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Os 130 anos da rainha do crime, Agatha Christie
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Os 130 anos da rainha do crime, Agatha Christie

Há exatos 130 anos nascia Agatha Christie. O V&A relembra importantes fatos da vida e da obra da famosa escritora de romances policiais
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Foto tirada em março de 1946 mostra a escritora inglesa Agatha Christie, em sua casa, Greenway House, em Devonshire (Foto: AFP) (Foto: AFP)
Foto: AFP Foto tirada em março de 1946 mostra a escritora inglesa Agatha Christie, em sua casa, Greenway House, em Devonshire (Foto: AFP)

Foi em um hospital da comunidade residencial Hampstead, na Inglaterra, que surgiu uma das mais populares escritoras do mundo. Em meio a dias ociosos, a então enfermeira Agatha Christie (1890 - 1976) decidiu dedicar seu tempo à escrita de um romance policial que, posteriormente, viria a ser "O Misterioso Caso de Styles". "Às vezes eu ia à tarde, sabendo que nenhum trabalho me esperava. Depois de verificar se os recipientes armazenados estavam cheios e devidamente posicionados, eu estava livre para fazer o que quisesse, exceto sair do dispensário. Então, refletia sobre o tipo de história de crime que escreveria", explica a autora em "Autobiografia" (1977).

Em 1920, lançou sua primeira obra. O livro havia sido escrito em 1916, mas foi divulgado apenas quatro anos depois, no auge da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Em sua história de estreia, abriu o caminho para um dos mais famosos detetives da ficção: Hercule Poirot. Como o já consagrado Sherlock Holmes, de Arthur Conan Doyle, o personagem de Agatha Christie tinha um talento especial para a resolução de mistérios. Ao lado do policial belga aposentado, a autora também introduziu outros nomes que seriam recorrentes, como Japp e Arthur Hastings.

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Após adquirir experiência no mercado editorial da época, produziu novos enredos de forma regular. Sua afeição pela escrita era tão contínua que publicou exemplares quase que anualmente. Por isso, coleciona mais de 80 títulos em sua trajetória. Entre os destaques estão "Assassinato no Expresso do Oriente" (1934), "Os Crimes ABC" (1936), "É Fácil Matar" (1939), "E Não Sobrou Nenhum" (1939) e "A Mansão Hollow" (1946). Não por acaso foi denominada "rainha" e "dama do crime".

Traduzidas para mais de 40 idiomas, suas histórias passaram a alcançar o público brasileiro no início da década de 1930, quando já era conhecida mundo afora. Neste período político regido por Getúlio Vargas, as obras da dama dos romances policiais eram considerados inofensivos. "Ela chegou como parte de uma iniciativa da Livraria do Globo de trazer ao público nacional o romance policial, um gênero ainda quase desconhecido por aqui. Foi publicada em uma coleção com outros grandes autores do mesmo estilo, como Edgar Wallace, num momento histórico em que, politicamente, o gênero parecia uma boa opção, vista como 'inofensiva' pela censura", explica Vanessa Hanes, docente de língua inglesa e da área de tradução na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, no Rio de Janeiro.

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Para a professora, Agatha Christie não pode ser considerada detentora de uma literatura canônica, mas o mercado brasileiro a definiu desta forma em determinados aspectos. "Por se tratar de textos que buscam o alcance de um público amplo, vendidos em um formato simples e barato, produzidos quase que em série, seria o que chamamos de literatura de massa. O que busco problematizar é que, no Brasil, seus livros acabaram tendo um status semi-canônico, por serem publicados em coleções lado a lado com autores, como Shakespeare, por exemplo. Encontramos até materiais didáticos associados às suas histórias", comenta Vanessa Hanes.

Consagrada no gênero em que atuou, a escritora foi capaz de refinar as características da narrativa de detetives. "Podemos destacar três características: a dicção mais intimista dos narradores, que difere muito dos criados por Arthur Conan Doyle; o modo como ela retrata as personagens, tanto física, quanto psicologicamente; e a diversidade de métodos utilizados nos crimes representados em seus livros", afirma Jean Pierre Chauvin, professor da disciplina "O Romance Policial de Agatha Christie", na Universidade de São Paulo (USP). De acordo com o pesquisador, ela reúne aspectos de alta qualidade literária em seus textos, principalmente, por ter sido uma leitora voraz dos clássicos.

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A rainha do crime pode ter alcançado um lugar de prestígio entre os brasileiros, mas suas obras ainda não foram suficientemente estudadas no País. "O romance policial precisa ser lido como obra literária não-descartável, e não como "subliteratura", pela crítica. Fora do Brasil, há numerosos estudos que levam suas tramas a sério. Aqui, parece haver preconceito de parte dos estudiosos, que tendem a rotular obras desse gênero como leitura rasa, feita para meramente entreter os leitores", indica Jean Pierre. Segundo ele, uma análise mais atenta pode revelar teorias psicanalíticas vigentes de seu tempo a partir da caracterização das personagens, além de outras questões.

Se é ou não um clássico, Agatha Christie não precisou ser classificada para vender bilhões de cópias. Ela se mantém entre as mais populares autoras do mundo. Em "Autobiografia", reflete: "Vai ser muito triste o dia em que não puder mais escrever, mas sei que não devo ficar ansiosa. Afinal, é uma sorte ainda poder fazer isso aos 75 anos. Acho que tenho que me acomodar e estar preparada para quando chegar a hora. Na verdade, já pensei várias vezes em me aposentar este ano, mas, no final, o fato de meu último livro estar vendendo melhor que os anteriores me fez desistir: não parecia o momento certo. Talvez o limite de idade seja oitenta". De fato, foi apenas aos 85 anos, quando faleceu, que parou de escrever.

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