Usar prompts na inteligência artificial não é evolução
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Vladimir Nunan é CEO da Eduvem, uma startup premiada com mais de 20 reconhecimentos nacionais e internacionais. Fora do mundo corporativo, é um apaixonado por esportes e desafios, dedicando-se ao triatlo e à busca contínua pela superação. Nesta coluna, escreve sobre tecnologia e suas diversidades
Usar prompts na inteligência artificial não é evolução
Este artigo explica por que depender de prompts não é uma vantagem e mostra como a interação natural pode ser o caminho para tornar a IA realmente inclusiva e democrática
Foto: Imagem gerada por Inteligência Artificial (script próprio): Midjourney
Script usado: make an image of Alberto Santos Dumont, aeronaut, athlete, self-taught, Brazilian inventor, Photography, Shot on 70mm, Depth of Field, --ar 16:9 --v 6.0
A inteligência artificial (IA) já transformou a forma como vivemos e trabalhamos. Hoje ela escreve textos, cria imagens, traduz idiomas, analisa grandes volumes de dados e até compõe músicas. É uma das ferramentas mais poderosas que a humanidade já desenvolveu.
No entanto, há um aspecto que muitos enxergam como vantagem, mas que na verdade revela uma limitação clara: a necessidade de usar prompts para interagir com a IA.
Prompts são instruções escritas que precisam ser formuladas de maneira específica para que a IA entenda exatamente o que o usuário deseja.
Embora pareçam sofisticados e até interessantes para quem gosta de tecnologia, eles são um sinal de que ainda estamos no começo da jornada para uma comunicação realmente natural com máquinas.
Se a inteligência artificial fosse madura o suficiente, não precisaríamos aprender a falar a língua dela. Seria a IA que se adaptaria ao nosso jeito de nos comunicar.
Este artigo explica por que depender de prompts não é uma vantagem e mostra como a interação natural pode ser o caminho para tornar a IA realmente inclusiva e democrática.
Também vamos falar da importância da sensibilidade cultural, especialmente no Brasil, e trazer o estudo da Evolucional sobre letramento em IA para gestores escolares como exemplo de como podemos usar a tecnologia de forma mais crítica e consciente.
Como os prompts se tornaram populares
Quando as primeiras ferramentas de IA generativa começaram a se popularizar, ficou claro que o formato do pedido influenciava diretamente o resultado. Um comando vago gerava uma resposta genérica.
Um comando bem detalhado e estruturado produzia resultados melhores. Assim nasceu a chamada engenharia de prompts, ou prompt engineering.
Em pouco tempo surgiram cursos ensinando como criar prompts perfeitos. Influenciadores começaram a compartilhar listas prontas. Empresas passaram a oferecer guias com centenas de exemplos para diferentes objetivos.
Embora esse movimento tenha estimulado o uso da IA, ele também mostrou que a tecnologia ainda não entende a linguagem humana de forma natural.
Toda tecnologia feita para o público em geral deve se adaptar ao usuário. Ninguém precisa aprender código para mandar uma mensagem no celular ou para acessar a câmera. A interface é intuitiva, o que facilita a adoção.
Com a IA deveria ser igual. Se precisamos aprender engenharia de prompts para aproveitar seu potencial, significa que ainda estamos no estágio inicial de interação.
É como se estivéssemos usando computadores na década de 1980, quando tudo era feito em telas pretas e comandos de texto.
O que McLuhan diria sobre isso
Marshall McLuhan, um dos maiores pensadores da comunicação, dizia que o meio é a mensagem. Para ele, a forma como nos comunicamos molda a mensagem e influencia como ela é entendida.
Se o meio exige que a mensagem seja transformada em um formato artificial, o resultado já nasce alterado.
Usar prompts é exatamente isso. É como se a IA dissesse: "eu só entendo se você falar do meu jeito". A intenção original do usuário precisa ser adaptada para caber em um molde que a máquina compreenda. Isso não é diálogo verdadeiro. É um formato de comunicação unilateral.
Comunicação natural é dinâmica
Na vida real, conversamos de forma gradual. Podemos começar explicando o básico, depois acrescentar detalhes, mudar de ideia no meio da conversa ou pedir uma reformulação. Essa flexibilidade é o que torna a comunicação humana eficiente e próxima.
Com prompts, tudo precisa estar pronto desde o início. Você precisa imaginar todos os detalhes e encaixá-los na estrutura certa.
É como se, para pedir um café, fosse necessário especificar o tipo de grão, a moagem, a temperatura da água e o tamanho da xícara logo de cara. Esse formato é mais próximo de programação do que de conversa.
O que dizem as pesquisas sobre os prompts
Estudos já mostraram que a engenharia de prompts é uma solução temporária. Em um artigo na revista Communications of the ACM, o pesquisador Morris afirma que prompts são uma interface ruim para sistemas de IA generativa e que deveriam ser substituídos por métodos mais naturais o quanto antes.
Outro estudo, de Ein-Dor e colaboradores, identificou que criar prompts eficazes exige tempo e conhecimento técnico, o que limita o acesso a quem não tem essa formação. Ou seja, a dependência de prompts exclui parte significativa da população.
Pesquisas lideradas por Sarkar e equipe indicam que a IA pode oferecer interações mais eficazes quando reformula pedidos e ajusta as respostas com base no diálogo.
Isso aproxima a experiência da comunicação real e reduz a necessidade de comandos técnicos.
O papel do contexto cultural
Mesmo quando uma IA entende o português formal, isso não garante que ela compreenda a comunicação no Brasil. Nosso idioma é vivo e repleto de expressões regionais e gírias.
Uma frase como “isso tá massa” pode ser interpretada literalmente como algo relacionado a comida, quando na verdade significa “isso está muito bom” em certas regiões.
Sem sensibilidade cultural, a IA perde nuances e entrega respostas fora de contexto. Prompts rígidos, por sua vez, reforçam essa limitação, pois pressupõem uma linguagem controlada, distante da maneira como realmente falamos.
Letramento em IA: o exemplo da Evolucional
Um estudo recente publicado pelo blog da Evolucional, baseado em um framework da OCDE, apresenta o conceito de letramento em IA.
O termo se refere ao conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários para usar a inteligência artificial de forma crítica, consciente e ética.
O estudo divide o letramento em quatro domínios:
Engajar-se com IA – Reconhecer a presença da IA no cotidiano, entender suas limitações e questionar possíveis vieses nas respostas.
Criar com IA – Utilizar a IA como parceira criativa, mas preservando a autoria humana.
Gerenciar IA – Definir quando e como usar a IA, evitando dependência excessiva.
Projetar IA – Compreender o funcionamento técnico, as fontes de dados e os impactos sociais e éticos.
A conclusão é clara: o uso responsável da IA não se resume a saber criar prompts eficientes. É preciso desenvolver uma relação crítica com a tecnologia, entendendo que ela deve se adaptar ao usuário e não o contrário.
O futuro é a conversa guiada
O próximo passo na evolução da IA não é aprimorar o formato dos prompts, e sim eliminá-los como requisito. A IA precisa guiar a conversa, fazendo perguntas quando algo não estiver claro e ajustando as respostas conforme recebe mais informações do usuário.
Esse modelo oferece benefícios evidentes:
Reduz a barreira de entrada para quem não tem conhecimento técnico.
Diminui erros de interpretação, já que a IA confirma detalhes antes de concluir a tarefa.
Adapta-se ao estilo de comunicação de cada pessoa.
Facilita o uso por diferentes faixas etárias e níveis de letramento digital.
Quando somamos a isso a sensibilidade cultural, a IA se torna uma ferramenta muito mais inclusiva, capaz de entender e responder de forma alinhada à realidade de cada usuário.
Inclusão e democratização
Uma IA que depende de prompts complexos acaba privilegiando quem já tem domínio tecnológico e conhecimento de vocabulário especializado.
Esse formato exclui justamente aqueles que mais poderiam se beneficiar da tecnologia, como estudantes de escolas públicas, pequenos empreendedores, trabalhadores informais e cidadãos com pouco acesso a capacitação digital.
Por outro lado, uma IA que entende linguagem natural, reconhece expressões culturais e conduz a conversa de forma simples permite que qualquer pessoa explore seu potencial. Isso é democratização real da tecnologia.
A IA como extensão da comunicação humana
McLuhan dizia que os meios moldam a nossa percepção e que não existe comunicação neutra. Se a IA quer ser uma extensão da comunicação humana, precisa entender nosso jeito de falar, com erros, gírias, sotaques e particularidades culturais.
Uma IA que conversa, pergunta, confirma e adapta suas respostas está mais próxima de se tornar um parceiro de verdade. Uma IA que exige prompts está mais para uma máquina de comando do que para um meio de comunicação.
Conclusão
A inteligência artificial é poderosa, mas a dependência de prompts é um sinal de que ainda estamos no começo dessa tecnologia. Prompts não representam comunicação real, e sim um formato artificial que obriga o usuário a se adaptar à máquina.
O futuro está na interação natural, em que a IA entende o que dizemos sem códigos especiais, faz perguntas para confirmar, se adapta à nossa forma de falar e leva em conta nosso contexto cultural.
Até chegarmos lá, é importante lembrar que prompts são apenas um passo provisório. Não devemos romantizar sua necessidade, mas trabalhar para superá-la.
A IA do futuro será aquela que não exige que aprendamos sua linguagem, mas que aprende a falar a nossa.
E quando isso acontecer, a comunicação com máquinas deixará de ser um desafio técnico para se tornar uma extensão natural da nossa própria forma de nos conectar e criar.
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