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Silvia Moura e a dança na praça do Centro
Reportagem Seriada

Silvia Moura e a dança na praça do Centro

As transformações da praça José de Alencar permanecem guardadas nas memórias da artista
Episódio 6

Silvia Moura e a dança na praça do Centro

As transformações da praça José de Alencar permanecem guardadas nas memórias da artista
Episódio 6
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As produções artísticas de Fortaleza mantêm uma conexão tênue com a literatura. Todos vivem em terras alencarinas, elaboram suas narrativas ao redor de grandes símbolos do imaginário - como "Iracema" - e caminham por ruas com nomes de escritores importantes da cultura cearense. Mas esse elo inseparável se torna ainda mais forte porque, na Capital, há dois lugares físicos que unem as artes cênicas ao legado literário: a praça e o Theatro José de Alencar. Os espaços possibilitaram uma conexão centenária de linguagens. Também foi onde a bailarina, coreógrafa e atriz, Silvia Moura, costurou sua trajetória na arte.

Ela solidificou sua carreira entre as ruas Guilherme Rocha, Liberato Barroso e General Sampaio. Entretanto, sua história com o local começa anos antes do início de sua profissão. Quando era criança, costumava descer no terminal que ainda existia no lugar para comprar tecido com sua mãe.

Fortaleza, Ce, BR 06.04.21- Aniversário de Fortaleza - Vista aéria do Praça José de Alencar no centro da Cidade (Foto: Fco Fontenele/O POVO)
Foto: fotos FCO FONTENELE
Fortaleza, Ce, BR 06.04.21- Aniversário de Fortaleza - Vista aéria do Praça José de Alencar no centro da Cidade (Foto: Fco Fontenele/O POVO)

Na adolescência, começou a frequentar espetáculos e a fazer cursos no Theatro José de Alencar. Até já morou no famoso Lord Hotel, ao lado da praça. "Sempre tive essa relação com o Centro. Desde muito cedo, comecei a ir no Theatro e acompanhei várias mudanças da praça. Quando morei do lado, comia ali de madrugada. Frequentava alguns bares perto depois dos ensaios. Também dei aula e trabalhei no Theatro José de Alencar", relembra momentos de sua história que cruzam o local.

"Tenho uma elo forte com a praça. Foi minha segunda casa durante um longo período. Era uma afeto que surgiu com minha mãe e reverberou com a história que eu tinha com o teatro", explica. E, como todos os lares, as memórias afetivas também permanecem. Sua primeira filha, por exemplo, nasceu naquelas imediações. Silvia Moura estava ensaiando no palco do TJA quando sua bolsa estourou. "Minha bolsa estourou no palco do teatro. Eu estava com oito meses. Fui no Hospital Geral Dr. César Cals e disseram que eu ia ter neném. Mas não estava sentindo dor, então voltei e fiz o espetáculo", recorda.

Silvia Moura começou a frequentar cursos no Theatro José de Alencar na adolescência (Foto: Fco Fontenele/O POVO)
Foto: FCO FONTENELE
Silvia Moura começou a frequentar cursos no Theatro José de Alencar na adolescência (Foto: Fco Fontenele/O POVO)

É impossível separar a trajetória da bailarina da praça José de Alencar. Suas narrativas estão misturadas uma nas outras. Sem aquele espaço público, as lembranças dos espetáculos, das diversões nos bares, das idas às lanchonetes e das visitas às grandes lojas seriam apagadas. "O ambiente era um lugar de acesso. Tínhamos que naturalmente transitar por ali. Como, desde pequena, eu comecei a fazer dança, era um grande equipamento cultural da Cidade. Era um dos lugares mais importantes para mim, onde eu comecei a me entender como gente."

Mas há alguns anos seu vínculo com o local já não era tão recorrente. Surgiram mais espaços de entretenimento, e o Centro se dissolveu para outras regiões de Fortaleza. A reforma e a pandemia do coronavírus também diminuíram essa relação. "Quando começou o isolamento, a praça estava em reforma. Na última vez que a vi, em março de 2020, ela estava cercada de tapumes. Esta abandonada", diz. Ao retornar pela primeira vez depois de um ano, para a gravação de um vídeo ao O POVO, percebeu muitas diferenças. "A praça estava vazia, com pouquíssimas pessoas. Tive um estranhamento muito grande. Tinha pouquíssimos carros e ônibus. Nenhuma loja esta aberta, somente uma farmácia. Foi muito difícil ver o teatro fechado."

 

Clara Menezes é repórter do Vida e Arte ( Foto: Fco Fontenele/OPOVO)
Foto: FCO FONTENELE
Clara Menezes é repórter do Vida e Arte ( Foto: Fco Fontenele/OPOVO)

Clara Menezes * 

Praça das Flores. Minha vida aconteceu no mesmo lugar. Cresci entre os quarteirões da Praça das Flores. Vi o lugar ganhar uma reforma e aumentar o número de floriculturas. Reconheço vários gatos, identifico os vira-latas caramelos e percebo até que o “Jajá”, o cachorro de um lava a jato próximo, faz suas caminhadas sozinho pela manhã. Mas esse cenário cotidiano mudou de repente. Aquele “lugar seguro”, em que os rostos eram sempre os mesmos, havia ficado vazio. As luzes começaram a se apagar cedo, e os vendedores não estão mais no local. Talvez as únicas semelhanças ao passado são as árvores e os animais, que agora têm o lugar inteiro para si.

* Repórter do suplemento Vida & Arte do O POVO

 

 


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