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O exemplo do marechal Lott
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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

O exemplo do marechal Lott

Paulo Sérgio Nogueira, comandante do Exército, teria amarelado ao não punir Pazuello ou simplesmente seguiu uma escrita de generais alinhados ao bolsonarismo?
Tipo Crônica
0606demitri (Foto: 0606demitri)
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O general voltou a me escrever, mas não me manifestei muito. Fiquei meio de saco cheio com o amarelado do comandante do Exército (um iguatuense) no episódio Pazuello.

Vi que escreveu sobre a desmoralização de não punir Pazuello pela insubordinação de participar de em um ato político ao lado de Bolsonaro. Um general da ativa e ex-ministro da Saúde do Brasil como agravantes e, ainda, o regulamento disciplinar do Exército rasgado.

Talvez, só sirva para mandar prender praças e oficiais subalternos.

Nem respondi de pronto ao general que estava com vontade de conversar. Apaguei as mensagens, como sempre me pede e faço com qualquer fonte se assim for acordado. "Conspurcação" era o adjetivo mais besta que vi por lá.

Dias antes, ele havia me mandado um artigo escrito pelo ex-bolsonarista general Rêgo Barros no Correio Braziliense. Acreditava que o general Paulo Sérgio Nogueira, atual comandante do Exército, não sucumbiria e mostraria que o alto comando não abre brecha para a polticagem e a quebra de hierarquia. Não foi assim.

Rêgo Barros, provavelmente, também tinha essa crença ao escrever sobre as Armadilhas de Tucídides e o uso "político e pessoal" do Exército por Bolsonaro.

Em um dos parágrafos, Barros pede: "Quanto ao caso do oficial-general que participou de carreata política, infringindo, em tese, a legislação disciplinar, tenhamos confiança na sobriedade temperada com firmeza de nossos comandantes".

 

Ao meu amigo general apenas escrevi que falta ao Exército, atualmente, um marechal Lott

  

Tirando o medroso "em tese", pois o ato foi flagrante e filmado em cadeia nacional, Rêgo Barros, creio eu, esperava por uma punição a Pazuello. Pelo "bem da disciplina", como cansei de ouvir na época em que passei por quartéis da Polícia Militar no Ceará.

O general do Ceará me enviou também a postagem do Santos Cruz, outro general arrependido de ter se engabelado por Bolsonaro. "Fui surpreendido com telefonemas e mensagens de dezenas de jornalistas sobre o encerramento do caso Pazuello. Sempre respondo, mesmo que seja para informar que nada tenho a dizer. Mas, ontem, não disse nada. Por vergonha".

Ao meu amigo general apenas escrevi que falta ao Exército, atualmente, um marechal Lott. Henrique Dufles Teixeira Lott, lembrei-o, era um soldado legalista, contra a tortura e absoluto pela disciplina.

Foi Lott que garantiu a posse de Juscelino Kubitscheck numa reação à corriola golpista liderada pelo general Canrobert Pereira Costa e pelo coronel Jurandyr Bizarria Mamede.

Claro que o general que me ama sabia da história de Lott. Em todo caso, enviei um artigo de Tibério Canuto sobre o assunto para refrescar a memória.

Lott puniu o golpista Bizarria que, no enterro de Canrobert, bradou que Juscelino não tomaria posse. Em frente ao túmulo de Conrobert, inventou a mentira de que Kubitscheck não teria sido eleito por maioria absoluta. Muito semelhante a conteúdos falsos produzidos pelo bolsonarismo.

Como ministro da Guerra e presente ao enterro, Lott viu falta grave cometida pelo coronel Bizarria. E fez o que tinha de fazer. Encaminhou o pedido de prisão de Bizarria a Carlos Luz, presidente da Câmara Federal e interino na presidência do Brasil.

 

Fosse um presidente ou presidenta de esquerda, diz o general que me ama, ele teria punido "Pazuello" e seria um troféu ser demitido em seguida

 

Carlos Luz, outro golpista, não puniu. Lott, para não se desmoralizar, pediu demissão do cargo de ministro. Porém, na noite do dia 10 de novembro de 1955, generais foram à casa de Lott e pediram ao marechal que esperasse.

Pelo menos para garantir a posse democrática de Juscelino, barrar o golpe e manter a disciplina no Exército. E assim, o soldado Lott fez.

Paulo Sérgio Nogueira perdeu a chance de se inspirar no marechal Lott e sucumbiu ao que pior poderia ter acontecido para o Exército. Submeter-se ao uso político pessoal e medonho de Bolsonaro.

Pode ser que Paulo Sérgio tenha sido estratégico, como defendem alguns. Optou por engolir a desmoralização. Seria, assim, um mártir às avessas.

Mesmo na chibateado publicamente, seguraria a onda e evitaria dar a Bolsonaro um pretexto para intervir no Exército e instalar uma crise que favorecesse mais ainda a vontade de, oficialmente, se declarar um ditador na base de um golpe.

O general do Ceará acha que não e diz que Paulo Sérgio não amarelou. Ele teria repetido a mesma escrita de ação de todos os generais do governo. Esqueceram que são do Exército, de Estado, e submetem o País aos absurdos do "fauno".

Fosse um presidente ou presidenta de esquerda, diz o general que me ama, ele teria punido "Pazuello" e seria um troféu ser demitido em seguida. Infelizmente, escreveu, virou um "lambibotismo azêmola".

 

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