A carestia dos preços dos produtos acelerou na metade fim deste ano e o Brasil deve estourar a meta de inflação. A previsão do mercado, conforme o Banco Central, é que o índice fique em 4,6% ao fechamento de 2024.
O índice acumulado neste ano é de 4,24%, sendo que os principais "vilões" para esse arrocho nos preços foram as altas das despesas com alimentos e bebidas, saúde e cuidados pessoais e com educação.
Em Fortaleza, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta uma variação acumulada idêntica ao índice nacional.
Vale destacar que os grupos de produtos com as maiores altas de preços são os mais representativos na composição do peso do aumento de preços sobre os orçamentos em Fortaleza, junto de despesas com transporte e habitação.
Os custos com alimentação e bebidas, por exemplo, representam praticamente 25% do gasto médio calculado pela inflação da Capital. Conforme os dados do IBGE, a maioria dos itens que tiveram alta superior a 10% no recorte deste ano são medicamentos e alimentos.
Para o consumidor cearense, os destaques negativos de produtos que mais encareceram no ano foram a laranja pera, com carestia de 48,17% entre janeiro e novembro.
Depois vem o café (+39,97%) e o alho (+29,57%). Vale destacar ainda aumentos de custos de produtos e serviços de outros grupos, como serviços de manicure (+17%), de conserto de automóveis (+13,68%), medicamentos psicotrópicos e anorexígenos (+12,9%) e anti-infecciosos e antibióticos (+12,78%).
Em meio ao aumento de preços, inclusive para produtos de primeira importância para o dia a dia das famílias - em níveis acima de 10% no acumulado do ano, como aconteceu com os preços do feijão (11,86%), arroz (11,6%), leite (10,1%) e diversos cortes de carne (acima de 13,5%).
Nos supermercados, os consumidores têm se desdobrado para economizar. No entanto, com o crescimento da inflação puxado pelos itens de alimentação, manter um padrão de gastos tem sido difícil, mesmo que a lista de compras não seja alterada.
Tatiana Machado, 38, é nutricionista e atenta às variações de preços. Adepta às pesquisas de valores entre os pontos de venda, afirma que se planeja para ir ao supermercado.
Segundo ela, a busca por descontos em atacarejos tem sido importante para encontrar preços mais em conta. "Eu sempre olho os aplicativos dos supermercados, vejo se realmente está em oferta, comparo tudo".
E ela dá a dica: "Gosto de organizar minha lista antes de sair. Primeiro verifico em casa o que já tenho no estoque e só compro o que está faltando ou aquilo que vale a pena aproveitar em promoção. Assim, evitamos idas frequentes ao supermercado, o que ajuda a economizar combustível - que também encareceu muito".
Quem também pesquisa bastante antes de comprar é o contador e comerciante Augusto Melo, 50, e a esposa Deusivania Canuto, 34. Dono de uma petiscaria, ele diz que o preço de hortifrutis varia conforme a safra, o que já está acostumado, mas outros produtos, como o café e as bebidas, sofreram grandes aumentos em 2024.
"Como estamos sempre atentos, quando percebemos um preço menor, aproveitamos para comprar uma quantidade maior, já que sabemos que na semana seguinte o valor pode aumentar. Essa é uma estratégia comum entre comerciantes, principalmente no que diz respeito a hortifrutis", diz.
Augusto ainda finaliza dizendo que durante o ano não pode revisar os preços do cardápio de seu negócio com receio de perder parte da clientela e acabou absorvendo os aumentos dos principais insumos dos pratos e das bebidas.
Grupo aposta em loja de descontos para concorrer com atacarejos
A preferência dos consumidores ávidos por preços mais baixos gerou a rápida popularização dos atacarejos no varejo supermercadista. Mas, no Ceará, o Grupo São Luiz comemora os resultados de seu modelo de loja de descontos, o Mercadão.
Segundo o estudo "Adaptação e novos caminhos para o Atacarejo", da Nielsen, neste ano, 80% dos nordestinos compraram em atacarejos em 2024.
Aqui, os donos do Mercadinhos São Luiz decidiram apostar num modelo já consolidado no Exterior de loja de descontos.
Luiz Fernando Ramalho, diretor comercial do Grupo São Luiz, destaca que a proposta é trazer uma gama de produtos selecionada com os melhores preços, "possibilitando que o cliente adquira marcas selecionadas com um valor diferenciado".
O modelo de loja foge da grandiosidade dos atacarejos e não prima necessariamente pela compra em grande quantidade. "O modelo de atacarejo de fato cresceu e o Mercadão chegou como um concorrente a esse formato, já que enxergamos essa oportunidade através de uma loja de baixo custo operacional, dentro da cidade e com descontos".
A grande diferença entre o Mercadão e o Mercadinhos é o mix de produtos. O Mercadinhos tem, em média, de três a quatro vezes mais produtos em seu sortimento que o Mercadão
Dentro do Grupo São Luiz, a maior parte das novas lojas abertas em 2024 foi com o Mercadão, sendo quatro em Fortaleza e uma em Maracanaú (Região Metropolitana).
Hoje, o modelo representa 25% do faturamento do Grupo. Até 2026, o executivo projeta que esse patamar cresça e alcance 50%.
Os efeitos para a economia e dia a dia dos consumidores
A escalada do IPCA no Brasil ao longo de 2024 chegou ao ponto de que o Banco Central já assumiu publicamente nesta semana que o índice deve fechar o ano estourando a meta, em 4,6%.
Para esse ano, o centro da meta de inflação era 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual (p.p.) - ou seja, até 4,5%.
A meta é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que segue a premissa de inflação baixa, estável e previsível por meio dessa mesma metodologia desde 1999.
Se a inflação ficar fora do intervalo de tolerância por seis meses consecutivos, é considerado descumprimento da meta. No caso de descumprimento da meta, o BC tem de divulgar publicamente as razões do descumprimento por meio de nota no Relatório de Política Monetária e carta aberta ao Ministro da Fazenda.
Em 2024, a carestia dos preços dos alimentos está bastante ligado às variações climáticas prejudicando safras e pastagens, prejudicando a pecuária, além do aumento de patamar do dólar, que prejudicou os setores que importam insumos, explica Raphael Moses, professor de Finanças do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/UFRJ).
A questão do câmbio também é importante por tornar o mercado internacional mais atrativo à exportação.
Esse cenário torna um desafio a inflação sobre os alimentos, impactando especialmente os mais pobres, além de diminuir o poder de consumo da classe média.
"O panorama da inflação em 2024 realmente foi se deteriorando ao longo do ano. A questão do câmbio gera bastante preocupação. Produtos importados ficam mais caros para a população brasileira, já que o varejo compra mais caro e acaba repassando esse custo", pontua.
Dado o cenário atual, o economista da XP, Alexandre Maluf, destaca que há uma piora dos cenários no médio prazo, o que pode implicar em aumento da taxa básica de juros (Selic).
"Isso reforça nossa expectativa de que o Banco Central deve acelerar o ritmo de aperto monetário, com uma alta de um ponto percentual na taxa Selic na próxima reunião. Estamos projetando uma inflação de 5% para este ano e 5,2% para o próximo, com viés de alta para 2025", aponta.
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Os produtos que mais subiram de preço em 2024 - em Fortaleza
O POVO optou por listar os aumentos acima de 10%
Medicamentos oftalmológicos: 10,04%
Leite em pó: 10,15%
Serviços educacionais de pré-escola: 10,15%
Serviços educacionais de Ensino Fundamental: 10,34%
Serviço médico de dentista: 10,44%
Medicamentos hipotensores e hipocolesterolêmicos: 10,51%
Medicamentos anti-inflamatórios e antirreumáticos: 10,75%
Contrafilé bovino: 11,18%
Banana - prata: 11,34%
Azeitona: 11,34%
Medicamentos hormonais: 11,38%
Serviços educacionais de Educação de Jovens e Adultos: 11,58%
Arroz: 11,61%
Medicamentos dermatológicos: 11,85%
Feijão: 11,86%
Colorau: 12,10%
Medicamentos anti-infecciosos e antibióticos: 12,78%
Ônibus interestadual: 12,85%
Medicamentos psicotrópicos e anorexígenos: 12,90%
Joias: 16,90%
Serviços de reforma de estofado: 13,22%
Carne seca e de sol: 13,58%
Serviços de conserto de automóveis: 13,68%
Patinho bovino: 14,59%
Batata-inglesa: 14,62%
Chã de dentro: 14,68%
Sal e condimentos: 16,41%
Chocolate em barra e bombom: 16,84%
Chocolate e achocolatado em pó: 16,39%
Serviço de manicure: 17,08%
Acém: 17,47%
Cigarros: 20,71%
Alho: 29,57%
Café: 39,97%
Laranja - pera: 48,17%
Fonte: IBGE
Título
O Grupo não considera o Mercadão como um atacarejo, pois, por exemplo, não trabalha com preços no varejo e atacado, mas sim com valores menores em relação ao Mercadinhos
São Luiz