Marcel van Hattem: crítico legítimo ou provocador perigoso?
Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
Marcel van Hattem: crítico legítimo ou provocador perigoso?
Depois de ter indiciado Bolsonaro e ter uma foto dele exposta pelo deputado Van Hattem, na Câmara dos Deputados, o delegado da Polícia Federal Fábio Schor tornou-se alvo de "uma onda de ataques em massa" nas redes sociais e passou a circular de carro blindado
No primeiro texto comentei reportagem da Folha de S. Paulo com o título “Proibição de livros nos EUA mostra censura velada e reflete eleição de Trump”.
No outro, critiquei a decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, por mandar retirar de circulação e destruir três livros com conteúdo ofensivo a gays.
(Atenção: isso não quer dizer que concorde com afirmações contidas nos livros, pelo contrário. São desprezíveis. Mas a questão não é se gosto ou não do que está escrito.)
Agora, o deputado Marcel von Hattem (Novo-RS) foi indiciado pela Polícia Federal, pelos crimes de injúria e difamação, por fazer um discurso agressivo, na tribuna da Câmara dos Deputados, contra o delegado Fábio Schor, da Polícia Federal.
Na ocasião, o parlamentar acusou o delegado de ter produzido relatórios “fraudulentos” contra Filipe Martins, assessor de Bolsonaro, quando ele exercia a Presidência.
E ainda acrescentou alguns qualificativos pouco elogiosos ao delegado, como “abusador de autoridade” e de ter “agido como bandido”. Schor atua com o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, em processos que investigam Bolsonaro.
Como pode ser visto nos textos que indiquei acima, a meu ver, o limite da liberdade de expressão é a chamada “vias de fato” ou “perigo iminente”, isto é, quando um discurso tem a força de provocar uma violência física.
O exemplo clássico é que ninguém tem o direito de gritar falsamente “fogo”, em um teatro lotado, para exibir o seu direito à livre expressão, pois causaria ferimentos e possivelmente mortes. Na atualidade, o “teatro lotado” são as redes sociais.
Visto assim, aparentemente o deputado teria o direito de expressar sua opinião a respeito do delegado, resguardado pela liberdade de expressão e pela imunidade parlamentar.
Aqui é que a porca torce o rabo, como se dizia antigamente. Van Hattem não se limitou a desancar o delegado, mas também, com o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), exibiu um pôster com a foto dele para ilustrar a provocação, expondo-o à execração.
O discurso de Van Hattem foi em 14 de julho de 2024; no mesmo dia, o senador Marcos Do Val (Podemos-ES) havia publicado em redes sociais uma foto do delegado com os dizeres: “Procura-se”.
Segundo Fábio Schor, após a exposição, ele passou a ser alvo de “uma onda de ataques em massa” nas redes sociais. Ele ainda disse que encontrou pendurado o boneco de um macaco azul em seu carro, estacionado nas proximidades de sua casa, como alguém querendo indicar que sabia onde ele morava. (Metrópoles)
O objetivo dos provocadores, portanto, não era apenas criticar o o delegado, mas intimidá-lo fisicamente, expondo-a à sanha dos fanáticos. Depois dos ataques, por segurança, Schor passou a usar um carro blindado.
Nesse caso, pelo contexto, aplica-se a tese do “teatro lotado”, hoje representada pelas redes sociais? Van Hattem é um crítico legítimo ou um provocador perigoso?
O debate sobre os limites da liberdade de expressão continuam complexos, porém mais do que necessários.
PS. O presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) defende que Van Hattem está coberto pela imunidade parlamentar. Ok, mas Lira devia chamar a atenção dos deputados para o linguajar de sarjeta que usam e proibir espetáculos circenses no plenário da Câmara.
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