Não é só com novos empreendimentos verticais que o mercado imobiliário cearense tem demonstrado a força do momento atual. Os horizontais, especificamente os loteamentos, foram alvo de muito interesse e tiveram o estoque à venda reduzido pela metade entre 2023 e 2024, além de movimentarem milhões de reais no Estado.
A oferta final para os consumidores saiu de 8.206 lotes, em agosto do ano passado, para 4.114 lotes em agosto deste ano. “Essa redução de estoque representa a diferença do que entrou à venda e tudo que foi vendido. É uma redução fortíssima e representa uma forte velocidade de vendas”, diz Fábio Tadeu Araújo, CEO da Brain Inteligência Estratégica.
Responsável pela pesquisa de mercado calculada mensalmente pelo Sindicato da Construção do Ceará (Sinduscon-CE), a empresa observou uma crescente no segmento de loteamentos e resolveu mensurar o impacto disso no setor, já observado por outros agentes.
“Os loteamentos no Estado do Ceará estão bombando, como dizem no nosso mercado. Está superaquecido”, atesta André Aguiar, segundo diretor tesoureiro do Conselho Regional de Corretores de Imóveis no Ceará (Creci-CE).
A explicação, completa ele, se dá pelo comportamento do consumidor após a pandemia de Covid-19, quando “procurou muito a residência de casa, de morar no chão, de ter um jardim, uma piscina, caminhar com o cachorro ou os filhos à noitinha ou final de tarde.”
Os dados da Brain, repassados com exclusividade ao O POVO, apontam que Fortaleza tem uma parcela mínima dos loteamentos. O motivo, explica o Creci, é pela inviabilidade do negócio dadas as condições para efetivar o empreendimento.
Na prática, cabe ao incorporador que está comercializando os lotes preparar o terreno, destinar cerca de 30% a 40% da área para urbanização (vias e calçadas, prioritariamente) e acionar as prestadoras de serviços públicos de energia e água e esgoto. Como os terrenos na Capital são mais caros, muitas vezes fica pouco lucrativo para o investidor.
Com isso, aponta Aguiar, o município do “Eusébio está comandando toda essa expansão dos grandes loteamentos.” Mas outras cidades se mostraram atrativas para o tipo de negócio, segundo a Brain.
A empresa indica que, além de Fortaleza, Aquiraz, Eusébio, Maracanaú, Pacatuba, Itaitinga, Maranguape e Caucaia têm o mercado de lotes aquecido e movimentando o setor imobiliário do Estado.
No total, são 57 empreendimentos com vendas em curso até agosto na Capital e Região Metropolitana. Número menor que o observado em igual mês de 2023, o que comprova o aquecimento das vendas no período.
Mais do que transformar a paisagem das cidades da RMF, os loteamentos também são responsáveis por movimentar milhões na economia local. Em agosto deste ano, o levantamento da Brain aponta um preço médio de R$ 253.427 para unidades em bairros fechados e R$ 71.549 para os loteamentos abertos.
No fim das contas, o valor geral de vendas (VGV) foi calculado em R$ 499,797 milhões nos empreendimentos fechados e R$ 139,033 milhões nos abertos. O comparativo com o oitavo mês de 2023 também sinaliza o aquecimento do setor, de acordo com o CEO da empresa.
Isso porque o VGV dos bairros abertos caíram 69,7% no período, enquanto que os fechados mantiveram estabilidade de -0,36%. Aguiar diz que a queda vertiginosa observada nos loteamentos abertos se deve aos lançamentos mais distantes dos centros urbanos e que, por isso, dispõem de preço menor de venda.
Já o segundo diretor tesoureiro do Creci-CE aponta para mudanças significativas promovidas pelos empreendimentos - especialmente os fechados - e que acabam aquecendo também a economia local desses municípios onde estão instalados.
Ao mesmo tempo que são construídas as casas, os incorporadores tratam de captar comércios e serviços, o que traz investimentos para a Cidade e também gera emprego. Aguiar fala de “lojas que tem em bairros nobres de Fortaleza e já abriram lá, sem falar nos colégios.”
De perfil sofisticado, classificado por ele como “condomínios boutiques”, os loteamentos fechados também modificam a legislação do município, uma vez que muitos não permitiam tal modelo imobiliário.
“E a gente sabe que tem em torno de 4 ou 5 loteamentos para poder sair até o meio do próximo ano de lotes com 200 m², mas com infraestrutura cada uma mais encantadora que a outra. São supercondomínios com área de lazer completa, segurança e com lagoa, rio... Coisa espetacular, de altíssimo padrão”, adianta, apontando uma nova etapa de aquecimento do setor.
Vida segura com infraestrutura e serviços perto de casa são atrativos
A sofisticação e a proposta de viver em um bairro planejado que dispõe de infraestrutura moderna e segura tem sido o principal atrativo dos empreendimentos lançados na Região Metropolitana de Fortaleza, os quais buscam atrair clientes de maior poder aquisitivo acostumados com as facilidades dos bairros nobres da Capital. O tempo de deslocamento, com média de 1h a 2h entre idas e vindas de casa para o trabalho, por exemplo, tem peso menor na escolha de morar longe do que uma caminhada na calçada com os filhos ou os animais de estimação. "Isso trouxe muita qualidade de vida para as pessoas", ressalta André Aguiar, segundo diretor tesoureiro do Creci-CE.
Essa é a proposta da Terra Brasilis há 24 anos, diz Martônio Rodrigues, diretor de Marketing e Novos Negócios da empresa. Ao observar, durante a atuação no mercado, que 70% das pessoas preferem morar em casas, a incorporadora partiu para pesquisa de campo e identificou os vetores de crescimento de Fortaleza, onde desenvolveu seus 22 projetos estrategicamente e vendeu 7 mil lotes.
Somente no Eusébio, foram R$ 130 milhões de investimento no novo empreendimento, o Thai Terra Brasilis. No modelo de loteamento fechado, o lançamento tem como destaque 40 mil metros de área verde preservada aliada a um projeto arquitetônico que incorpora áreas de lazer, incluindo piscinas, salões de festa, pet place e um píer.
A fórmula é de área planejada e inteligente, com 612 lotes a partir de 200 metros quadrados e preços iniciais de R$ 179 mil. Inclusive, o Thai é o 8º lançamento a integrar o chamado Villa Terra Brasilis - o bairro planejado com loteamentos e equipamentos comerciais da empresa. Toda a estrutura rivaliza com os bairros nobres da Capital, segundo Rodrigues.
"O metro quadrado (m²), a depender do bairro ou localização em Fortaleza, gira em torno de R$ 12 mil. Veja só, um apartamento de 60 metros quadrados custa R$ 720 mil. Aqui, você compra um lote de 200 m² por R$ 179 mil e constrói uma casa de 180 m². O custo de uma casa de elevado padrão, nossa, é de R$ 3 mil/m². Então, nós estamos falando de R$ 540 mil. Somado ao preço do lote dá R$ 720 mil. Ou seja, você paga o mesmo preço para morar no condomínio horizontal do que pagaria no apartamento", compara.
Hoje, a incorporadora dispõe de empreendimentos em Eusébio e Maracanaú, mas Rodrigues projeta para "2025 em diante" lançamentos em Aquiraz, Caucaia, Maranguape e Pacatuba, entre modelos fechados e abertos a depender da legislação do município.
O sucesso do negócio também deve levar a empresa de origem cearense a replicar os modelos em outros estados do País, adianta o diretor de Marketing e Novos Negócios. "A Terra Brasilis tem planos muito fortes de buscar outros mercados, como o Sul do Estado, na Região do Cariri, e estamos buscando parcerias em Pernambuco e na Bahia", arrematou.
O potencial do mercado cearense para este tipo de empreendimento também atraiu investidores internacionais, como a Planet Smart City. De origem ítalo-britânica, a empresa mirou os loteamentos abertos com propostas de bairros inteligentes e sociais como principal negócio no Ceará. As primeiras unidades, recorda a CEO no Brasil Susanna Marchionni, tiveram a região do Complexo Industrial e Portuário do Pecém (Cipp) como alvo. Mas logo a empresa chegou ao município de Aquiraz, onde tem desenvolvido os principais negócios.
Ter um bairro planejado, com áreas compartilhadas e de livre trânsito, ou seja condomínios abertos, foi a proposta da empresa que fez sucesso no Ceará e levou a Planet a investir no Rio Grande do Norte e também em São Paulo. Nos municípios cearenses, ela destaca a adoção pelos clientes do modelo proposto e comemora o sucesso que apresenta 5 mil lotes para comercializar, atualmente, e um valor geral de vendas somado de R$ 1,39 bilhão apenas no Ceará.
Loteamentos atraem interessados no primeiro imóvel e investidores
A vida em uma casa de rua em Fortaleza insatisfez Hannaly Pinheiro, após o casamento. Sempre morando em um condomínio de apartamentos, ela buscou aliar a sensação de segurança e infraestrutura com a qual contou desde a infância à comodidade e privacidade de uma moradia horizontal e resolveu comprar um lote no Eusébio. "Eu tive sorte, porque nós não pesquisamos. Vimos um cartaz quando íamos para a casa de praia da minha mãe em Água Belas, fomos visitar e resolvemos comprar", conta, recordando as lembranças de 2017.
O financiamento de dois anos com balões foi quitado quando o terreno foi entregue, em 2019. Já no mesmo ano, ela e o esposo, Gustavo Delfino Vieira, assinaram o contrato de construção da casa. "Para a casa, nós demos uma entrada com o valor que vendemos a casa de rua onde morávamos. A entrada foi de R$ 90 mil e o restante financiou em 36 vezes. Antes de receber a chave nós quitamos com dinheiro que a minha mãe forneceu", completa, acrescentando que as parcelas são pagas à mãe atualmente.
A distância de Fortaleza não foi problema nem para ela nem para o marido. A coordenadora pedagógica trabalha numa escola em Itaitinga e ganhou tempo no deslocamento para o serviço quando optou por um condomínio fechado de casas na Região Metropolitana. Já o marido é policial militar e trabalha por escala, então, a previsibilidade dos dias que precisa estar em Fortaleza tornam a distância indiferente, segundo contam.
Da mesma forma pensou Marcelo Ricardo da Silva. Vindo de Brasília, ele viu nos loteamentos, inicialmente, uma oportunidade de investimento e comprou um lote comercial em um bairro planejado em São Gonçalo do Amarante. "Eu moro no Ceará há 18 anos e, quando surgiu essa oportunidade, eu fiquei muito empolgado com a perspectiva de valorização da região", recorda.
Mas pouco tempo depois, resolveu focar em Aquiraz, para investir e morar. Então, comprou mais lotes e construiu a casa onde vive hoje com a esposa, Candice Melo Meireles. "Meu sonho, como brasiliense, era morar na Avenida Beira-Mar, mas minhas limitações não permitiam pelo custo mesmo. Fiz o comparativo, e como a minha realidade era empreender também, resolvi vir para um lugar que me dá conforto e tranquilidade. Mas, claro, a grande motivação foi valores", afirmou.
Nas contas dele, apenas no custo moradia, ficou três vezes mais em conta morar no condomínio fechado do que no apartamento que alugava na Avenida Abolição. Além disso, a rotina fez com que os gastos ficassem menores. Corretores de imóveis, ele e a esposa trabalham com imóveis localizados naquela área da RMF e conseguem planejar a rotina a partir das visitas programadas com os clientes.
Profissional da área, ele ressalta a importância de escolher um local - seja para investir ou morar - que apresente condições viáveis de atingir os objetivos. Ou seja, lucro com aluguel ou bem-estar e qualidade de vida. Ao mesmo tempo é importante estar de olho na equação financeira para que o sonho não acabe se tornando um pesadelo pelas muitas prestações que são precisas nos financiamentos de imóveis.