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Solidão: o mal invisível que adoece corpo e mente
Reportagem Seriada

Solidão: o mal invisível que adoece corpo e mente

A solidão não é só um sentimento passageiro — ela pode afetar a saúde física e mental, aumentar riscos de doenças e se tornar um desafio para a saúde pública, exigindo atenção e políticas públicas adequadas

Solidão: o mal invisível que adoece corpo e mente

A solidão não é só um sentimento passageiro — ela pode afetar a saúde física e mental, aumentar riscos de doenças e se tornar um desafio para a saúde pública, exigindo atenção e políticas públicas adequadas
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Gabriel García Márquez publicou, em 1967, a incrível e triste história dos Buendía, a prole de solitários para a qual "não será dada uma segunda oportunidade sobre a terra".

Adaptada para o audiovisual em 2024, Cem Anos de Solidão explora o desamparo que pesa sobre os habitantes de Macondo e a impotência frente às forças indomáveis da natureza e dos instintos dos homens.

Um dos motivos pelos quais a obra segue aclamada pelo público é justamente como aborda a Solidão, um sentimento tão antigo quanto a própria humanidade. 

Representado na literatura, no cinema, na música e presente na vida de todos, o tema vem ganhando uma atenção especial da comunidade científica. O motivo? A solidão pode matar. E é um mal que está se espalhando.

Cena do filme Cem Anos de Solidão(Foto: Netflix Divulgação)
Foto: Netflix Divulgação Cena do filme Cem Anos de Solidão

Segundo um estudo da Associação Americana de Psicologia, 48% dos adultos norte-americanos se sentem sozinhos com frequência. Esse foi, até então, o maior grau de solidão já registrado na literatura científica.

Com o crescimento do número de pessoas solitárias - também chamadas de socialmente adoecidas - em 2023, a solidão foi classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma “ameaça urgente à saúde”. 

Central para as políticas públicas de saúde, a discussão tem, pelo menos, dois lados: estamos nos tornando mais solitários ou somente mais inclinados a reconhecer e falar sobre o problema?

 

 

Me sinto só, mas quem é que nunca se sentiu assim?

Em meados dos anos 2000, a estética emo era um sucesso mundial. Em todos os lugares era possível encontrar um jovem usando roupas pretas, franjas, maquiagens escuras e coturnos.

Uma das músicas mais populares daquela época era “Um minuto para o fim do mundo”, da banda CPM22. Logos nos primeiros versos, vinha a frase “Me sinto só, mas quem é que nunca se sentiu assim?”

E o médico Paulo Afonso Sandy Júnior confirma: todo mundo já se sentiu solitário. Doutor em gerontologia, a tese de Paulo explorou as causas e efeitos da solidão na terceira idade.

O especialista explica que a solidão é uma experiência emocional aversiva e individual, marcada pela sensação de que as relações sociais disponíveis não são suficientes para atender às necessidades emocionais de uma pessoa.

“Alguém que vivencia a solidão se sente triste ou vazio, seja pela ausência de pessoas por perto, seja pela falta de conexão emocional com os outros. E apesar de muita gente associar a solidão à velhice, ela acontece em todas as faixas etárias”, afirma.

Fato curioso é que, por mais que os jovens emo dos anos 2000 entoassem os hinos à melancolia e à solidão, eles tinham relações sociais mais complexas e profundas do que os adolescentes hiperconectados de hoje.

Mesmo com uma estética "dark", os jovens emos e góticos dos anos 2000 se engajavam mais em vivências comunitárias, diferente dos adolescentes da geração alpha(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Mesmo com uma estética "dark", os jovens emos e góticos dos anos 2000 se engajavam mais em vivências comunitárias, diferente dos adolescentes da geração alpha

Não era incomum encontrar grupos de jovens reunidos em praças, eventos, shopping centers, e em alguns casos, até nos cemitérios. Atualmente, por mais que a internet permita a conexão com pessoas do mundo todo, os efeitos estão sendo invertidos.

Uma pesquisa da Universidade de Pittsburgh, publicada no Periódico Americano de Medicina Preventiva, aponta que acessar plataformas como X, TikTok e Instagram por mais de duas horas ao dia dobra a probabilidade de alguém se sentir isolado.

Outro estudo, chefiado pela pesquisadora Laura Marciano, da Universidade de Harvard, reuniu mais de 500 adolescentes para investigar a conexão entre tecnologia e solidão.

O consumo de plataformas de microblogging como o X e Threads, e de vídeos curtos, como TikTok e Reels faz com que os internautas passem horas sem interagir com outras pessoas(Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS O consumo de plataformas de microblogging como o X e Threads, e de vídeos curtos, como TikTok e Reels faz com que os internautas passem horas sem interagir com outras pessoas

Os dados obtidos revelaram que mais de 50% dos jovens não haviam se comunicado com ninguém na última hora, mesmo com o uso intenso de redes sociais. O fenômeno é global, mas em alguns lugares já alcançou proporções preocupantes.

No Japão, cerca de meio milhão de pessoas vivem isoladas. Elas são conhecidas como "hikikomori" - na prática, pessoas solitárias que se afastam de todo o contato social e, muitas vezes, ficam anos sem sair de casa.

Esta foto tirada em 8 de março de 2018 mostra Ikeida, um japonês de 55 anos que escolheu se isolar completamente da sociedade, posando para uma foto em Tóquio. Ele sai de casa uma vez a cada três dias para comprar comida, evita entregas para evitar interação humana e não vê seus pais ou irmão mais novo desde que tinha 30 anos(Foto: Kazuhiro Nogi / AFP)
Foto: Kazuhiro Nogi / AFP Esta foto tirada em 8 de março de 2018 mostra Ikeida, um japonês de 55 anos que escolheu se isolar completamente da sociedade, posando para uma foto em Tóquio. Ele sai de casa uma vez a cada três dias para comprar comida, evita entregas para evitar interação humana e não vê seus pais ou irmão mais novo desde que tinha 30 anos

O transtorno foi considerado, inicialmente, cultural. E há razões para se pensar que a sociedade japonesa é especialmente suscetível a ele, destacou Takahiro Kato em uma entrevista à BBC. Takahiro é professor de psiquiatria na Universidade de Kyushu, na região Fukuoka, e pesquisador do tema.

"No Japão há um ditado muito famoso que diz: o prego que se destaca leva martelada", diz o médico. "E as rígidas normas sociais, as altas expectativas manifestadas pelos pais e a 'cultura da vergonha' fazem com que a sociedade japonesa seja terreno fértil para sentimentos de inadequação e o desejo de querer se esconder do mundo".

O hikikomori começou a ser observado no Japão, mas já há casos documentados em vários países. O comportamento tem características bem definidas

 


Em um levantamento feito pelo O POVO+ em plataformas que agregam estudos acadêmicos, foram encontrados outros casos de "hikikomori" fora do Japão.

Em uma pesquisa de 2015, Takahiro Kato e colegas pesquisadores nos Estados Unidos, na Coreia do Sul e na Índia encontraram casos em seus países que correspondiam aos critérios clínicos.

Outro estudo realizada em Barcelona, na Espanha entre 2008 e 2014, conseguiu documentar 190 casos de hikikomori no país. Um destaque do estudo foi que em apenas 30% dos pacientes foi identificado vício em internet. Entretanto, o grupo com vício tendia a ser mais jovem - com a média de idade de 24 anos, enquanto a média dos casos analisados era de 39 anos.

 


A solidão em números e fatos

Clinicamente, quando se fala em solidão, fala-se também em isolamento social. A palavra foi usada à exaustão durante os anos da pandemia de Covid-19 e os efeitos da prática reverberam até hoje.

Em 2021, no pico da crise sanitária, uma pesquisa do Instituto Ipsos revelou que em um universo de 28 países, os brasileiros eram os que mais se sentiam solitários. Segundo o levantamento, 50% das pessoas entrevistadas no Brasil disseram sentir solidão "muitas vezes", "frequentemente" ou "sempre".

O percentual foi o maior entre todas as populações ouvidas pela pesquisa. Em segundo lugar vieram os turcos, com 46%, seguido pelos indianos (43%) e pelos sauditas (43%).

Os dez países com maior grau de solidão

 

Psicóloga do programa "De setembro a setembro", voltado para cuidados permanentes com a saúde mental na Unesp, Juliene de Cassia Leiva acredita que o isolamento social prolongado causado pela pandemia de Covid-19 tornou este desafio ainda maior.

Segundo ela, a literatura científica da área de psicologia social tem indicado um aumento no número de queixas relacionadas a transtornos como a depressão e a ansiedade no pós-pandemia.

“Tudo indica que este fato esteja relacionado à ocorrência do isolamento social e da pandemia. Para nós, é muito importante que admitamos esta realidade para podermos lidar com isso”, afirmou a psicóloga

A área de psicologia social tem indicado um aumento no número de queixas relacionadas a transtornos como a depressão e a ansiedade associados ao período de isolamento social compulsório(Foto: Bruce Bennett/Getty Images/AFP)
Foto: Bruce Bennett/Getty Images/AFP A área de psicologia social tem indicado um aumento no número de queixas relacionadas a transtornos como a depressão e a ansiedade associados ao período de isolamento social compulsório

E o lidar com isso vai muito além de políticas de saúde mental. A diretora do Laboratório de Conexão Social e Saúde da Universidade Brigham Young, Julianne Holt-Lunstad, afirma que a solidão e o isolamento social são duas vezes mais prejudiciais à saúde física e mental do que a obesidade.

"Há evidências sólidas de que o isolamento social aumenta significativamente o risco de mortalidade prematura" afirma. Em adultos mais velhos, a solidão eleva em 50% o risco de demência e em 30% as chances de desenvolver doenças cardiovasculares.

Essas descobertas levaram a Organização Mundial da Saúde (OMS) a classificar a solidão como uma “ameaça urgente à saúde”, em 2023. Desde então, um grupo de trabalho tem se dedicado a estudar o tema e chegar a soluções viáveis.

Solidão mata tanto quanto fumar 15 cigarros por dia, alerta OMS(Foto: )
Foto: Solidão mata tanto quanto fumar 15 cigarros por dia, alerta OMS

Estudos sobre o tema também foram realizados fora do meio acadêmico. Conduzidos pela Gallup e encomendados pela Meta, os levantamentos "State of Social Connections" e "Global State of Social Connections" abrangeram 142 países, representando 77% da população adulta mundial.

Os resultados revelam que cerca de 80% dos jovens, de 15 a 28 anos, sentem falta de apoio social. No Brasil, 34% dos entrevistados dessa faixa etária declararam que se sentem muito pouco ou nada apoiados.

Em países como Brasil, EUA, França e México, as mulheres relataram maior necessidade de apoio nos 30 dias anteriores a pesquisa. No Brasil, foram elas as mais propensas a procurar ajuda de amigos e família, e quase 50% recorreram às redes sociais em busca de suporte.

 

 

Os impactos da solidão e a comunidade como saída

Para entender melhor a natureza do problema, é preciso diferenciar dois conceitos: solitude e solidão. O primeiro se refere ao prazer em desfrutar de um tempo a sós, um tipo de isolamento voluntário que não carrega a conotação negativa nem tem relação com a sensação de tristeza e desconexão.

No caso da solidão, uma pessoa pode circular entre ambientes sociais e ainda assim se sentir solitária, porque o sentimento está associado à desesperança e falta de apoio, a um não pertencimento.

Paulo Afonso Sandy Júnior explica que os primeiros impactos negativos avaliados em pessoas solitárias se mostram na esfera afetiva. “A pessoa se sente só, desamparada e começamos a observar as alterações de humor, psicológicas, que podem se expandir para questões de ordem fisiológica”, afirma.

Segundo ele, as consequências são ainda mais evidentes quando há um isolamento e desconexão nos primeiros anos de vida e ao longo do período de envelhecimento.

Estudo mostra que solidão na velhice aumenta em 31% o risco de desenvolver demência (Foto: Reprodução / Pexels / Kampus Production )
Foto: Reprodução / Pexels / Kampus Production Estudo mostra que solidão na velhice aumenta em 31% o risco de desenvolver demência

Realidade que dona Úrsula (nome fictício) conheceu há 12 anos. Professora aposentada, ficou viúva aos 62 anos e se viu sozinha em um apartamento do bairro Montese, em Fortaleza. Os dois filhos moram no exterior e ela não tem irmãos no Ceará. A solidão, que começou como um incômodo pontual, logo se tornou um peso insuportável, levando-a a um quadro de depressão.

Sem o convívio diário da família e com poucos amigos por perto, Úrsula percebeu que precisava de uma mudança. Depois de muita reflexão, conversou com os filhos e decidiu se mudar para um lar de idosos.

A escolha inicialmente foi difícil para a família que temeu os julgamentos (por isso dona Úrsula pediu para não ser identificada). Pouco tempo depois, porém, a escolha revelou-se um alívio. No novo ambiente, além de acompanhamento médico e apoio psicológico, Úrsula recuperou a autoestima.

Instituições de longa permanência acolhem idosos pelos mais variados motivos(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Instituições de longa permanência acolhem idosos pelos mais variados motivos

Na instituição, encontrou companhia, rotina e atividades que a ajudaram a recuperar o ânimo. Hoje, diz sentir-se mais segura e acolhida.

"Algumas pessoas conseguem e até gostam de viver sozinhas. Eu não, sempre estive naquele ambiente da escola, com muita gente, muita animação. Quando fiquei sozinha depois que meu esposo se foi, pensei que fosse morrer. A diferença de fuso horário não me deixava ligar sempre pros meus filhos, e eu chegava a passar um dia todo sem conversar com ninguém, era horrível!", relata. 

"Aqui é diferente, tem sempre companhia. Os meninos cuidam da gente, mas a gente também cuida um do outro", afirma. "Por isso não gosto quando as pessoas falam que a família 'joga' a gente aqui pra morrer e ser mal cuidado. Teria morrido lá no apartamento, sozinha. Aqui me sinto lúcida, a gente tem atividades, a gente conversa, fofoca e até briga às vezes", conta entre risadas. 

Instituições de longa permanência e equipamentos públicos como a Vila Social oferecem atividades em grupo que atenua o sentimento de solidão entre os idosos(Foto: Beatriz Belchior - Ascom Sedih)
Foto: Beatriz Belchior - Ascom Sedih Instituições de longa permanência e equipamentos públicos como a Vila Social oferecem atividades em grupo que atenua o sentimento de solidão entre os idosos

A chave para driblar a morbidez da solidão está na vida em comunidade, como revela um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais. Os pesquisadores buscaram associar as características da família com a solidão em brasileiros com 50 anos ou mais.

Os resultados mostraram que os adultos mais velhos que tinham um cônjuge (marido ou esposa), morando junto ou não, se sentiam menos solitários do que aqueles que não. Além disso, quando as pessoas mais velhas já se sentem sozinhas, viver com o cônjuge contribui para que o nível de solidão seja menor.  Da mesma forma, ter filhos morando perto também está ligado a um menor nível de solidão entre o público estudado. 

“A socialização é um elemento essencial para o bem-estar geral, especialmente na população idosa", aponta o gerontologista Paulo Afonso Sandy. 

 

Paulo Afonso (esquerda) estudou mais de 10 mil pessoas em 70 localidades do Brasil e as relações entre envelhecimento e solidão(Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Paulo Afonso (esquerda) estudou mais de 10 mil pessoas em 70 localidades do Brasil e as relações entre envelhecimento e solidão

Segundo ele, a promoção da socialização e a participação em atividades em grupo tornam-se intervenções importantes para mitigar esses riscos. “Aulas de dança, grupos de leitura e oficinas de arte, atividade física e a aprendizagem contínua são fundamentais para a manutenção da saúde. Além disso, a prática de atividades físicas em ambientes sociais pode resultar em melhorias significativas na mobilidade e na saúde geral dos idosos”, explica. 

As recomendações, no entanto, valem para todas as idades. A saúde social é parte da nossa construção como indivíduos que formam um coletivo e, portanto, reflete em vários aspectos da vida.

“É a partir das relações que podemos ser reconhecidos, amados, receber apoio quando necessário, aprender uns com os outros, rir, e isso tudo faz parte das nossas necessidades psicológicas.

Na famosa pirâmide de necessidades de Maslow, "A pirâmide de necessidades de Maslow é uma teoria psicológica que classifica as necessidades humanas em cinco níveis hierárquicos, sendo as sociais o terceiro nível"  é possível ver que a gente precisa de pessoas, de relações para suprir quase tudo que a gente necessita – respeito dos outros e aos outros, confiança, segurança, intimidade, relacionamentos amorosos, familiares, enfim”, finaliza o médico.

Sejam jovens ou idosos, estar com pessoas, seja física ou virtualmente, para conversar, rir, trocar experiências, ir para festas, frequentar lugares com outras pessoas, ajudar em projetos sociais,
realizar encontros entre família, telefonemas, mensagens, tudo é válido. O importante é estar com os outros, criar e manter esses vínculos sociais.  

 

 

 >>Ponto de Vista

"No final, somos salvos pelo amor dos nossos amigos”

Por Mateus Mota*

Nesta reportagem, falar sobre solidão foi mais difícil do que eu estava esperando. Fui, sem esperar, confrontado com as lembranças das dores que precisamos enfrentamos sozinhos pois no dia seguinte ao início da apuração, recebi a notícia do falecimento de um colega muito querido.

Numa coincidência mórbida, na mesma semana, completaram quatro anos da passagem de um amigo muito amado. Os dois, João Neto e Jefferson, tinham a mesma idade e lutavam contra a mesma doença quando desencarnaram.

Mateus Mota é jornalista e repórter do O POVO +  . ParaTodosVerem: Mateus é um homem pardo, de cabelos pretos e curtos, usa uma barba e bigodes também curtos e pretos, e está usando uma camiseta polo na cor vinho(Foto: Acervo Pessoal)
Foto: Acervo Pessoal Mateus Mota é jornalista e repórter do O POVO + . ParaTodosVerem: Mateus é um homem pardo, de cabelos pretos e curtos, usa uma barba e bigodes também curtos e pretos, e está usando uma camiseta polo na cor vinho

Quando Jeff partiu, estávamos em um momento crítico da Pandemia, e não pude ir à Acarape prestar minhas últimas homenagens. Isolamento total. Então, a distância, tentamos compartilhar daquele luto e ficar com as boas memórias, mas foi difícil.

Foi ali que percebi o quanto uma mensagem, uma videochamada, uma mensagem de áudio, por mais que ajudem, não substituem o calor de um abraço, o olho no olho, o aperto de mão e o ombro amigo.

Ombro amigo, aliás, não é só uma expressão. Estamos falando do ombro mesmo, abaixo do pescoço. Porque, sim, é preciso ter onde apoiar a testa enquanto as lágrimas rolam. É preciso ter onde pôr a mão, enquanto a cabeça inclina para trás em uma risada barulhenta. É preciso ter onde apertar quando as palavras não bastam e o olhar diz tudo.

E não há duvidas de que a solidão é um sentimento complexo. Muitas vezes me senti sozinho mesmo estando em ambientes lotados e cercado por pessoas muito queridas. Para nós, introvertidos e observadores, estar sozinho é uma forma de refúgio e proteção. Mas nem todo molusco fechado na própria concha consegue produzir uma pérola.

Por vezes, o isolamento parece uma boa ideia e um lugar de paz, mas a linha entre o sossego e o desamparo pode ser tênue. Fiquei pensando que a solidão vem, também, do medo de encarar o mundo.

Mas a verdade é que não há como enfrentar a vida sozinho, do momento que nascemos ao momento que partimos, somos movidos, influenciados, confrontados e confortados por outros. E esse movimento é o que faz o viver uma experiência coletiva por excelência. 

Coletividade, aliás, era uma palavra que fazia parte da vida do João Neto, que foi meu colega na faculdade e uma das pessoas mais barulhentas e divertidas que conheci. Ele partiu e deixou um silêncio difícil de entender. Mas em um dos seus últimos atos de generosidade para com a comunidade que fazia parte, deixou uma frase que acho ser merecedora de toda a repercussão do mundo.

Por isso, a todos vocês, leitoras e leitores, faço um pedido: pare um pouco. Respire. Olhe ao redor. Perceba. Escute. Esteja presente. Às vezes o tempo é curto, eu sei. Mas como disse João Neto, “No final, somos salvos pelo amor dos nossos amigos”.

*Mateus Mota é repórter do O POVO+

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