Estamos falando de um motim policial de dez anos atrás no Ceará. Absurdo sob qualquer hipótese, seja pela ilegalidade ou como os fatos se deram para a vida do cidadão. Já faz algum tempo, mas o tema-problema só se agravou desde então — como vimos em 2020, alguns dias antes da pandemia desabar em nosso cotidiano. E tudo que se sucedeu com esse caso lá de 2012, como bem disse à época o promotor de Justiça Militar estadual, Joathan de Castro, abriu precedentes para situações piores.
"Foi violento. Foi muito mais um motim do que uma greve e envolveu práticas criminosas", analisou o promotor já em 2013 — um ano depois —, quando comentava a proposta de anistia aos amotinados articulada via projeto de lei pelos parlamentares da ocasião. Ali costuravam um acerto para perdoar a quem não cumpriu o serviço essencial de garantir segurança pública. Joathan de Castro alertou: "Isso abre um precedente gravíssimo".
"Foi violento. Foi muito mais um motim do que uma greve e envolveu práticas criminosas"
Até lembro de um momento mais tenso ainda, no motim anterior, de julho de 1997, quando o então comandante da PMCE, coronel Mauro Benevides, foi baleado em frente ao Palácio da Abolição - ao que consta, a bala teria partido da arma de um dos grevistas. Sua vida teve a sorte de a bala seguir para o ombro e não para o coração ou outro órgão vital.
E o que houve então em 2020, seguindo a previsão dada pelo promotor? Os insurretos, só para usar uma palavra mais rebuscada e não menos grave, agiram à margem da lei. Aqui nem é uma opinião, mas a descrição fiel dos acontecimentos: tiraram as fardas e seguiram com as pistolas na cintura, cobriram o rosto com balaclavas, subiram em viaturas (no capô ou nas portas) e esvaziaram seus pneus, mandaram que os comerciantes fechassem seus estabelecimentos, usaram quartel como acampamento para familiares e como um QG do motim, para o movimento discutir percentuais de ganhos salariais e seus futuros perdões pelos atos. Não pareceu ser somente indisciplina.
No caso das culpas, essas vêm sendo cobradas com algumas expulsões e uma CPI está mexendo no baú que patrocinou o motim mais recente. Estão usando uma regra básica de investigação - "siga o dinheiro" - para saber quem bancou a história toda.
Dos bastidores de 2012, consta que restaram pouquíssimos oficiais de alta patente que não se abraçaram ao levante naqueles dias. Disse uma fonte que viveu aquele ambiente de perto: "dava para contar nos dedos de uma mão" os que seguiram fiéis ao então governador Cid Gomes. Até gente da Casa Militar teria abandonado o barco e recuado em seguida. Fora um réveillon sem ter de fato a que brindar. Hoje se sabe que aquela anistia custou muito caro.
Deixo até a questão política, do que virá neste ano eleitoral de 2022 com a afinidade entre polícias e o atual Governo Federal, para que outros colegas comentem. Não dá para negar que aqueles momentos foram uma gênese do que está posto.
Cláudio Ribeiro - jornalista do O POVO
Análise dos levantes de policiais que ocorreram no Estado