
É doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro de contos
É doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro de contos
A publicação do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025, desvelou um quadro, no mínimo, desanimador. Segundo o documento, em 2024 o Brasil registrou 1.492 vítimas de feminicídio e 87.545 vítimas de estupro, além disso, 76,8% das vítimas eram vulneráveis e 87,7% pertencentes ao sexo feminino, este é o maior número de estupro na história do País.
O anuário trouxe duas constatações que merecem ser debatidas: a primeira é que o Brasil é, indubitavelmente, um país perigoso para mulheres; a segunda é que o lar é o lugar que oferece maior perigo para mulheres e meninas.
Os relatos de casos de estupros demonstram que não há lugar e ocasião seguros. Só para exemplificar, podemos trazer à lume o caso do anestesista condenado por estuprar uma mulher durante sua cesariana, aproveitando-se do fato de a paciente estar sedada.
O aumento dos casos de violência contra as mulheres demonstra a resiliência do machismo estrutural e também quanto à igualdade de gênero ainda é um horizonte distante, é sintomático o elevado número de estupros perpetrados em 2024, trazendo números inéditos e alarmantes.
O crime de estupro tem um forte significado cultural, manifestando o poder e a dominação masculina. Segundo a antropóloga argentina Rita Segato, “Não há sociedade que desconheça o estupro”, contudo, isso não significa que haja similaridade nas estatísticas dos diferentes países.
Atualmente, a República Democrática do Congo, na África, é conhecida como a capital mundial do estupro. Em 2019, o país registrava o estupro de 48 mulheres a cada hora.
No Brasil, o estupro era considerado um crime contra os costumes, e somente com a publicação da Lei nº 12.015/2009, que alterou o Código Penal Brasileiro, o estupro passou a ser considerado um crime contra a dignidade sexual.
Essa mudança trouxe um deslocamento do foco que antes estava nos costumes e na ordem social e passou a privilegiar a individualidade feminina. Dado que a dignidade sexual é uma espécie do gênero dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, intrínseca a todo ser humano.
Um outro dado a ser discutido é o número alarmante de estupros de vulneráveis, evidenciando que crianças não são protegidas e nem cuidadas em seus lares, quando é papel do Estado, da família e da comunidade zelar pela integridade física, psíquica, moral e espiritual das crianças.
O estupro de crianças viola tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção dos Direitos da Criança, que preconiza o desenvolvimento integral e a proteção especial de crianças e adolescentes.
O aumento do número de estupros trazidos no Anuário da Violência ainda está longe de retratar a realidade, pois as vítimas, na maior parte dos casos, ficam sequestradas em sentimentos de medo, culpa e vergonha e, por isso, não denunciam o crime.
A desigualdade de gênero tem distintas facetas e está presente nas relações de trabalho e na política institucional, atingindo o ápice no terreno da sexualidade, por isso é bastante comum que, nos crimes sexuais, haja uma dificuldade em perceber aquele homem como um criminoso.
O machismo estrutural impinge ao estuprador um perfil psicológico desviante e patológico e, por outra via, tenta promover uma inversão nos papéis de vítima e ré, sendo comum a busca de caminhos que levem à culpabilização da mulher por meio de questionamentos acerca do uso de roupas inapropriadas, horários inconvenientes para uma mulher estar na rua, possível uso de bebidas alcoólicas, entre outros.
Entretanto, o que dizer quando a maior parte dos estupros são cometidos em casa e contra meninas e adolescentes, como culpar a roupa, a maquiagem e o horário de estar na rua.
A sociedade como um todo precisa reconhecer que os culpados pelos estupros são homens socializados em uma cultura machista que enxerga os corpos das mulheres e das crianças como objeto e propriedade.
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