condições de gerar algum tipo de aumento nas vendas, porque realmente sofremos com a inflação muito elevada, os custos de uma forma geral, como alimentos e transporte, estão altos e isso fica muito delicado", avalia Davi Azim. (Com Agência Estado)

 

Medidas tomadas pela Caixa para o crédito imobiliário

POUPANÇA

Redução em 0,15 ponto percentual a taxa de juros do crédito imobiliário na modalidade poupança. Com a queda, as novas taxas partem da Taxa Referencial (TR)  2,80% ao ano, somadas à remuneração da poupança

Início: 28 de março de 2022

PCD

Nova linha de crédito para reforma e adaptação de imóveis próprios destinados a Pessoas com Deficiência (PcD), no âmbito do programa Casa Verde e Amarela. Com recursos do FGTS, o crédito será disponibilizado para quem tem renda bruta mensal de até R$ 3 mil e o limite de crédito será de até R$ 50 mil, limitado a 80% do orçamento da obra apresentado. O prazo para o pagamento do financiamento será de 240 meses.

Início: 28 de março de 2022

CASA VERDE E AMARELA

Novas condições para financiamento às famílias com renda entre R$ 2.000,01 e R$ 2.400 como: a redução da taxa de juros de 0,5 ponto percentual no financiamento habitacional; e o aumento dos subsídios para aquisição e construção de moradias, o que amplia o poder de compra das famílias.

Início: 12 de abril de 2022

 

Medida foi tímida e outras precisam ser tomadas

Acredito que não vai ser uma repercussão grande. A redução foi pequena e apenas no financiamento na modalidade poupança, que era justamente no qual a Caixa vinha perdendo competitividade em relação aos demais bancos. Depois que a Selic passou da faixa de 8,5%, a poupança passou a remunerar com taxa fixa de 6,17% ao ano. Então, a Caixa cobrava 6,17% mais 2,8% mais a TR, 0,48% ao ano, que tem variação pequena. Então, juntando isso, a Caixa estava com a taxa mais elevada que boa parte do mercado.

Na modalidade taxa fixa, não. Caixa cobra de 9,5% a 10% ao ano. Isso pode ser uma forma dela aproximar as duas taxas de financiamento imobiliário.

Agora, serve de sinalização. Primeiro, para os outros bancos, no sentido de que a Caixa está disposta a competir pelo mercado. Isso é relevante porque a Caixa tem condições de competir. Segundo, para o mercado imobiliário de que os bancos podem estar dispostos a flexibilizar suas taxas para manter o mercado aquecido.

A Caixa tem uma característica dos outros bancos públicos porque não tem ações vendidas na Bolsa de Valores. É 100% do governo, que pode ter uma interferência mais forte sem que isso gere qualquer controvérsia no mercado de ações. De fato, essas medidas podem ser uma política do Governo Federal, porque a economia está muito estagnada. O desemprego, apesar de ter caído, ainda está muito alto e a renda média do brasileiro vem caindo. É preocupante. E a construção civil é o setor mais empregador do País e pode ter algo do governo de aquecer via construção.

Mas acho que a medida foi tímida. Espero que outras medidas sejam feitas. Estamos realmente precisando aquecer esse mercado. A construção é a maior empregadora do País, que dá emprego de qualidade para pessoas com baixa qualificação, no caso dos operários.

Fran Bezerra

Economista

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