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Meio Ambiente: O que estamos fazendo com nossas cidades e nosso planeta?
Reportagem Seriada

Meio Ambiente: O que estamos fazendo com nossas cidades e nosso planeta?

No primeiro episódio da série "Meio Ambiente, cidades e pessoas" especialistas conjugam que problemas socioambientais enfrentados atualmente são críticos e urgentes. E que é preciso maior conscientização e ação por parte da população, dos governos e das empresas para cenário de degradação dos recursos naturais mudar
Episódio 1

Meio Ambiente: O que estamos fazendo com nossas cidades e nosso planeta?

No primeiro episódio da série "Meio Ambiente, cidades e pessoas" especialistas conjugam que problemas socioambientais enfrentados atualmente são críticos e urgentes. E que é preciso maior conscientização e ação por parte da população, dos governos e das empresas para cenário de degradação dos recursos naturais mudar
Episódio 1
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Os termômetros não mentem. Os desastrem ambientais, como as chuvas no Rio Grande do Sul, o desmatamento na Amazônia, as queimadas no Pantanal e a extinção de faunas e floras, também não.

Mas é só quando falta água potável ou rede de esgoto, ou quando ocorre um apagão nas hidrelétricas que as pessoas se conscientizam que vivem em um mesmo ecossistema e tudo está interligado.

Tivemos, em 2023, o ano mais quente no mundo, segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o Brasil acompanhou tal fato, em sua série histórica, como apontou o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

Em novembro do ano passado, o planeta bateu pela 1ª vez a média global de temperatura: ultrapassou os 2°C de anomalia e atingiu 2,07°C acima dos níveis pré-industriais, datados de 1850 a 1900.

Compare as mudanças climáticas ano a ano

Pode-se incluir nesta longa lista de mudanças nos últimos séculos o consumo desenfreado, a produção irresponsável poluindo o ar e as águas, a desinformação sobre temas como economia circular, logística reversa, separação dos resíduos, e a formação de lixos e aterros, especialmente nos grandes centros.

Diante desse cenário, a professora do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB), Mercedes Bustamante, avalia que estamos em um momento crítico para encaminhar a inflexão da curva de degradação ambiental que afeta diretamente a qualidade de vida das pessoas nas cidades.

“Como infraestruturas construídas, precisamos repensar nossas cidades para minimizar impactos, mas também para torná-las mais resilientes aos novos climas”, alerta a docente, que acredita que é preciso atuar em frentes para aumentar a conscientização da população e das empresas sobre a crise ambiental.

Incêndio no Parque Ecológico do Cocó no início de 2024(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Incêndio no Parque Ecológico do Cocó no início de 2024

Para ela, é preciso trabalhar a educação e a conscientização, os incentivos positivos para que haja adesão às soluções corretas e, ainda, as ações de fiscalização e controle com base em legislações que protejam o meio ambiente e a segurança da população.

A ideia também é defendida pela CEO da HL Soluções Ambientais e Econexões, Laiz Hérida, que diz ser preciso que fique claro que todos, pessoas e empresas, estão inseridos dentro do problema.

“Não existe fora. Estamos em um único planeta, no qual os aspectos ambientais inerentes a qualquer atividade econômica, de alguma forma, gerarão impactos ambientais. Não há mais espaço para o negacionismo climático. Por isso, a conscientização de que os hábitos de consumo, as decisões e ações praticadas influenciam nas mudanças climáticas e podem fazer a diferença para um contexto mais abrangente”, analisa.

Clique para ver os maiores índices de queimadas por áreas acumuladas entre 1985 a 2022

 

Laiz ainda pontua que, infelizmente, o cenário concernente às mudanças climáticas não é mais uma percepção de futuro, é realidade. Tudo sendo percebido ou sentido no dia a dia de todos por eventos extremos como elevadas temperaturas, chuvas torrenciais, terremotos.

Ou mesmo com a ausência de chuvas, ocasionando severas secas e frios extremos, os quais vêm ocorrendo em vários continentes simultaneamente e com uma certa frequência.

Ela observa que esse contexto fica mais difícil ainda para as classes sociais mais vulneráveis, que não possuem ventilador, alimentos, acesso à água potável ou até mesmo uma moradia, ficando mais evidente que combater a crise climática exige um compromisso com os aspectos socioeconômicos.

Veja o número de alertas de desmatamentos no Brasil

“Desacelerar o aquecimento global implica não apenas agir nos sintomas visíveis da crise climática, mas também fazer mudanças profundas nas estruturas sociais e econômicas, não deixando de reconhecer que a justiça social é inseparável da justiça ambiental, construindo, assim, uma transição energética justa”, orienta.

A especialista constata que nas últimas décadas, há uma necessidade intensa e constante da busca pelo desenvolvimento, mas qual e como seria de fato esse desenvolvimento? O prefixo "des", na língua portuguesa, tem um significado de negação, separação.

A CEO chama para a reflexão sobre "até que ponto estamos definindo e executando estratégias visando a manutenção da conexão entre o meio ambiente e as necessidades das pessoas, principalmente na expansão urbana?"

População joga lixo nas ruas e avenidas de forma desordenada prejudicando o meio ambiente e a saúde das pessoas(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR População joga lixo nas ruas e avenidas de forma desordenada prejudicando o meio ambiente e a saúde das pessoas

E constata que a busca por produtos e serviços que tragam ou fortaleçam as características do natural, orgânico, renovável e verde estão crescendo de forma significativa, provocando um envolvimento.

"Ou seja, uma conexão na qual está o redirecionamento do mercado para uma nova economia, voltada para o capitalismo de stackholders e que eu avalio e busco gerar impacto positivo na cadeia produtiva e de consumo, e não apenas lucro econômico”, finaliza.

O fundador do Coletivo Socioambiental Nossa Iracema e sócio da Verdear Eventos + Sustentáveis, Andre Comaru, também assente que a relação com o meio ambiente é complexa e urgente.

E reconhece que houve uma evolução significativa na conscientização sobre os desafios ambientais que enfrentamos devido ao impacto humano.

Lixo prejudica a balneabilidade na do Praia do Futuro, em Fortaleza, no Ceará(Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Lixo prejudica a balneabilidade na do Praia do Futuro, em Fortaleza, no Ceará

“A discussão sobre sustentabilidade, mudanças climáticas e a necessidade de práticas mais verdes têm se tornado cada vez mais presente nas esferas governamentais, empresariais e individuais. No entanto, a prática ainda está aquém do necessário. Estamos em um momento crítico em que a teoria deve ser rapidamente transformada em ação concreta. A velocidade das mudanças é insuficiente diante da gravidade”, ressalta Comaru.

E reitera que é preciso políticas governamentais mais ambiciosas, empresas comprometidas "de verdade" com a sustentabilidade e uma mobilização coletiva de cidadãos dispostos a exigir e realizar mudanças drásticas e imediatas. Ele sugere a implementação urgente de programas de educação ambiental nas escolas.

“Desde a infância, os alunos precisam aprender sobre a importância da sustentabilidade, os impactos das atividades humanas no meio ambiente e as formas de mitigação. Este conhecimento cria uma base sólida para cidadãos conscientes e responsáveis no futuro”, explica.

Catadores e associações têm papel fundamental na relação das cidades e das pessoas com o meio ambiente(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Catadores e associações têm papel fundamental na relação das cidades e das pessoas com o meio ambiente

Paralelamente, o ativista acredita que leis ambientais devem ser rigorosas e aplicadas com firmeza, especialmente para os grandes geradores de poluição e resíduos.

"O governo deve atuar com a mesma intensidade e eficácia na promoção da educação ambiental e afins, como fez com a lei seca e o uso do cinto de segurança. Campanhas massivas e contínuas podem alterar comportamentos de forma significativa”, defende.

Além disso, argumenta que governos devem entender que suas políticas e ações têm um impacto direto no meio ambiente e precisam liderar pelo exemplo.

Casas do bairro Granja Lisboa jogam dejetos sanitários diretamente no Rio Maranguapinho(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Casas do bairro Granja Lisboa jogam dejetos sanitários diretamente no Rio Maranguapinho

E que a mobilização social é fundamental nesse processo. Organizações não governamentais, movimentos sociais e comunidades locais têm um papel vital na conscientização e na pressão por mudanças.

"A mobilização social pode criar um movimento de base forte, exigindo ações mais decisivas de governos e empresas. A transformação necessária para enfrentar as crises socioambientais exige um esforço conjunto e coordenado. A combinação de educação, legislação, comunicação e inovação pode criar um ambiente propício para mudanças significativas. É uma corrida contra o tempo, e a urgência de nossas ações determinará o futuro do nosso planeta", adverte.

 

 

Lixo transformado em fonte de renda e qualidade de vida

Francinete Cabral, mais conhecida como Dona Nete, chegou aos 80 anos, mas não quer saber de parar de trabalhar e vai diariamente à sede da Sociedade Comunitária De Reciclagem De Resíduos Sólidos Do Pirambú (Socrelp).

Partiu dela a mobilização no bairro, na época do Sanear, quando chegou o esgotamento sanitário na comunidade, para a criação da associação. Tudo começou após a sua participar como ouvinte em um curso de educação ambiental.

Ela recorda-se que na época, há 30 anos, as pessoas no Pirambu falavam apenas lixo e não resíduos e, também, não entendiam o impacto do que descartavam no meio ambiente. Após muita luta, resistência e mobilização, Dona Nete e outras pessoas tornaram realidade o projeto e mudaram as vidas de suas famílias e do bairro todo.

Dona Nete, 80, é pioneira quando o tema é reciclagem. Junto com outras pessoas do bairro Pirambú, em Fortaleza, criou a Socrelp há 30 anos(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Dona Nete, 80, é pioneira quando o tema é reciclagem. Junto com outras pessoas do bairro Pirambú, em Fortaleza, criou a Socrelp há 30 anos

Hoje, a entidade carrega a chancela de ser a associação de catadores mais antiga de Fortaleza e está em pleno funcionamento desde 1994, atuando diretamente para uma cidade mais sustentável. E também é uma das primeiras a trabalhar com a coleta seletiva no Brasil.

“Com nosso trabalho, a qualidade de vida das pessoas melhorou muito. As crianças daqui eram cheias de feridas e ‘bucho’ grande, tinham verminose. Com a associação melhoramos a saúde, possibilitamos renda e melhoramos a vida de todos”, afirma.

Apesar de ter cedido a presidência para a filha, Janete Alves, 55, segue na lida diária, triando materiais, com seu caderninho a tira colo e anotando tudo na nova sede que inaugurou no ano passado.

Saiba quais são os tipos de resíduos e lixos

O espaço tem cerca de 315 m² de área foi construído de forma funcional, o que permitiu o aumento da capacidade de recebimento de materiais recicláveis. Em média, a Socrelp movimenta por mês entre 40 mil e 45 mil de reciclados, que incluem papel, papelão, plásticos, ferro, alumínio, óleo de cozinha usado e aparelhos eletroeletrônico.

Cada catador recebe, em média, por dia, R$ 35, mas Dona Nete quer mais e está buscando soluções para fornecer uma vida mais digna a todos. Espera poder pagar um salário-mínimo para os 16 que atuam com ela. Além da filha, ela conta com a colaboração de um irmão e de outros filhos, que nas horas vagas ajudam no galpão.

Sua longa experiência no trato com os materiais deram um conhecimento acima da média da população sobre resíduos, reciclados, descarte e lixo. “O meu trabalho hoje com o lixo é uma fonte de renda, evita doenças e deixa a cidade mais limpa e bonita, apesar de precisarmos do apoio da prefeitura”, diz. E defender que tudo começa pela escola.

A sede da Socrelp é no bairro do Pirambú, em Fortaleza. Mensalmente manipulam entre 40 mil e 45 mil materias descartados que seguem para reciclagem(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR A sede da Socrelp é no bairro do Pirambú, em Fortaleza. Mensalmente manipulam entre 40 mil e 45 mil materias descartados que seguem para reciclagem


“As crianças, principalmente, quando são ensinadas elas não esquecem. Sempre faço oficinas de reciclagens nas escolas, nas empresas e nos condomínios, ensinando a seleção dos resíduos”, conta.

Janete é só orgulho da matriarca e do que ela lhe ensinou.

“A mãe é muito respeitada pelo trabalho que já fez e faz. Procurou sempre participar de cursos ou eventos sobre reciclagem e já recebeu premiações. Hoje, temos transporte próprio e não dependemos de ninguém para pagar as despesas da Socrelp”, emociona-se.

 

 

Reciclagem conscientizando gerações

Outro caso de quem visualizou o poder econômico nos resíduos é Cícero Souza, 51, que representou a associação Raio de Sol de 2010 a 2021. Ele se tornou catador em 1987, quando conheceu seu pai, então aos 16 anos.

Seu pai trabalhava com reciclagem e a venda de papelão do mercantil Romcy e para o Mercado São Sebastião. Mais de quatro décadas depois, Cícero estimula as filhas, Maria Eduarda, de 8 anos, e Maria Yara, 7, sobre os cuidados com os resíduos.

"Elas são verdadeiras ambientalistas, quando vamos à praia elas querem juntar tudo na areia. Elas já sabem onde fica o cesto de rejeito e da reciclagem", orgulha-se de ter passado sua missão para a nova geração.

Cícero Souza, 51, se tornou catador aos 16 anos ao conhecer o pai biológico que trabalhava na função. Hoje, ensina para as duas filhas pequenas o cuidado com o meio ambiente(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Cícero Souza, 51, se tornou catador aos 16 anos ao conhecer o pai biológico que trabalhava na função. Hoje, ensina para as duas filhas pequenas o cuidado com o meio ambiente

Hoje, ele mantém a atividade de catador como representante do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) e é presidente da Rede dos Catadores de Resíduos Sólidos Recicláveis do Estado do Ceará, mas vê dificuldades na pauta.

“Ainda vejo que a sociedade e algumas gestões publicas tratam com descaso as questões ambientais, existe uma problemática que não se adapta que é a coleta seletiva. Só assim poderemos resolver o destino dos resíduos sólidos na cadeia da reciclagem”, pontua.

Existem em torno de 800 catadores em grupos e associações e, na visão de Souza, com a coleta seletiva seria possível a inclusão e a contratação dos catadores. O que serviria para melhorar a cidade, os bueiros, as galerias, os rios e as lagoas, pois seriam tratadas sem a presença de descarte incorreto.

A Associação Raio de Sol recicla diversos materiais como papelão, plástico, garrafas pet. E tem contratos com iniciativa privada e pública(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR A Associação Raio de Sol recicla diversos materiais como papelão, plástico, garrafas pet. E tem contratos com iniciativa privada e pública

No Ceará, ele diz que seguem o Decreto 5.940 de Coleta Seletiva em órgãos públicos, que institui a separação dos resíduos recicláveis descartados na fonte geradora e a sua destinação às associações e cooperativas dos catadores de materiais recicláveis.

Já em Fortaleza ele afirma existir leis para pequenos e grandes geradores de resíduos, “mas não tem fiscalização e nem acessibilidade na logística sobre consumo e descarte”.

Hoje, Raio de Sol tem contratos de reciclagem e coletas com a Solar Coca-Cola e em dois Ecopontos, além de fazer coleta em condomínios e restaurantes.

Também realiza coleta seletiva com um carro que recebeu do projeto nacional Reciclar Pelo o Brasil e atua dentro de um galpão que foi cedido para Rede de Catadores pela a Prefeitura de Fortaleza.

Dicas para separar corretamente o que consome

Atualmente, a entidade comercializa em torno de 38 toneladas por mês com 27 catadores. “Com o nosso trabalho toda sociedade é beneficiada, pois muita gente se educa e tudo que é coletado por nós, toda a cadeia da reciclagem é beneficiada, assim como toda a cidade", ressalta.

Souza deixa claro a paixão pela vida e pelo caminho que trilhou com os descartes. Mas confessa se preocupar muito com a educação ambiental.

"Gostaria que as pessoas tivessem consciência sobre a gravidade de não cuidar do nosso meio ambiente, da nossa casa, da nossa terra. Seguimos sendo catadores de Norte a Sul nessa marcha sem parar. Caminhar é resistir e se unir é reciclar", defende.

 

 

Poder do esgotamento sanitário no desenvolvimento social

A empresária e moradora da Granja Lisboa, Kelly Ramos, 44, sonha há anos que a rede de esgotamento sanitário chegue até sua casa, com quem vive com os filhos e o marido. Está há 15 anos no local e já teve problemas em função da ausência de uma estrutura de saneamento adequada na comunidade.

Chegou a deixar seu lar, quando seu filho mais velho tinha nove anos. Enquanto brincava de bola na rua com os amigos, apresentou problemas de inchaços nos pés, devido à falta de higiene nas vias públicas.

Kelly Ramos, 44, é empresária e moradora da Granja Lisboa, onde está sendo feito o esgotamento sanitário(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Kelly Ramos, 44, é empresária e moradora da Granja Lisboa, onde está sendo feito o esgotamento sanitário

“Só voltei após o calçamento. Hoje temos fossa (escavação em que são despejados e acumulados dejetos de casas não servidas por rede de esgoto), mas as pessoas ainda jogam água suja na rua. Ter saneamento é um benefício maravilhoso porque tira toda essa mazela que está no meio da rua, que as pessoas jogam, porque não têm condição de fazer uma fossa”, diz.

Ela enfatiza que, assim como ela, os vizinhos estão aguardando para aderir aos novo sistema de esgotamento sanitário para que os netos e outras crianças possam brincar despreocupados. A empresária sabe que a utilização de fossas não é o ideal pois acaba contaminando o solo e toda a comunidade.

No Ceará, entre 2005 e 2021, exatas 594 mil pessoas passaram a ter acesso ao serviço de abastecimento de água tratada e quase 1 milhão de pessoas conseguiram acesso ao serviço de coleta de esgoto em suas residências, aponta o estudo Benefícios Econômicos da Expansão do Saneamento no Ceará, da Trata Brasil.

Há 16 anos, a rede de distribuição de água cearense tinha 9,6 mil quilômetros de extensão e passou para 22,3 mil quilômetros em 2021, um crescimento de 5,4%. 

 

Confira os benefícios do saneamento no Ceará

Já a rede de coleta de esgoto, por sua vez, passou de 3,5 mil quilômetros, em 2005, para 6,7 mil quilômetros em 2021, apresentando um crescimento de 4,1% ao ano. 

Em relação ao volume de água consumida o aumento foi de 2% ao ano, indo de 200,2 milhões de m³ em 2005 para 272,7 milhões de m³ em 2021. Em termos per capita, o volume consumido de água passou de 24,7 m³ por habitante para 29,5 m³ por habitante ao longo desse período, crescimento de 1,1%.

Outro exemplo de quem aguarda os benefícios do saneamento é a costureira Elisângela do Nascimento, 42, moradora da Granja Lisboa há 21 anos, que conta que quando se mudou só tinha a casa dela e mais uma na rua.

Em 10 anos, em 24 municípios cearenses, a Ambiental Ceará e a Cagece têm a missão de proporcionar que nove casas a cada 10 tenham esgotamento sanitário(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Em 10 anos, em 24 municípios cearenses, a Ambiental Ceará e a Cagece têm a missão de proporcionar que nove casas a cada 10 tenham esgotamento sanitário

“Era tudo mato, não tinha água nem nada aqui. Hoje, temos a fossa que recebe o que usamos no banheiro e a água da chuva que vai para fora por um cano. Fica tudo no meio da rua e nas portas das casas”, conta.

A expectativa com a chegada da obra de saneamento e esgotamento é grande. “Porque a água no meio da rua atrai doença, rato, barata, essas coisas e com o saneamento não vai ter mais. Não vejo a hora, mesmo sabendo que a conta vai aumentar um pouco”, diz.

Analisa-se, em todo o mundo, e o Brasil e o Ceará seguem a tendência, que as cidades se tornem cada vez maiores e mais populosas, segundo comenta o diretor-presidente da Ambiental Ceará, André Facó.

E isso tem um impacto direto nas cidades, pois um planejamento urbano inadequado interfere tanto no meio ambiente como na qualidade de vida das pessoas.

Um das primeiras moradoras da Granja Lisboa, Elisângela Lima do Nascimento, 42, costureira, aguarda as melhorias sanitárias no bairro(Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Um das primeiras moradoras da Granja Lisboa, Elisângela Lima do Nascimento, 42, costureira, aguarda as melhorias sanitárias no bairro

“Boa parte dos problemas de saneamento, pensando em abastecimento de água, esgotamento sanitário e drenagem, vem exatamente pela ocupação inadequada de áreas que não poderiam ter residências. Vemos a ocupação de margens de rio, até aqui mesmo em Fortaleza, que inviabiliza muitas vezes ter estruturas de drenagem ou propriamente infraestrutura de esgotamento sanitário”, aponta.

Segundo ele, essa ocupação inadequada gera problemas para as pessoas e impacta também no meio ambiente. Por isso, é necessário tanto um planejamento urbano, mas também o consenso das pessoas de que essas ações vão afetar diretamente não somente elas, mas os vizinhos também.

Para Facó, o desafio do saneamento, nas suas quatro vertentes - abastecimento de água, esgotamento sanitário, drenagem pluvial e a parte de resíduos sólidos - é tornar essa invisibilidade visível.
Diferentemente de um abastecimento de água, telefonia, eletricidade, que está ligado ao indivíduo, o esgotamento sanitário interfere em tudo.

Siga os 5 passos do caminho do esgoto

“A pessoa está jogando seus dejetos de forma inadequada na rua, no rio ou mesmo numa fossa, mas vai ocasionar problemas para todo o entorno da casa onde a pessoa mora”, convida a reflexão.

Tratar os dejetos antes deles voltarem para o meio ambiente é o que vai garantir a sua saúde de forma mais direta, por meio, exatamente da sua proteção contra doenças e de transmissão hídrica complementa o executivo.

“Isso vai garantir impacto na Educação e na produtividade do trabalhador, que não vai mais se afastar por conta de doenças. E, também, a melhoria da economia e do turismo, que precisam ter o meio ambiente preservado. Essa invisibilidade impacta muito naquela definição de uma sociedade mais justa, próspera e saudável”, destaca.

Facó finaliza dizendo que o grande desafio é, realmente, conscientizar todos dessa importância e tirar essa invisibilidade de um setor que impacta na vida de todo mundo.

O desafio da parceria público privada entre Ambiental Ceará e Cagece é que, em 10 anos, a cada dez casas, nove tenham à disposição o sistema público de esgotamento sanitário.

Confira os números do sanamento no Brasil

Isso requer, apenas em 25 cidades do Ceará, um investimento da ordem de R$ 15 bilhões. Já em todo o Brasil a cifra sobe para R$ 900 bilhões para que se tenha implantação dessas infraestruturas em vários estados.

“Além do aporte financeiro é preciso conscientização e novo aculturamento para se entender o esgotamento sanitário como um dever de coletividade. Para tratar os dejetos de forma adequada pra preservar o meio ambiente, mas principalmente preservar a vida. E impactar de forma substancial, não simplesmente na melhoria da qualidade de vida, mas para tornar uma sociedade que seja efetivamente desenvolvida”, finaliza. 

 

Novos modelos de urbanização

Localizada no município de Cruz, litoral cearense, a praia do Preá foi o ponto escolhido pelo Grupo Carnaúba para construção de um novo destino que mescla um perfil turístico e residencial com empreendimentos de grande porte que irão mudar a realidade do vilarejo, originalmente uma vila de pescadores.

O projeto, que terá sua primira fase entregue no mês que vem, engloba um condomínio de alto padrão, o Vila Carnaúba, e o hotel seis estrelas Anantara Preá, um clube com hospedagem, Carnaúba Wind House, e moradias para todos os níveis de renda, distribuídos em quase 1,5 mil hectares.

Segundo a diretora de Produto e Impacto do Grupo Carnaúba, Alexia Bergallo, todo o objetivo desse plano urbanístico foi o desenvolvimento ordenado e respeitoso de um recorte que tem a escala e complexidade de uma pequena cidade.

Vista aérea do empreendimento criado pelo Grupo Carnaúba que será lançado em julho de 2024(Foto: Divulgação Grupo Carnaúba)
Foto: Divulgação Grupo Carnaúba Vista aérea do empreendimento criado pelo Grupo Carnaúba que será lançado em julho de 2024

“Pensamos desde o início no papel de cada empreendimento em relação ao entorno. Na mobilidade do pedestre e nas áreas coletivas, criando mecanismos que desincentivem o uso de veículos. Não permitimos uso de veículos a combustão para evitar a poluição sonora e iluminamos minimamente as áreas de uso coletivo para preservar o céu”, diz.

O desejo é que isso possa ser ampliado a escala urbana, para que se crie um estilo de vida equilibrado e ligado à natureza, diz a executiva. Do ponto de vista de pessoas, a principal preocupação são as ações  que potencializassem o impacto social positivo para a região.

Como por exemplo, o uso da mão de obra local, com um projeto de educação profissionalizante em parceria com a Federação das Indústrias do Ceará (Fiec). Foram capacitados 100 alunos durante a construção e fase incial. A previsão é formar 1.315 alunos, beneficiando diretamente 12% da população total do Preá, Barrinha e Castelhano. Cerca de 3.945 pessoas já foram beneficiadas indiretamente.

O Grupo Carnaúba fez estudos na Praia do Preá e no seu entorno para criar um projeto que suportasse o aumento de resíduos produzidos pelos equipamentos que está instalando no local e da comunidade(Foto: Nicolas Leiva/Divulgação Grupo Carnaúba)
Foto: Nicolas Leiva/Divulgação Grupo Carnaúba O Grupo Carnaúba fez estudos na Praia do Preá e no seu entorno para criar um projeto que suportasse o aumento de resíduos produzidos pelos equipamentos que está instalando no local e da comunidade

Outra interseção foi a valorização da cultura local com a gastronomia, a arte e o artesanato, criando parcerias com artesãos locais para também fomentar a economia. Em relação aos resíduos, a empresa tem desenvolvido e implementado, junto a parceiros especializados, planos internos dentro de cada empreendimento para realizar a gestão e o monitoramento de resíduos sólidos.

“O plano é ordenar os resíduos sólidos tanto na fase de construção, quanto na de operação, de maneira a estruturar processos e equipes internas, implementar ações e infraestruturas adequadas, para então coletar, armazenar e destinar corretamente os resíduos”, esmiuça.

A ideia é o aproveitamento máximo dos materiais recicláveis, a redução de rejeitos, que iriam para aterros sanitários, e a compostagem de materiais orgânicos, como podas, folhagens e também alimentos.

A empresa, junto com a Cooperativa de Trabalho dos Profissionais de Coleta Seletiva e Reaproveitamento de Materiais Recicláveis do Baixo Acaraú (Coopbravo) e a comunidade local, desenvolveu e implementou projetos de gestão de resíduos sólidos nas localidades mais próximas.

A empresa criou uma parceria com a prefeitura de Acaraú e associações parceiras para fazer o destino correto dos resídos produzidos no Preá(Foto: Nicolas Leiva/ Divulgação Grupo Carnaúba)
Foto: Nicolas Leiva/ Divulgação Grupo Carnaúba A empresa criou uma parceria com a prefeitura de Acaraú e associações parceiras para fazer o destino correto dos resídos produzidos no Preá

Ronaldo Rocha, 32, mora na comunidade de Cavalo Branco, em Cruz, desde 2004 e, atualmente, é presidente da Coopbravo, diz que a parceria com o Grupo Carnaúba é de extrema importância para a comunidade pois foca na coleta e destinação de resíduos urbanos, desempenhando um papel vital na geração de renda e desenvolvimento humano através da reciclagem e educação ambiental.

"Um exemplo é o “Mais Vida Menos Lixo” que não apenas promove a reciclagem e a transformação de resíduos em recursos para os catadores, mas também envolve ativamente membros da comunidade, pequenos negócios locais e autoridades públicas. Essa colaboração cria uma rede de colaboração e conscientização ambiental, resultando em uma gestão mais eficiente dos resíduos sólidos e na melhoria da qualidade de vida dos residentes locais", explica.

O projeto Mais Vida Menos Lixo, iniciado em 2022, na Barrinha, em Acaraú, é um exemplo. O programa já registrou 20% de recuperação de resíduos, o dobro da média nacional de 9%, segundo o Sistema Nacional de Resíduos Sólidos (SNIR).

Também agiu em 18 toneladas de resíduos recicláveis descartadas da maneira correta no município da Barrinha de Baixo e contou com a adesão de 97% da comunidade local. A parceria seguem este ao longo deste ano.

Outro em operação é o Recicla Preá, que consiste na coleta dos recicláveis e educação ambiental nos empreendimentos com o potencial gerador de resíduos acima de 100 litros por dia. E, atualmente, em uma área piloto, estão realizando o ordenamento e gerenciamento de resíduos no Preá.

O Viveiro do Vila Carnaúba realizou o trabalho de identificação e catalogação das espécies nativas para preservar e regenerar a flora local(Foto: Ricardo Braz/ Divulgação Grupo Carnaúba)
Foto: Ricardo Braz/ Divulgação Grupo Carnaúba O Viveiro do Vila Carnaúba realizou o trabalho de identificação e catalogação das espécies nativas para preservar e regenerar a flora local

A iniciativa conta com apoio dos movimentos locais, poder público, Coopbravo e iniciativa privada com previsão de ser implementado no próximo semestre. Entre 2022 e junho de 2023 foram investidos mais de R$ 2 milhões em projetos sociais e de impacto. 

Em relação ao saneamento e rede de esgoto, criaram sistemas próprios para não sobrecarregar os sistemas locais, o que inclui uma estação de tratamento de efluentes, que utiliza membranas semipermeáveis para filtrar e remover contaminantes da água.

Assim como a criação da Casa de Sal, onde realizam a eletrólise do sal grosso e produzem o hipoclorito. “Este, por ser um recurso abundante, permite com que não tenhamos dependência do armazenamento de produtos químicos perigosos, reduzindo também a necessidade de frete e de embalagens, o que contribui para uma menor emissão de CO2 e de geração de resíduos", explica Alexia.

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