
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Ela sempre gostou de aniversários.
Sem pudor algum, começava a comemorar praticamente no início do mês, anunciando que todos deveriam se preparar para a grande data.
— Agora sim o ano começou! Meu aniversário está chegando, hein?
As crianças adoravam. Ela alimentava a brincadeira.
— O aniversário da rainha está chegando. O que vocês, súditos, estão preparando? Não quero saber de nada, mas me contem tudo.
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Eles riam do jeito despótico com que ela exigia reverências. Usava uma caçarola como coroa, o secador como cetro e um lençol como manto real. Sentada na espreguiçadeira, batia uma palma única e precisa:
— Servos! Dessedentem-me sem demora. Aligeirem-se!
Os pequenos corriam para o “xerife” da casa, tentando decifrar o que a rainha queria. A mais velha logo descobria: não era nada além de um suco na porta da geladeira, perto do armário de biscoitos. Entregava-o com reverência, imitando o gesto de segurar as barras de um vestido.
Depois vinham os penteados, as escovas, os elixires mágicos da juventude. O filho, cavaleiro de honra, trazia as pantufas em troca de um beijo da soberana. A corte palaciana vivia assim, entre risos e salamaleques, até o grande dia: a festa surpresa mais revelada do reino.
Ela fingia espanto com o café na cama, lia bilhetes e desenhos, admirava-se com o presente que ela mesma escolhera, e distribuía risos, abraços, beijos. Era a rainha deles.
Naquele ano, decidiram comemorar na cidade dela. Os pais ficaram radiantes. A viagem foi cansativa. Dormiram no antigo quarto: ele, no chão com o pequeno lacaio; as meninas, na cama da mãe.
Visitaram o colégio. Andaram pelos corredores. Conversaram com antigas professoras. Sim, lembravam dela. Foram até o rio. Almoçaram em um barco-restaurante. Passearam na pracinha. Respiraram o mesmo ar, sentiram o mesmo calor. Sentiram ela.
À noite, não renunciaram ao bolo e balões. Os pais providenciaram tudo, até picolés que, diziam, eram os preferidos dela e só existiam ali. Cantaram parabéns diante da foto. Na hora de apagar a vela, pararam.
Ninguém tinha pensado nisso. A ausência caiu como um peso. As meninas olhavam fixamente para a foto.
Os pais, para ele. E ele, sem saber o que fazer.
O pequeno resolveu o impasse. Soprou a vela com força e correu, brandindo a espada imaginária. Todos sabiam o pedido que tinha sido feito. Era o mesmo de todos. Apesar de impossível.
(Trecho adaptado do livro A Árvore de Pedra, do autor)
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