A vitrine agora é também uma tela. A propaganda, um vídeo curto no celular. O “passa lá no meu ponto” virou um link no Instagram. Em meio a tantas mudanças, uma pergunta ecoa: como sobreviver e crescer sendo pequeno em um mundo cada vez mais automatizado e veloz?
Entender as conexões entre empreendedorismo, tecnologia e humanidade talvez seja um dos caminhos mais “certos” em meio a tantas transformações, na batalha daqueles que empreendem com propósito e relevância.
Do ponto de vista prático, os dados apontam um cenário em mutação. Ferramentas de inteligência artificial, antes restritas a grandes empresas, hoje ajudam microempreendedores a gerenciar melhor seu tempo, atrair clientes e profissionalizar suas operações. Mas essa revolução não acontece em silêncio.
Ela pulsa nas feiras, nos bastidores das lojas físicas e virtuais, nos stories de quem faz tudo com o celular na mão e o coração no negócio.
Essa passou a ser uma realidade de muitos empreendedores que buscam se manter atualizados em um mercado hiperconectado, como os lojistas do Centro Fashion, em Fortaleza. O local, que registra uma circulação média de 400 mil pessoas por mês, tem 78% de suas lojas geridas por mulheres empreendedoras.
O POVO+ conversou com três delas que já incorporaram a inteligência artificial em seu dia a dia, marcado por muito trabalho, dedicação e constante atualização frente às novas tendências tecnológicas. Elas demonstram como a IA, aliada a uma forte presença digital e a um foco no relacionamento humano, tem sido fundamental para o impulsionamento de seus negócios.
Ferramentas como ChatGPT, Canva com IA, CapCut e plataformas de anúncios são exemplos de recursos acessíveis e intuitivos que podem ser implementados por pequenos empresários que estão começando na jornada do empreendedorismo do zero.
Essas soluções permitem, por exemplo, gerar com rapidez e baixo custo textos, legendas, imagens e vídeos personalizados para captar e reter clientes.
Tanto especialistas, como lojistas, no entanto, são enfáticos ao afirmar que a “chave do sucesso” não está em delegar tudo aos algoritmos. É preciso encontrar equilíbrio entre a automação e a sensibilidade humana; entre a lógica das máquinas e o instinto que guia os negócios.
Mais do que alimentar planilhas e perseguir métricas, é essencial manter o olhar atento às pessoas e usar as tecnologias a favor do propósito, e não em sua substituição, para garantir relevância e conexão em um mercado em constante transformação.
O uso de ferramentas de inteligência artificial deixou de ser apenas um diferencial competitivo para se tornar essencial à sobrevivência e ao crescimento de micro e pequenos negócios no Brasil.
Essa transformação é especialmente perceptível em centros comerciais como o Centro Fashion, em Fortaleza, onde cerca de 78% dos mais de 4 mil pontos de venda são liderados por mulheres que vêm incorporando a tecnologia para inovar, crescer e se conectar de forma mais eficaz com os clientes.
Mesmo com equipes enxutas e orçamentos limitados, essas empreendedoras têm recorrido à IA para otimizar processos, economizar tempo e ampliar o alcance de suas marcas. O economista Ricardo Coimbra destaca que a inteligência artificial pode “facilitar o entendimento do comportamento do consumidor, indicando o que produzir e comercializar”, além de contribuir para a gestão e o desenvolvimento de estratégias mais assertivas.
Para ele, o acesso a essas ferramentas tem o potencial de reduzir desigualdades e fortalecer o empreendedorismo. Mestre em Economia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ricardo ressalta que a IA pode impulsionar a criação de novas ações e atividades, gerando impactos positivos na relação entre marca e consumidor.
Consultor de negócios do Sebrae-CE, Robson Rangel resume que a digitalização deixou de ser uma vantagem competitiva, como vista antigamente.
Segundo ele, essa passou a ser uma condição básica para a sobrevivência e o crescimento dos pequenos negócios. “Estar presente nas redes sociais, utilizar canais digitais de venda e adotar ferramentas de inteligência artificial são ações que ampliam o alcance, reduzem custos e melhoram a experiência do cliente”, aponta.
“É possível resistir por um tempo sem digitalizar, mas, no cenário atual, isso limita fortemente o potencial de crescimento e coloca o negócio em desvantagem frente aos concorrentes mais conectados”, completa. Diante desse cenário, empreendedoras enxergam nas novas tecnologias aliadas estratégicas a serem utilizadas de forma criativa.
Dona da loja Mascherina
Dona da loja KM77
Dona da loja Dinoo Kids
À frente da KM77, marca voltada para o público plus size, Kalyne Moura viu suas vendas aumentarem em 300% durante a pandemia ao apostar nas redes sociais, como Instagram e TikTok, onde saltou de 2 mil para 15 mil seguidores.
Hoje, ela considera a IA uma verdadeira “amiga” e “sócia” em seu negócio, utilizando diferentes ferramentas tanto para identificar novas tendências e demandas de suas clientes, quanto para criar coleções e planejar conteúdos em vídeo. Sugestões do que vestir, como se comunicar e até mesmo como redigir respostas personalizadas têm transformado interações negativas em experiências positivas para a marca.
“Quando alguma cliente me pergunta alguma coisa, eu não respondo mais como a Kalyne de um ano atrás responderia. Uma vez, uma cliente questionou dizendo que tínhamos produzido uma blusa menor do que a outra. E isso não era possível, porque todo o processo é industrial. Então, fui buscar uma resposta com a inteligência artificial. A resposta ficou tão linda, tão boa, que a cliente entendeu perfeitamente a situação”, relata.
Apesar do uso frequente da tecnologia, Kalyne faz questão de manter o toque pessoal no relacionamento com o público. “Vou adaptando as respostas, colocando meu jeito. Dá para perceber que sou eu ali, tem o meu dedinho, porque sou que estou dentro do processo, não é só um computador ou alguém respondendo por mim”, continua.
Quem também recorre à inteligência artificial é Andrea Lima, criadora da Mascherina. A marca, que teve início com a venda de máscaras durante a pandemia, rapidamente atraiu 5 mil seguidores no Instagram, um de seus principais canais de venda. Ao migrar para a moda feminina, porém, ela percebeu de vez a importância de integrar o digital ao físico, mantendo-se sempre atenta às novidades.
Ela conta que já virou noites estudando para acompanhar o que fazia sucesso nas redes, mas não apenas pelas tendências que precisava acompanhar. Era preciso ter domínio técnico para entender quais ferramentas deveria utilizar e como.
Foi assim que descobriu aplicativos como o ChatGPT e CapCut, que passaram a ajudá-la na criação de roteiros e descrições para postagens, ajustando a linguagem de acordo com a identidade da marca. A inclusão de legendas automáticas em vídeos para torná-los mais acessíveis e o auxílio para pensar estratégias de comunicação também foram recursos incorporados por Andrea no processo de digitalização.
Já Deysi Silva é responsável pela Dinoo Kids, loja especializada em roupas infantis masculinas com o propósito de “criar momentos felizes” para as famílias.
Ex-agente de turismo, ela mudou para o setor da moda e hoje utiliza a inteligência artificial em diversas frentes da empresa. Mesmo com essas facilidades digitais, faz questão de manter uma equipe interna dedicada ao marketing.
Segundo Deysi, o uso da IA começou recentemente e já resultou na implementação de sistemas de CRM "Sigla inglês para Gestão de Relacionamento com o Cliente, é um conjunto de práticas, estratégias e tecnologias que as empresas utilizam para gerenciar e otimizar a interação com seus cliente" para monitorar atendimentos e aprimorar o desempenho da equipe comercial. As ferramentas também têm sido utilizadas para auxiliar na criação de estampas e na otimização da produção, e futuramente deverão ser aplicadas na animação dos mascotes da marca.
O tópico mais sensível e fator de uma dúvida compartilhada por todas as empreendedoras é sobre a automação do atendimento, sobretudo via WhatsApp.
Com receio de perderem a identidade da marca e o vínculo com suas clientes diante da frieza das mensagens automáticas, elas ainda preferem manter o contato individualizado, chamando pelo nome e valorizando o calor humano.
“A venda é o fechamento do atendimento, é o final. Existe todo um processo de acolher e entender as necessidades dos clientes. Às vezes, o cliente nem vai efetuar a compra naquele momento, talvez porque não era prioridade, o valor estava fora do orçamento ou porque simplesmente não encontrou o que queria. Mas pode ter certeza de que, se a pessoa for bem acolhida, ela vai voltar e vai te indicar para outras”, reflete Deysi sobre o processo de atendimento, tanto virtual quanto presencial.
Para conhecer cada uma das histórias dessas empreendedoras, basta clicar nas fotos abaixo.
Localizado na Jacarecanga, bairro de forte valor histórico e comercial em Fortaleza, o Centro Fashion tornou-se referência no atacado e varejo de moda desde sua inauguração em 2017. Com corredores nomeados em homenagem a ruas icônicas da Capital, o espaço abriga mais do que lojas de roupas: é também um cenário onde trajetórias de resistência e reinvenção ganham forma.
Uma dessas histórias é a de Andrea Lima, que transformou dores profundas em motivação para criar a Mascherina, uma marca que hoje ecoa autoestima, inclusão e acolhimento. Mais do que empreendedora, Andrea é mãe solo, ex-costureira de madrugada, aprendiz incansável e referência para outras mulheres que, como ela, encontram na moda um caminho de libertação.
Criada por avós e tios, Andrea enfrentou desafios desde a infância. Aos 20 anos, foi abandonada pelo marido e tornou-se responsável sozinha por dois filhos pequenos: Vitória, hoje com 22 anos e estudante de Psicologia na UFC, e João Vitor, 21, aluno de Educação Física na Unifor.
“Naquela época, eu achava que meus sonhos cabiam numa caixinha”, lembra Andrea.
Ela ingressou no mercado de trabalho formal como recepcionista no Grupo de Comunicação O POVO. O trabalho de 6 horas por dia lhe permitia cuidar das duas crianças pequenas, sendo que uma delas, Vitória, nasceu com uma deficiência física e necessitava de um tratamento doloroso através de cirurgias.
No emprego com atendimento ao público, observando mulheres que também haviam superado grandes adversidades, Andrea viu reacender a chama do crescimento pessoal e profissional. Na empresa, subiu aos poucos: começou na recepção, passou pelo setor administrativo financeiro e chegou ao cargo de executiva comercial, impulsionada por seu carisma, inteligência emocional e capacidade de comunicação.
Foi então que Andrea descobriu seu talento para vendas e decidiu sair do O POVO. Ela assumiu uma empresa de mão de obras, que fechou, e depois se tornou vendedora de balcão em uma loja de shopping, que foi quando seu salário ficou significativamente menor. Apesar disso, aquele momento lhe aproximou do mundo da moda, algo que brilhava seus olhos desde a infância. Na época, também conheceu José Valci, com quem se casou.
Mesmo empregada em no shopping, Andrea começou a carregar seus sonhos no porta-malas do carro. Com o apoio do marido, passou a frequentar feiras e a bater de porta em porta vendendo roupas. Mas nem sempre os negócios iam bem. “Eu tinha dificuldades de lidar com certos dias, porque às vezes eu não conseguia vender nada. Isso me doía muito e eu ficava me perguntando se não era hora de desistir”, diz, relembrando das vezes em que chorou em silêncio diante das frustrações.
Essa rotina intensa durou três anos. Sensível ao esforço da esposa, o marido enxergou uma nova possibilidade. Ao ver um anúncio de venda de um box no Centro Fashion, sugeriu que ela abrisse ali um ponto fixo, onde pudesse empreender com mais estabilidade e visibilidade. Andrea topou o desafio e investiu no espaço.
No início, ela apostou todas as suas economias na venda de lingeries de alta qualidade. No entanto, os produtos não tiveram boa aceitação, pois o valor não condizia com o perfil do público que passou a atender. “Tinha dia de vender R$ 60 e eu achar que era a maior vitória. Aí escutava uma moça no telefone dizendo: ‘Hoje foi fraco, só vendemos R$ 300’. E eu pensava: ‘Se eu tivesse vendido R$ 300, meu Deus…’”.
Aquele obstáculo do preço que não se alinhava ao público foi agravado logo na sequência. Com a chegada da pandemia de Covid-19, o comércio fechou, mas Andrea viu uma oportunidade: costurar e vender máscaras de proteção pelas redes sociais. Com vídeos didáticos e um tom acolhedor, criou um vínculo com o público que ia além da venda, promovendo escuta, empatia e cuidado.
A partir daí, veio a ideia audaciosa de fabricar as próprias peças mesmo sem experiência em modelagem e costura. Mas ao se cercar de pessoas certas e especialista em cada área, viu suas vendas aumentarem ao longo dos anos. “Acho que as pessoas estavam se preparando para voltar a sair de casa, então começaram a comprar muito”, cogita, mencionando que pouco depois voltou ao seu box.
O retorno ao Centro Fashion foi triunfante. No primeiro dia, quase todo o estoque foi vendido e parte do sucesso ela atribui à uma decisão simples e transformadora de oferecer peças de diferentes tamanhos e não apenas o habitual "tamanho único". “Eu vim com seis tamanhos, porque tinha começado a escutar as dores de algumas mulheres que reclamavam que só existiam roupas muito pequenas. Fui escutando essas mulheres e fui direcionando a marca”, evidencia.
A escuta ativa das necessidades do público tornou-se a alma da Mascherina. Hoje, Andrea comanda duas lojas físicas, conta com milhares de seguidoras nas redes sociais e emprega direta e indiretamente pelo menos dez pessoas. O cuidado com o atendimento é sua marca registrada, e para muitas clientes, é quase terapêutico. “Tem mulher que diz que voltou a gostar de se vestir depois de conhecer a Mascherina. A gente escuta muito as dores das clientes”, afirma.
Além da sensibilidade, a trajetória de Andrea é marcada por sede de aprendizado. Sem formação universitária, passou madrugadas assistindo a tutoriais e hoje domina ferramentas de edição de vídeo e inteligência artificial, que usa para criar roteiros, legendas e até imagens das peças. “Mas meu maior cuidado é não perder a humanização. É isso que nos diferencia”, explica.
No coração do Centro Fashion, onde o vai e vem frenético de compradores e lojistas movimenta não apenas roupas, mas sonhos e reinvenções, a história de Kalyne Moura tem ajudado a redefinir o que significa fazer moda no Brasil. Símbolo de superação e potência, Kalyne traz em sua marca, a KM77, a empatia e a preocupação em vestir “mulheres com corpos fortes de verdade”.
Por trás do sucesso atual e da fortaleza que transparece em Kalyne, há uma história de cicatrizes profundas. Sua infância foi atravessada por episódios de violência doméstica, revelando um tratamento desigual que recebia da mãe, que canalizava agressões físicas e emocionais em sua pele. Foi apenas na adolescência, após um episódio visível de violência ser notado por um diretor escolar, que ela conseguiu romper o silêncio. "Até então, eu não falava para ninguém."
O ambiente hostil onde deveria ser de proteção plantou nela um desejo intenso de sair de casa o quanto antes. Ainda muito jovem, teve sua primeira filha e mergulhou em um relacionamento abusivo. “Ele me maltratou muito”, conta. As brigas por pensão, o medo do abandono e a escassez financeira moldaram sua juventude. Durante quase duas décadas, viveu "desestruturada", entre crises e tentativas de reconstrução.
Seu primeiro grande salto veio aos 17 anos, quando Kalyne encontrou no trabalho uma rota de fuga e de afirmação. Abordou um empresário na porta de uma loja no Centro de Fortaleza e perguntou como poderia trabalhar ali. O homem recomendou que ela fizesse um curso de vendas e que, se concluísse com a melhor nota da turma, teria a vaga garantia. E foi exatamente o que aconteceu.
Agora vendedora de móveis, ela encontrou os tons que marcaram sua carreira: a inquietude, a curiosidade e a determinação. Em pouco tempo, passou por áreas como contabilidade, administração e vendas, sempre buscando formação prática e técnica. Em uma dessas experiências, identificou um desvio financeiro grave em uma empresa e, ao alertar o dono, foi promovida diretamente à gerência financeira, com um salto de salário, de confiança e autoestima.
As próximas experiências de Kalyne foram em empresas de informática até chegar à uma fábrica de roupa feminina, quando pensou investir em um negócio próprio. Ao alinhar os conhecimentos do último emprego com as dores pessoais ao comprar roupas, pois tinha muitas dificuldades para encontrar tamanhos que lhe servissem bem e que fossem bonitas, ela decidiu empreender no Centro Fashion em 2017.
Inicialmente, comprava e revendia jeans na feira, observando e ouvindo suas clientes por um ano inteiro antes de começar a fabricar suas próprias peças. Estudou estratégias, buscou fornecedores, tecidos de qualidade e modelagens funcionais para mirar não no convencional, mas naquilo que era necessário, como resume: “Peças com qualidade e que respeitem o corpo de quem veste”.
Atuando no atacado e no varejo, Kalyne diz priorizar contratar mulheres gordas e que oferece possibilidades de trocas às revendedoras que não conseguem vender. Atualmente, mantém uma forte presença nas redes sociais, respondendo pessoalmente às clientes e criando conteúdos, com ajuda de inteligência artificial, a qual chama de sua “sócia invisível”.
Religiosa, ela define firmemente seu objetivo neste plano: “Ser um canal de bênção na vida das pessoas.” E faz isso costurando autoestima, gerando renda a pelo menos 30 trabalhos indiretos, escutando dores e oferecendo acolhimento. "Meu trabalho é uma missão", afirma.
Mais do que comércio, o Centro Fashion abriga histórias de transformação. Uma delas é a de Deisy Silva, fundadora da Dinoo Kids, que encontrou na moda infantil um caminho para promover acolhimento, afeto e impacto social. Ao lado do marido, Túlio Ramos, ela criou uma marca que não busca apenas vestir crianças, mas oferecer às famílias uma experiência de cuidado e pertencimento.
Antes de empreender, Deisy atuava como vendedora de pacotes turísticos em Fortaleza. A familiaridade com o público e o desejo de autonomia acenderam nela o impulso de começar o próprio negócio. Ao lado de Túlio, passou a frequentar feiras populares, como o Buraco da Gia, observando o movimento dos consumidores e os desafios enfrentados pelos feirantes.
Foi ali que enxergaram uma lacuna: o segmento infantil, que era pouco explorado. Com produtos no chão e uma escrivaninha improvisada como balcão, deram os primeiros passos e realizaram as primeiras vendas. O nome "Dinoo Kids" nasceu da paixão de Túlio por personagens infantis, gosto que, segundo Deisy, é compartilhado por quase todas as crianças.
Durante quatro anos no Buraco da Gia, a marca cresceu, mas enfrentou um momento de estagnação. O ambiente competitivo, focado em preço e pouca diferenciação, destoava do propósito que Deisy queria construir. Ela decidiu então recomeçar, mesmo com o risco de perder clientes, e apostou em uma nova fase ao fazer uma mudança para o Centro Fashion.
Ali, estruturou a Dinoo Kids como um espaço acolhedor e familiar, com pufes, bombons, água e provador infantil – este último pensado para garantir privacidade às crianças e reforçar os valores familiares da marca. A maternidade de Deisy, com o nascimento do filho Noah, fortaleceu ainda mais essa visão de criar um lugar onde mães pudessem amamentar com tranquilidade e crianças, inclusive com deficiência, fossem bem-vindas para brincar, explorar e se expressar.
Com o tempo, a marca passou a focar exclusivamente em roupas para meninos, um público muitas vezes negligenciado no mercado. Diante disso, Deysi conta que a proposta passou a ser oferecer peças confortáveis, resistentes e atemporais, pensadas para crianças que vivem a infância com intensidade.
A modernização do negócio também foi estratégica. Ativa nas redes sociais, a marca incorporou inteligência artificial e sistemas de CRM para otimizar o marketing, as vendas e a produção, sem abrir mão do atendimento humanizado que a diferencia.
Deisy passou então a reposicionar a Dinoo Kids como um “lugar que cria memórias felizes”. Assim nasceu a “Turma do Dinoo”, com personagens como Croc, Deco e Noah (em homenagem ao filho), brinquedos em formato de dinossauros pensados para transmitir valores como amizade, respeito e igualdade. A ideia é, futuramente, produzir vídeos com os personagens nas redes sociais, levando mensagens de amor, cuidado e proteção para as crianças.
O próximo passo da marca já começou, após Deisy e Túlio formatarem um modelo de franquia com a proposta de levar o conceito da Dinoo Kids para outros bairros de Fortaleza, replicando não só a estética da loja, mas também sua essência como espaço onde infância, acolhimento e afeto andam de mãos dadas.
Com soluções acessíveis, práticas e baratas, a inteligência artificial consegue atender micro e pequenos empresários nos mais diversos setores. O economista Ricardo Coimbra destaca seu impacto, especialmente no varejo popular, ao afirmar que a IA “ajuda a entender o comportamento do consumidor e a direcionar melhor a produção e a comercialização”.
Para ele, a tecnologia também contribui para a gestão e para o desenvolvimento de estratégias de relacionamento com o cliente. Segundo ele, um dos benefícios e aplicações pode ser na análise de dados de vendas e comportamento dos clientes. “A IA pode identificar falhas em processos de gestão, produção e comercialização”, explica Coimbra.
Ele continua afirmando que, como consequência, “aqueles que utilizarem de forma correta e efetiva, poderão ter um um crescimento no mercado, lucratividade e uma melhoria de desempenho no setor de atuação”.
Um dos principais desafios da adoção da IA, porém, está em equilibrar automação e atendimento humanizado, conforme as próprias empreendedoras do Centro Fashion relatam.
Para o especialista de negócios do Sebrae-CE Robson Rangel, o segredo é direcionar a automatização para demandas que de fato podem ser delegadas à uma máquina, e não para aquilo que é a alma do negócio.
"A chave é automatizar as demandas repetitivas e simples, mas manter o atendimento humano para situações mais complexas e emocionais", afirma, sugerindo dicas para a adoção das IAs:
“A combinação ideal é agilidade da máquina mais a empatia do ser humano”, menciona.
Na mesma linha de raciocínio, Ricardo Coimbra reforça que o uso da inteligência artificial precisa estar alinhado com a identidade da marca e o perfil do público-alvo. “O empreendedor deve interagir com a IA e observar se a comunicação está sendo realmente compreendida pelo consumidor final”, destaca.
Para ele, é fundamental que a linguagem utilizada reflita os valores da empresa, os interesses do cliente e o posicionamento dos produtos, evitando uma abordagem genérica e robotizada.
“A inteligência artificial precisa ser usada de forma estratégica, respeitando as particularidades de cada negócio e buscando se aproximar dos desejos e comportamentos do consumidor. Não pode ser uma solução padronizada para todos, mas personalizada, refletindo o que realmente faz sentido para aquele cliente específico”, continua.
Ferramentas acessíveis para começar
Para quem está iniciando no uso da IA, há diversas ferramentas intuitivas, com planos gratuitos e tutoriais fáceis de seguir. Abaixo, confira algumas delas:
As trajetórias de Andrea, Kalyne e Deisy, apresentadas na reportagem, são expressões de um movimento crescente entre pequenos negócios brasileiros, em especial aqueles liderados por mulheres, que buscam se modernizar, aumentar sua competitividade e garantir espaço no mercado. Essas histórias, porém, refletem uma realidade ainda mais ampla de que a digitalização já não é um diferencial, mas uma necessidade para a sobrevivência e o crescimento dos empreendimentos de pequeno porte.
Nesse contexto, a pesquisa sobre a Maturidade Digital dos Pequenos Negócios, disponível na plataforma DataSebrae, revela dados importantes. Embora os avanços sejam notáveis em diversas frentes, o levantamento mostra que ainda há um longo caminho a percorrer. A metodologia da pesquisa avalia 20 dimensões ligadas ao grau de maturidade digital, incluindo a capacidade de engajamento com clientes, inovação, uso de dados, incorporação de tecnologias habilitadoras e geração de valor.
Indicador de Maturidade Digital (IMD) de pequenos negócios
Em uma escala de 0 a 80 pontos, a média nacional é de apenas 35 pontos, sendo que a maior parte das empresas se concentra entre 20 e 50 pontos. Em termos regionais, o Sul lidera com 36 pontos, seguido de Nordeste (35), Sudeste (34,5), Norte (34,3) e Centro-Oeste (34,3). Entre os estados com melhor desempenho estão Santa Catarina (38,4), Acre (37,2) e Pernambuco (36,7). Já Pará (32,5), Mato Grosso (32,6) e Amapá (32,9) ocupam as últimas posições do ranking.
O Ceará, por sua vez, aparece apenas com 33,2 pontos, ficando também entre os estados com menor maturidade digital.
Essa lacuna é especialmente preocupante quando considerado o peso que os pequenos negócios têm na economia brasileira: eles representam 26,5% do PIB nacional e mais de 50% dos empregos formais no País. Para Ricardo Cappelli, presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), os dados mostram que é urgente acelerar a digitalização.
“Diante dos resultados da pesquisa, fica claro que é preciso apoiar a transformação digital dessas empresas, a fim de assegurar a sua inserção nessa nova realidade econômica”, afirma.
Realizado pela ABDI e pela Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o estudo revela, deste modo, que inúmeros desafios precisam ser enfrentados e superados a fim de manter os negócios competitivos e longevos.
Marco Bedê, coordenador da pesquisa Maturidade Digital pelo Sebrae aponta que “os pequenos negócios avançaram bastante”, a partir do momento em que o acesso à internet de alta velocidade sobretudo após a pandemia de Covid-19.
“Porém, estas empresas ainda avançaram pouco no quesito cultural ‘Inovar mais rápido e colaborativamente’, já que poucas contam com a colaboração dos empregados e com parcerias com outras instituições, na criação de novos produtos e serviços, o que é essencial para empresas digitais do futuro”.
Serviços de apoio à transformação digital para pequenos negócios