Há aproximadamente quatro anos, o Ceará e praticamente todo o País pararam por conta da chegada da pandemia do vírus sars-cov-2, que infectou e matou milhões de pessoas ao redor do mundo em um espaço de pouco menos de dois anos. Só no Brasil, a Covid-19, doença causada pelo microorganismo, matou mais de 710 mil pessoas.
Em um primeiro contexto de muita incerteza, milhões de profissionais tiveram de migrar para o trabalho remoto (ou home office), muitas vezes, sem estrutura adequada para realizar suas atividades. Por outro lado, as empresas também tiveram de migrar seus processos para o ambiente virtual, afinal tratava-se de um vírus extremamente infeccioso e com alta letalidade.
No entanto, em um espaço de tempo relativamente curto, a adaptação de profissionais e corporações àquela nova realidade aconteceu, com relatos de ganhos de produtividade de ambos os lados e aumento na qualidade de vida. O prolongamento da pandemia e, posteriormente, seu enfraquecimento, contudo, também começaram a trazer questionamentos a esse modelo de trabalho e, gradativamente, o formato híbrido, com dias de trabalho remoto e outros presenciais passou a ganhar mais força.
No ano passado, com a pandemia praticamente controlada, a adoção do modelo 100% remoto pelas empresas brasileiras caiu para apenas 4,2%, de acordo com o estudo “Cenário do RH no Brasil”, conduzido pela Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH). No auge da crise sanitária, o número chegou a superar os 10%, conforme outro levantamento, conduzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Quanto aos modelos 100% presencial e híbrido, os percentuais são bem próximos entre si, conforme o estudo mais recente da ABRH, com 49,6% das empresas adotando o formato presencial e 46,2% adotando o híbrido. Mesmo, entre quem adota esse último formato, a maioria exige de três a quatro dias de presença de seus colaboradores nas instalações corporativas (58,7%).
Para o presidente da ABRH, Paulo Sardinha, “o estudo mostra um retorno aos aspectos conservadores praticados anteriormente. A pandemia exigiu uma série de ações e se supunha que muitas delas iriam se perpetuar. Entretanto, já começamos a ver desarticulados uma série de pensamentos que achávamos que teriam se estabelecido.”
Se a presença dos profissionais no ambiente de trabalho da empresa tem sido retomada cada vez mais aos patamares pré-pandemia, em paralelo, as experiências de busca por uma conciliação entre produtividade e qualidade de vida seguem sendo experimentadas pelo Brasil e pelo mundo.
Ondas de pedidos de demissões registradas, principalmente entre meados de 2022 e 2023, bem como o fenômeno chamado ‘quiet quitting’ (algo como demissão silenciosa) acabaram dando força a movimentos como o da redução da jornada de trabalho semanal de quatro dias.
A experiência da semana de quatro dias ganhou apoio de governos e empresas ao redor do mundo, por meio da iniciativa internacional 4 Day Week, que chegou ao Brasil no segundo semestre do ano passado e hoje envolve seis cidades, 22 empresas e 280 trabalhadores.
De modo oficial, o formato ainda tem adesão relativamente baixa no Brasil, mas já é superior ao do home office, conforme aponta a pesquisa da ABRH. Cerca de 7,2% das empresas no País já aderem ao formato, ante 92,8% que trabalham com a semana de cinco dias.
Contudo, vale lembrar que o próprio modelo de negócio pode favorecer ou não a adoção desse tipo de escala em que o trabalhador tem uma folga maior, de três dias, e a tendência de que as empresas convencionais o adotem segue muito baixo.
Conforme a ABRH, apenas 3% das empresas que adotam o formato de trabalho de cinco dias estudam a redução da jornada semanal para quatro dias. Ainda assim, já existem, inclusive, propostas legislativas nesse sentido.
O senador Weverton Rocha (PDT-MA), por exemplo, apresentou o Projeto de Lei 1.105/23, que visa alterar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e possibilitar a redução de jornada, sem diminuição da remuneração.
O PL foi aprovado em dezembro na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e é a proposta de redução de jornada de trabalho com tramitação mais avançada no Legislativo, atualmente.
Nesse sentido, a CEO da Umanni e diretora de Pesquisa da ABRH, Eliane Aere, destaca que “a busca por soluções inovadoras e aprimoramentos contínuos são cruciais para o sucesso das pessoas e das companhias”.
Formato híbrido permitiu conciliar hobby e trabalho
O assessor de imprensa Lucas Ribeiro Albuquerque, de 28 anos, foi um dos milhares de profissionais no Ceará que se viram na necessidade de trabalhar remotamente de uma hora para a outra, por conta da crise sanitária global causada pela Covid-19. Formado em Jornalismo desde 2017, ele atuava, quando da chegada da pandemia, com distribuição de conteúdo digital em um veículo de comunicação em Fortaleza, onde ficou até maio de 2022.
Depois de tirar um ano sabático, o retorno de Lucas ao mercado de trabalho em 2023 levou em conta o grande hobby por viagens na escolha por uma empresa e por uma função que permitisse conciliar a atividade profissional com a flexibilidade para viajar. "Lá na agência, a maioria dos assessores trabalham três dias no home office e dois na agência, porque atendem mais de um cliente. No meu caso, como atendo uma siderúrgica no Pecém, trabalho três dias lá, um na agência e um home office", explica.
"A escolha desses dias acontece de acordo com a demanda. Geralmente, eu vou para o cliente de terças às quintas e aí eu escolho o dia do home office e o dia que eu vou para agência entre as segundas e às sextas. Quando eu quero fazer uma viagem, por exemplo, como foi no Carnatal, tirei home office uma semana na sexta e na outra semana na segunda e aí consegui quatro dias. Ou seja, no híbrido dá para ter uma mobilidade maior", acrescenta Lucas.
Ele aponta outras vantagens em ter, pelo menos, um dia para trabalhar em casa, como a redução de custo com alimentação e transporte e a possibilidade de tirar um cochilo, após o almoço, mas avalia que a maioria dos empregadores está reduzindo a adesão aos modelos remoto e híbrido. "Há exceções. Tem uma colega minha que trabalha num grande grupo, onde o salário não era dos maiores, mas tinha esse tipo de vantagem e por isso ela optou por ficar lá. É até uma forma de reter talentos", avalia.