“É.. é um dinossauro”, balbucia, sem acreditar, o doutor
Imagine esticar tanto a cabeça e até mandar o corpo um pouco para trás para conseguir observar a magnitude de um saurópode… Bom, menos o Bilbo. Abaixe um pouco a cabeça (não, um pouquinho mais); ele tem uns cinco metros de altura, algo mais parecido ao menor pônei em comparação ao maior cavalo. Esse é o nosso personagem principal.
Bilbo é uma nova espécie de titanossauro, ainda a ser descrita, escavada na
Essa descoberta, publicada na revista científica Scientific Reports, é mais uma peça para compreender o sistema respiratório dos dinossauros e as adaptações evolutivas para os saurópodes crescerem tanto.
Nas aves, os sacos aéreos são mecanismos de respiração ligados aos pulmões, transportando ar pelas cavidades dos ossos. Eles também são essenciais para eles conseguirem voar, já que ficam bem mais leves com o esqueleto pneumatizado. E é claro que tudo isso é importante quando falamos sobre dinossauros, já que as aves são dinossauros que sobreviveram às extinções em massa.
Os paleontólogos Tito Aureliano (Unicamp), líder da pesquisa, e Aline Ghilardi (UFRN) explicam que o primeiro modelo criado para o sistema respiratório dos dinossauros era comparado com os dos crocodilos e das aves. Mais tarde, analisaram-se as marcas que os tecidos moles (como os sacos aéreos) deixam nos ossos.
Isso é possível de se ver a olho nu. São buraquinhos em todo o osso, onde o músculo se agarrou ao esqueleto. O ineditismo dessa pesquisa brasileira é o uso da tomografia computadorizada para analisar os ossos por dentro, além de cortar amostras histológicas do órgão — são tiras bem finas do material. “É uma forma de dissecar”, ilustra Tito.
Essa hiperpneumatização dos saurópodes, também já vista em outros dinossauros, os tornava muito mais eficientes. No
Outra característica favorecida pela pneumatização é o gigantismo. “Perder peso é importante quando você aumenta de tamanho”, definem os paleontólogos. Imagine o braquiossauro retratado em Jurassic Park, com mais de 20 metros de altura… Se os ossos fossem densos como os dos humanos, nenhum órgão aguentaria a pressão!
“Essa é outra consequência da pesquisa, a de criar estimativas de peso mais realistas. Antes, estimavam que os saurópodes eram um Titanic andando, e isso não é verdade”, pontua Aline Ghilardi.
O que não encaixa é o seguinte: se o Bilbo é um saurópode do tamanho de um pônei, porque a pneumatização tem algo a ver com gigantismo? Afinal, Bilbo foi apelidado em alusão ao personagem Bilbo Bolseiro, hobbit de O Senhor dos Anéis, em uma brincadeira entre a equipe de pesquisadores.
De acordo com Tito Aureliano, de fato não havia a tendência dos dinossauros diminuírem durante o fim do Cretáceo. Essa espécie, então, é uma “anomalia” e a razão dela ser assim será apresentada em estudos futuros. “A pneumatização neles é uma cicatriz evolutiva”, explica Aline.
Isso porque o grupo dos saurópodes existe desde o final do período Triássico, passando pelo Jurássico e depois indo até o período Cretáceo. Ou seja, durante toda a Era Mesozóica, popularmente conhecida como era dos dinossauros. Assim, mesmo sendo pequeno comparado aos primos saurópodes, Bilbo herdou essas características evolutivas do grupo.
Ainda vamos ouvir falar muito de Bilbo, já que o paleontólogo Bruno Navarro (um dos integrantes da pesquisa) está liderando o artigo que irá descrever essa nova espécie de saurópode brasileira. Do estudo, podemos esperar mais informações sobre o que levou essa espécie a ficar tão pequena, além de descrever como era o ambiente do sudeste naquela época.
A descrição será ainda mais interessante porque foram escavados três indivíduos da mesma espécie no mesmo local. Além do Bilbo, um deles já virou notícia após a equipe liderada por Aline identificar, no osso da pata, parasitas preservados nos canais vasculares.
A descoberta foi sem querer: a princípio, os paleontólogos achavam que o animal idoso tinha algum tipo de câncer do osso. A olho nu, era possível ver estruturas parecidas com “mini couve-flores” no fóssil. Ao analisarem bem, eles concluíram que o dino tinha osteomielite, uma infecção grave nos ossos existente até hoje e que afeta humanos.
Por si só, a osteomielite já era um grande achado. Até hoje, a Medicina ainda tenta compreender como a doença se desenvolve, já que estudos para tal envolveriam retirar o osso dos pacientes. Mas com a pesquisa publicada na revista científica Cretaceous Research em 2021, foi possível acrescentar mais dados para serem investigados.
Bom, de qualquer forma, a equipe decidiu fazer também uma análise histológica do material. Foi quando eles viram estruturas mineralizadas, “como se fosse um conjunto de minerais”, relembra Aline. “Eram coisas biológicas!”. Ao que tudo aponta, a osteomielite ocorreu em conjunto com a parasitose.
Provavelmente, deve ter sido bem desconfortável para o bicho… A boa notícia é que Bilbo, até que se prove o contrário, estava saudável ao morrer.
Reportagens do O POVO exploram o universo dos fósseis do Brasil e do mundo