Primeiro estado brasileiro a enxergar o potencial do hidrogênio na transição energética global, o Ceará possui hoje a maior quantidade de projetos de geração do combustível em desenvolvimento no País.
Estudo da GIZ (sigla em alemão para sociedade alemã para a cooperação internacional), adaptado com os dados já divulgados pelo Governo do Estado, indica a existência de 30 projetos pensados para o Complexo do Pecém, de um total de 57 em desenvolvimento no território brasileiro.
A quantidade alcançada em pouco mais de dois anos desde o lançamento da ideia do hub de hidrogênio verde (H2V) reúne gigantes internacionais do setor que podem aplicar um investimento total estimado em US$ 30 bilhões.
Além disso, a atuação alçou o território cearense à posição de um dos ambientes mais adequados à geração de H2V do planeta.
O número demonstra acertos na estratégia montada a partir da articulação entre Estado, iniciativa privada e academia, com destaque para o modelo de funcionamento do Porto do Pecém, como destaca Constantino Frate, coordenador do Núcleo de Energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).
Ele, que acompanhou a formação do cenário atual como secretário executivo de Energia da gestão estadual passada, ressalta como crucial para o sucesso local o comprometimento do Porto de Roterdã, proprietário de 30% do Pecém, em importar um quarto do hidrogênio que deve receber e lançar na Europa do terminal cearense.
"Dos 4 milhões de toneladas anuais que são o compromisso de Roterdã de fornecer para Europa até o fim desta década, Roterdã se comprometeu de importar um quarto dessa demanda do Pecém. Ou seja, 1 milhão de toneladas por ano será do Pecém. Isso é algo que realmente coloca o projeto do Pecém em um patamar extremamente diferenciado em relação aos outros porque o investidor parte para desenvolver um projeto já com expectativa de compra daquilo que vai produzir. Isso é muito importante", reforça.
Hoje, três projetos são considerados de maior possibilidade de confirmar os investimentos no Complexo do Pecém. São eles Fortescue, Casa dos Ventos e AES Brasil. Somados, os três devem resultar em US$ 8 bilhões em investimento, segundo projeção do próprio Porto do Pecém.
As três empresas já têm área reservada na Zona de Processamento de Exportação (ZPE) do Ceará e a expectativa é de que confirmem os projetos até o fim deste ano para iniciar a produção de H2V a partir de 2026.
Com a entrada de mais estados brasileiros - alguns com projetos já em construção, como o da Unigel na Bahia -, o Ceará precisa da definição desses investimentos para assegurar o protagonismo na produção de hidrogênio no Brasil.
Para Paulo Emílio de Miranda, diretor-presidente da Associação Brasileira do Hidrogênio (ABH2), a oportunidade de confirmar todos - ou ao menos a maioria dos projetos - existe porque está em curso a abertura de um novo mercado.
"O mundo hoje produz, armazena, transporta e consome 120 milhões de toneladas por ano de hidrogênio. A perspectiva é de que esse mercado se multiplicará por 5 ou 6 até 2050 em âmbito mundial", projeta.
Miranda, diante da estimativa de ampliação do mercado, diz ainda que a competição internacional não é relevante para o Brasil, "porque há países para os quais a nova economia do hidrogênio é muito fortemente baseada e dependente de exportação de hidrogênio, e esse não é o caso do Brasil".
Ele reconhece a demanda inicial pela exportação, mas aponta o mercado nacional como um polo de consumo de H2 de potencial bastante relevante. Para tal, a formação de uma cadeia produtiva é considerada viável, com destaque para o setor de mobilidade.
No Estado, Constantino Frate cita "a ambição da ArcelorMittal em produzir aço verde" e a participação das grandes indústrias já instaladas no Pecém como indutoras de um mercado consumidor brasileiro, com grande possibilidade de envolver montadoras. Mas este será um próximo passo no caminho do Ceará neste segmento.
Potencial
Um quilograma de hidrogênio contém cerca de 2,75 vezes mais energia do que a mesma massa de gasolina
Projetos de hidrogênio verde no Brasil
Amazonas
Senai e Eletronorte
Bahia
Unigel Camaçari
Unigel ThyssenKrupp
Bahia Green Hydrogen Programme Acker/ Statkraft/ Sowitec
Bahia/Piauí/Pernambuco
Casa dos Ventos/Comerc
Ceará
Enegix Energy
White Martins
Qair
Fortescue
Eneva
Diferencial
Hytron
H2helium
Neoenergia
Engie
Transhydrogen Alliance
Linde
Total Eren
AES Brasil
Cactus Energia Verde
Casa dos Ventos
H2 Green Power
Nexway
Enel Green Power
HDF
Mitsui
ABB
Gold Wind
Alupar
Mingyang Smart Energy
Spic
Gansu Science & Technology Investment
Platform Zero (Complexo do Pecém + 13 instituições de cinco países)
Green Hydrogen Corridor (Complexo do Pecém, AES Brasil, Casa dos Ventos, Comerc Eficiência, Havenbedrijf Rotterdam, Fortescue e EDP)
Voltalia
Espírito Santo
Energy Hub Porto Central
Minas Gerais
Minas Hydrogen Programme Unifei
GIZ Project
Pernambuco
Qair
Neoenergia
Rio de Janeiro/Espírito Santo
Fortescue Industries Pty e Porto de Açu
Linde/White Martins
Rio de Janeiro
Companhia Siderúrgica Nacional
Rio Grande do Norte
Neoenergia/Iberdrola
Enterprise Energy
Rio Grande do Sul
Linde/White Martins
São Paulo
Repsol Sinopec Brasil
Gas Innovation Research Center
Chemical Engineering Departament USP
Cetiq Senai Hytron/NEA
Fraunhofer SAE Brasil&Ballard Student H2 Challenge Competititon
Biogas Raízen/Yara
Raízen e Yara
Fonte: GIZ/Fiec/Governo do Estado do Ceará
O que é hidrogênio verde (H2V)?
O hidrogênio verde é um gás/combustível produzido por meio da eletrólise a partir da energia elétrica proveniente de fontes renováveis e, portanto, livre de emissões, sendo essencial para a descarbonização.
Quais as oportunidades econômicas do H2V?
A indústria é o principal consumidor de hidrogênio do mundo. Hoje, o setor utiliza majoritariamente o produzido a partir de combustíveis fósseis, emitindo milhões de toneladas de CO2 por ano na atmosfera.
A guerra na Ucrânia abriu outra fronteira para o uso do H2V, uma vez que a Europa busca diminuir a dependência do gás natural importado da Rússia. Nesse contexto, apenas a Alemanha, projeta a necessidade de 110 terawatts/hora de H2V até 2030.
O mundo hoje produz, armazena, transporta e consome 120 milhões de toneladas por ano e a perspectiva é de que esse mercado se multiplicará por 5 ou 6 daqui até 2050
Além disso, derivados do H2V, como a amônia, são cobiçados pelo setor agro para produção de fertilizantes.
Qual o potencial brasileiro?
A participação das energias renováveis no Brasil vem aumentando nos últimos anos: passou de 46,1% da Oferta Interna de Energia (OIE) em 2019 a 48,4% em 2020.
Ao mesmo tempo, os custos de produção de energia renovável vêm caindo. Os baixos custos de produção, aliados às condições geológicas e climáticas do Brasil, fazem do Brasil um país promissor para a produção de hidrogênio verde.
O Brasil também possui a infraestrutura necessária para se tornar um grande exportador de hidrogênio verde.
O Ceará e o H2V
De olho nas oportunidades de exportação e consumo interno de H2V, o Estado do Ceará pôs em prática o projeto de um hub de hidrogênio verde no Complexo do Pecém que conta com 30 projetos com memorandos de entendimento assinados entre governo estadual e iniciativa privada.
A matriz energética de maior participação de eólica e solar fazem do Ceará um dos estados mais competitivos, inclusive, com estudos que apontam estar entre os de menor valor de produção do combustível no mundo.
Uma sociedade com o Porto de Roterdã, que detém 30% do Pecém, ainda demonstra outra vantagem, uma vez que Roterdã se prepara para ser a porta de entrada do H2V na Europa, com construção de gasodutos e plantas de conversão de H2V.
A expectativa do governo cearense é que esse cenário dote do Estado de uma capacidade de fornecimento de um milhão de toneladas de H2V para a Europa até 2030
Fonte: GIZ/Projeto H2/Governo do Ceará