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Nova fase do dinheiro: Real Digital entra em teste e promete revolucionar as relações comerciais
Reportagem

Nova fase do dinheiro: Real Digital entra em teste e promete revolucionar as relações comerciais

| CONCEITO | Na esteira dos pagamentos digitais, o Real Digital promete reduzir os custos das empresas e permitir mais flexibilidade aos consumidores. Entenda as novidades
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Dinheiro, Real Moeda brasileira (Foto: José Cruz/Agência Brasil)
Foto: José Cruz/Agência Brasil Dinheiro, Real Moeda brasileira

Na esteira da evolução dos pagamentos, vem aí o Real Digital. O Banco Central (BC) iniciou os testes e as novas possibilidades devem ser implementadas em 2024. Logo de cara, vale destacar que essa não é uma criptomoeda, mas uma moeda digital emitida e regulada pelo BC.

Na prática, isso faz com que o Real Digital precise de uma carteira digital para ser utilizada exclusivamente em operações online. E, diferentemente de uma criptomoeda, o Real Digital possui os mesmos fundamentos (e também problemas) de uma moeda fiduciária tradicional.

Com a iniciativa, o Banco Central brasileiro sai na frente das outras autoridades monetárias internacionais com o início dos testes oficiais para implementação da ferramenta.

Os trabalhos do laboratório de execução de projetos de casos de uso da futura Moeda Digital do Banco Central (CBDC, na sigla em inglês) iniciaram na semana passada (5/9) no Lift Challenge - Real Digital. Esse processo é uma parceria do BC com a Federação Nacional de Associações dos Servidores do Banco Central (Fenasbac) e visa a identificar as características fundamentais de uma infraestrutura para a CBDC brasileira.

A ideia é que após 4 meses de laboratório iniciem os testes controlados, com valores, grupos e regiões limitadas. Vários pilotos devem ser implementados pelo BC em 2023.

Esse será o processo de "tokenização" dos ativos financeiros. A ideia é que os bancos proporcionem a representação digital de um ativo de modo a oferecer aos clientes a possibilidade de usar divisas digitais sem precisar trocar os recursos mantidos no banco por CBDC, que é um passivo direto da autoridade monetária. Traduzindo: Dinheiro digital é uma coisa, dinheiro físico é outra. Mas os dois são moeda corrente e com valor idêntico.

Márcio Kogut é especialista em Fintechs (Harvard) e Blockchain (MIT) e CEO da fintech de consórcios Mycon.
Márcio Kogut é especialista em Fintechs (Harvard) e Blockchain (MIT) e CEO da fintech de consórcios Mycon. (Foto: Divulgação)

Na avaliação do especialista em Fintechs (Harvard) e Blockchain (MIT) e CEO da fintech de consórcios Mycon, Márcio Kogut, a iniciativa do BC diminui os custos do dinheiro. Ele simplifica: A comparação mais simples é que agora vai haver a digitalização do dinheiro.

Se antes, esse processo ocorria envolvendo intermediários, como no caso do cartão de crédito ou débito, agora temos uma opção direta. "Na linha do tempo, primeiro veio o dinheiro físico, depois veio o cartão de crédito, que funciona por meio do banco, que custodia meu dinheiro, e pela administradora de cartão de crédito que cobra uma taxa pelo uso do dinheiro de forma digital. O Real Digital diminui os custos, tirando os intermediários."

Márcio ainda destaca o Real Digital como um fator de avanço do sistema brasileiro, que ainda inclui Pix e Open Banking. Ainda espera que novas soluções sejam lançadas, barateando os custos das empresas com emissões de boletos, por exemplo. “Os testes vão permitir que acabem os custos de empresa para empresa. Assim como o Pix fez com as transferências entre pessoas físicas.”

O poder das moedas digitais no dia a dia das pessoas já é relevante na medida em que as compras online já se tornam parte do cotidiano. Uma estimativa do Baynard, instituto internacional de pesquisas sobre UX (experiência do usuário - principalmente voltado ao comércio eletrônico), aponta que quase 70% dos carrinhos nas compras online são abandonados no checkout em plataformas que não possuem sistemas de pagamento contemplando carteiras digitais.

No caso dos e-commerces que têm, a taxa de conversão de vendas é três vezes maior. Isso porque - e vale para compras em loja física também - além do cliente não conseguir fazer o pagamento naquele momento, ele pode desistir de voltar a tentar por conta da experiência ruim que teve.

Transferência ocorreu por erro de digitação do número de celular
Transferência ocorreu por erro de digitação do número de celular (Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil)

Especialista em Transformação Digital dos meios de pagamentos, o professor de MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV), Roberto Kanter, ressalta que outros países, como França, China, Japão, Rússia, Estados Unidos e Inglaterra testam moedas digitais.

Outras experiências mais avançadas, como a Petro, da Venezuela, que, no entanto, é lastreada na reserva de petróleo.

Kanter ressalta a segurança da iniciativa brasileira como um diferencial, que deve permitir que transações envolvendo importações e exportações, por exemplo, possam ser feitas de maneira digital e mais barata que atualmente. "O fato do Real Digital usar a tecnologia blockchain faz com que ele tenha uma garantia quase impenetrável".

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ATRASO

Originalmente, o laboratório do real digital estava previsto para começar no fim de março e acabar no final de julho, mas o BC decidiu suspender o cronograma devido à greve dos servidores, que foi iniciada em abril e durou três meses.

DIVERSIDADE DE PROJETOS

Foram 43 propostas apresentadas ao LIFT, não apenas do Brasil, mas também de sete outros países (Alemanha, Estados Unidos, Israel, México, Portugal, Reino Unido e Suécia), nove foram escolhidas para acompanhamento.

POSSIBILIDADES APRESENTADAS

Os projetos de aplicações são os mais variados: aplicações de entrega contra pagamento (DvP), pagamento contra pagamento (PvP) internet das coisas (IoT), finanças descentralizadas (DeFi) e soluções de pagamentos quando tanto o pagador quanto o recebedor se encontram sem acesso à internet (dual offline).

PERGUNTAS E RESPOSTAS

O que diferencia o Real Digital de criptomoedas?

O diferencial das criptomoedas é que todas são descentralizadas, sem controle de nenhuma entidade monetária, possibilitando o uso para diversos fins - inclusive ilícitos.

O que garante a segurança do Real Digital?

A segurança digital da moeda ocorre por meio de uma rede de blockchain pública que vai impedir que as transações sejam descentralizadas, garantindo o controle da autoridade monetária sobre a circulação e uso do Real Digital.

O Real Digital poderá ser convertido em cédulas?

O uso do Real Digital será transparente, podendo ser convertido para qualquer outra forma de pagamento hoje disponível - como depósito bancário convencional ou em real físico - e também poderá ser utilizado para pagamentos do dia a dia.

Qual a diferença entre o Real Digital e os reais que estão depositados nas contas-correntes dos bancos de varejo, e que não têm existência física?

Há algumas diferenças importantes entre essas duas moedas. A primeira é que os Reais que hoje estão depositados em contas correntes nos bancos de varejo são de responsabilidade do banco que captou o depósito, enquanto os reais digitais serão uma responsabilidade direta do BC. A principal diferença, porém, é que o BC deseja implementar inovações de pagamentos pensando no futuro, como a incorporação de smart contracts e outras tecnologias, o Real digital pode ser uma ferramenta nativa de liquidação das transações, permitindo maior flexibilidade, melhor adequação dos produtos às necessidades dos consumidores e custos de intermediação muito mais baixos.

O Real Digital poderá ser "minerado"?

Qualquer pessoa ou empresa que desejar ter Reais em formato digital entregará Reais em formato convencional e o BC emitirá os Reais digitais correspondentes. Essa operação não será feita diretamente com o BC, ela será intermediada por um participante do sistema financeiro - banco, cooperativa ou fintech - ou do sistema de pagamentos - instituição de pagamento - ou ainda de algum novo tipo de empresa que venha a ser criada sob a autorização do BC para intermediar o acesso e a utilização de reais no formato digital.

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