Logo O POVO+
Outorga Onerosa redesenha mapa urbano de Fortaleza e injeta milhões nos cofres públicos
Reportagem

Outorga Onerosa redesenha mapa urbano de Fortaleza e injeta milhões nos cofres públicos

|Superprédios|Mecanismo flexibiliza, entre outros pontos, a autorização de construção de imóveis com altura maior do que a permitida pelo Plano Diretor. Arrecadação prevista em quatro anos de projeto é maior do que o que era esparado para um ano de Taxa do Lixo em Fortaleza
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Construção civil no Ceará liderou em lançamentos no Nordeste (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Construção civil no Ceará liderou em lançamentos no Nordeste

Outorga Onerosa de Alteração de Uso do Solo (OOAU). O mecanismo jurídico-administrativo que tem permitido a construção de superprédios cada vez mais altos em Fortaleza, e que torna menos rígidos vários parâmetros urbanísticos da cidade para novas edificações, também está projetando valores vultosos a serem arrecadados pela gestão municipal.

Em pouco mais de quatro anos, de 2019 até abril deste ano (52 meses), a Prefeitura de Fortaleza ganhou a perspectiva de receber pelo menos R$ 268,7 milhões. É o dinheiro do que os empreendimentos ou reformas imobiliárias pagaram ou pagarão para flexibilizar regras do ordenamento urbano da Capital.

A Outorga Onerosa é o que o segmento chama de "solo criado" pelo ganho de metragens dentro de um mesmo terreno. A contrapartida é assumida pelos construtores para afrouxar uma regra urbana em troca de uma permissão concedida. Pode ser paga em dinheiro, em doação de imóveis ou com execução de obras de infraestrutura urbana. A legislação está vigente desde 1º de abril de 2015.

Só dos projetos aprovados no período da atual gestão, Fortaleza terá pelo menos 16 novos superprédios acima dos 100 metros de altura. Dois deles com mais de 170 metros: um que deve ser entregue no início do próximo semestre, o outro ainda sem data anunciada para o início das obras.

Ao acionar a OOAU, o construtor também pode solicitar alterações como extensões de recuos, taxa de ocupação de solo e de subsolo, fração maior do lote ou taxa de permeabilidade. Não é o só item "Altura da Edificação" que é requerido pelos construtores para além da regra posta, mas é o ponto mais chamativo e o que mais exibe o poder da Outorga Onerosa.

A quantia estabelecida chega a ser 74,5% maior, por exemplo, do que a arrecadação que estava prevista para a Taxa do Lixo de Fortaleza em 2023. A administração municipal esperava recolher R$ 154 milhões dos contribuintes com a Taxa de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (TMRSU), criada por lei municipal em dezembro de 2022. Os boletos haviam sido distribuídos pelo Município no dia 5 de abril.

O cofre local, porém, deixou de receber boas moedas quando o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) determinou, em 22 de maio deste ano, em caráter liminar, a suspensão da cobrança. O Órgão Especial do Tribunal atualmente vota pela validade da decio que barrou a cobrança.

Em outra comparação, a Outorga Onerosa de quatro anos representa 36%, mais de um terço, da arrecadação do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de 2022, que alcançou R$ 738 milhões e é a mesma prevista para 2023.

No caso, a cifra milionária da Outorga Onerosa definida entre os anos 2019 e 2023 não significa que a Prefeitura já tem o recurso creditado. Isso porque nem todos os processos avaliados foram quitados. A maioria está sendo paga em parcelamento, aguarda assinatura de termo de compromisso ou está com execução adiada — por falta de alvarás de construção, aguardando outras documentações ou "adormecem" por planejamento financeiro dos construtores.

Dos R$ 268,7 milhões pré-definidos ao longo de 52 meses, R$ 202 milhões foram indicados para Outorga somente na atual gestão (entre 2021 e abril passado), pela confirmação do mecanismo para 25 projetos. O maior valor anual aprovado de OOAU nesse período foi em 2022, quando passou dos R$ 134,6 milhões. Foi um aumento de 236% em relação a 2021 (R$ 40 milhões).

Um dos edifícios que já tinha análise de outorga aprovada, chegou a ter um novo processo avaliado, em abril deste ano, por "agravo de parâmetros" e precisou complementar o valor outorgado. Esse projeto teve outorga definida em R$ 54.864.054,84. Porém, em 2016, os construtores já haviam acionado a Outorga e, à época, quitaram o valor de R$ 25.993.200,80, mas a obra não chegou a ser executada.

Segundo a secretária de Urbanismo e Meio Ambiente de Fortaleza (Seuma), Luciana Lobo, esse valor já havia entrado no caixa da administração municipal. "Então foi definido que seria feito o abatimento e o projeto pagará somente a diferença da outorga". O valor de R$ 25,9 milhões foi atualizado (pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC) para R$ 36.694.160,26 e o restante a ser pago ficou acertado em R$ 18.169.894,58. O construtor já iniciou o pagamento parcelado do novo valor.

Há mais 19 propostas que pedem o acionamento da Outorga Onerosa, já protocoladas junto à Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma), segundo informações do órgão - ainda sem data para serem analisadas. Cada novo caso é submetido à Comissão Permanente de Avaliação do Plano Diretor (CPPD), que, em reuniões mensais, avalia os projetos e considera o que pode ser chancelado para flexibilização das regras. Será mais possibilidade de mais dinheiro em caixa e expectativa desses valores migrarem para benefícios sociais e melhorias urbanas.

O que você achou desse conteúdo?