Bancária desde os 15 anos, a hoje doutora em economia social, Silvana Parente, de 61 anos, aprendeu desde muito cedo a lidar com números. E o que eles mostravam para ela, de maneira muito forte e clara, é que, no Brasil, embora a produção dependa do trabalho e suor de muitos, a riqueza estava concentrada nas mãos de poucos. Neste contexto, onde as oportunidades não são as mesmas para todos, não dá para esperar o bolo crescer para poder fazer a distribuição da riqueza. Foi com esse espírito que ela implantou, em 1997, o programa de microcrédito orientado do Banco do Nordeste (BNB).
“O modelo econômico brasileiro é muito concentrador, temos uma economia monetizada nas mãos dos grandes bancos que faz com que o capital não chegue na base da sociedade. E, se não invertemos essa lógica, não vamos conseguir avançar rumo à redução da desigualdade”, afirmou.
A ideia era usar os recursos subsidiados pelo Fundo Constitucional também para criar mecanismos para que pequenos e microempreendedores, muitos deles informais, pudessem também tocar seus negócios. Alicerçado na lógica da concessão do crédito de forma orientada e com juros bem abaixo da média do mercado, hoje, o Crediamigo é o maior programa de microcrédito da América Latina.
“A nossa missão era criar um programa especial de inovação que colocasse o banco à serviço das pessoas de baixa renda. Mas não dá para fazer isso seguindo o modelo capitalista que é aplicado às grandes empresas, era preciso apostar na economia solidária. Hoje o Crediamigo é quase um banco dentro do outro.”
Silvana entrou no BNB, em 1975, por meio de concurso público para habilitação bancária, uma espécie de programa trainee para adolescentes. Lá, cavou suas próprias oportunidades: foi a primeira mulher a ocupar o cargo de gerente corporativa, aos 30 anos. Também foi a primeira mulher a exercer a presidência do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), órgão responsável por elaborar estudos, pesquisas e informações socioeconômicas, além de avaliar políticas e programas do Banco do Nordeste.
O interesse em aprender mais sobre o tema a impulsionou a tomar uma decisão, considerada por muitos, drástica para época. Pediu demissão quando estava no topo da carreira no banco, como chefe de gabinete da presidência do banco, para voltar à carreira acadêmica. Passou um ano por Massachusetts Institute of Technology (MIT) e Harvard, nos Estados Unidos, onde apresentou a experiência do microcrédito e se especializou na área de economia do setor informal e desenvolvimento regional.
Na volta ao Brasil, trabalhou como consultora no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), da Organização das Nações Unidas (ONU), em um projeto de criação de metodologias para o desenvolvimento territorial sustentável em regiões menos favorecidas do País.
Também fundou o Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento Humano (IADH), desenvolvendo projetos para o terceiro setor, e acumulou passagens na gestão pública, como secretária-executiva do Ministério da Integração Nacional, em Brasília, e à frente da Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag), na gestão Cid Gomes, onde implementou, pela primeira vez no Ceará, o planejamento participativo regionalizado.
"O modelo econômico brasileiro é muito concentrador, temos uma economia monetizada nas mãos dos grandes bancos que faz com que o capital não chegue na base da sociedade. E, se não invertemos essa lógica, não vamos conseguir avançar rumo à redução da desigualdade"
De lá para cá, fez doutorado em economia social pela Universidade de Madri, desenvolveu projetos habitacionais para baixa renda e de empreendedorismo feminino no Brasil, assumiu a vice-presidência do Conselho Regional de Economia (Corecon-CE) e, desde a semana passada, é diretora de economia popular e solidária da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece). Em todas essas experiências, há um desafio em comum: criar caminhos para a inclusão produtiva dos mais vulneráveis.
“Está mais do que provado que a economia convencional não é capaz de absorver toda mão de obra do País. E a pandemia mostrou isso de forma clara. Precisamos mais do que nunca desenvolver essa outra economia, mais inclusiva, e que pode ser muito lucrativa também. Não se trata apenas de fazer a coisa certa, mas é algo que também faz sentido do ponto de vista econômico.”
Sou repórter especial de Economia do O POVO, mãe de quatro filhos e equilibrista das demandas da vida. Aprendi, desde muito cedo, o quanto a rede de apoio pode fazer a diferença para que a mulher ocupe seu espaço no mercado de trabalho e na sociedade. Acredito que uma economia mais inclusiva é possível.
Tenho 22 anos, sou artista visual e integrante do Núcleo de Imagem do O POVO. Prometi nunca esquecer das violências que nos atravessam por sermos mulheres, então trago em minha arte e trabalho críticas e reflexões em busca de equidade de gênero.
Especial sobre o novo pensamento feminino. Quem são as mulheres que inspiram outras mulheres