Cheio de gírias, um "bonézinho daora” e muitas inquietações na cabeça foi como Audino Vilão começou a gravar vídeos de maneira despretensiosa para o YouTube. Abordando conteúdos densos, ele demonstra sua habilidade para traduzir ideias de grandes pensadores para uma linguagem simples e mais corriqueira, sobretudo nas periferias. Estudante de História, ele passou a trazer para seu público reflexões filosóficas de uma forma mais democrática e única.
Entre seus vídeos mais famosos, estão títulos como “Traduzindo Karl Marx para gírias paulistas” e “Nietzsche: o famoso roba brisa”, em que consegue fazer associações entre os pensamentos clássicos com o dia a dia dos brasileiros. Oriundo de Paulínia, no interior de São Paulo, ele acumula 131 mil inscritos e mais de 2 milhões de visualizações no YouTube, além de participações especiais com nomes como Leandro Karnal, Luiz Felipe Pondé e Clóvis de Barros Filho.
Audino Vilão é o segundo convidado do UP Gamer+, programa do OP+ de entrevistas durante partidas de jogos eletrônicos. Confira como foi parte da conversa, cuja íntegra vai ao ar na terça-feira, 1º de maio.
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O POVO - Quando você começou seu projeto no YouTube?
Audino Vilão - O canal vai completar 7 anos, só que no começo não era filosofia. Era mais gameplay e memes, mas hoje em dia esses vídeos estão todos privados. Em 2019 foi quando comecei a postar os primeiros vlogs só que muito voltados para comédia. Daí no meio de 2020, eu gravei o primeiro vídeo de filosofia mesmo que era o “Traduzindo Karl Marx para gírias paulistas”, que tinha um teor didático, mas de comédia também. Era para a galera dar uma risada e também perceber que não era aquele negócio de comunismo, que o pessoal não entende, que é totalmente deturpado.
O POVO - O que lhe motivou a gravar o vídeo sobre o Marx?
Audino Vilão - Estava no auge da pandemia, com aqueles depoimentos de “gripezinha”, aqueles negócios que você via e pensava: ‘cara, esse negócio não é real, é um episódio de South Park, é uma zoeira muito grande porque não é possível que um bagulho desses esteja acontecendo com a nossa população’. Só que eu não estava conseguindo encaixar o roteiro.
Eu sou muito fã do MC Kauan que tem uma música com o refrão “É tudo nosso, o que não for, nós toma”, daí eu olhei e disse: “mano, isso é Karl Marx, tá ligado?”. Tive um insight muito forte e é isso. Pensei em falar zoando, mas explicando, porque a gente sabe que falar de Marx parece até pecado aqui no Brasil. Eu queria passar um negócio engraçado, voltado para a periferia, para a molecada mais nova e que usasse o funk como base para a explicação. Dois dias depois postei o vídeo mais visualizado no canal, que é o “Nietzsche: o famoso roba brisa”, aí consolidou e comecei a me aprofundar na filosofia.
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O POVO - Atualmente existem filósofos considerados pops, como Leandro Karnal e Luiz Felipe Pondé, principalmente por causa das redes sociais. Até que ponto o trabalho deles é importante para você?
Audino Vilão - Cara, é muito (importante), porque é sobre o aluno se sentir capaz de estar inserido naquilo, sabe? Uma coisa que antes era elitizada, não tinha o horizonte popular, para a favela. Não era uma coisa acessível para as massas. A filosofia não era para as massas. Essa é uma crítica que Diógenes de Sinope fazia a Platão, que teria elitizado o pensamento de Sócrates através da academia.
Essa massificação e grande divulgação do conhecimento filosófico tem que estar a todos. Por exemplo, falando de Karl Marx, ele não tem que estar nas elites. Tem que estar na boca do povo. É um pensador que tem que estar muito nítido no consciente popular, porque ele não está falando para a burguesia. Marx está falando para o povão, para o trabalhador. O próprio Manifesto Comunista é uma obra voltada para pessoas sem muito acesso à cultura erudita. Então assim, a filosofia tem que estar na boca do povo. A arte de se viver não tem que estar restrita a uma pessoa, uma academia ou uma banca de doutorado. A arte de se viver tem que estar em todas as pessoas.
O POVO - Os seus planos para o futuro são de dar aula em escolas ou são mais voltados para o trabalho virtual?
Audino Vilão - Eu quero ir para a sala de aula, continuar completamente com os meus trabalhos na internet, daí depois quero seguir uma carreira acadêmica. Eu tenho pretensão de fazer filosofia mesmo, quero escrever os baratos, quero ser um filósofo brasileiro. Assim, se for para dizer a minha pretensão máxima: quero ser o primeiro filósofo da periferia, tá ligado, falando de uns bagulhos existencialistas sobre sociedade, de epistemologia, metafísica moderna, sei lá… Eu quero isso, tá ligado…
O POVO - Mas talvez você já seja um filósofo, não? O quê que precisa para classificar?
Audino Vilão - Então, cara, é muito louco isso. Já tem uma baita de uma galera que me considera filósofo, mas assim, se comparar com o próprio Nietzsche, com Kierkegaard, com as minhas referências, eu só vou me denominar filósofo quando tiver alguns livros meus aí na pista, quando eu me tornar um professor universitário, alguma coisa nesse sentido. Eu me classifico mais como um comunicador de filosofia.
Programa de entrevistas com personagens que transitam peço mundo digital durante uma partida de jogo eletrônico