Um dia após a sede do Legislativo dos Estados Unidos, o Capitólio, ser invadida por extremistas que não aceitam a derrota de Donald Trump, o presidente Jair Bolsonaro voltou a colocar em dúvida o sistema eleitoral brasileiro.
Ontem, em conversa com apoiadores, disse que, se não houver voto impresso em 2022, o Brasil pode ter um "problema pior" que o registrado anteontem nos EUA - o ato terminou com quatro mortos e 52 presos.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerou a declaração uma ameaça de Bolsonaro, já preocupado com uma eventual derrota nas urnas daqui a dois anos. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) repudiaram a tese de fraude.
"Qual foi o problema (nos Estados Unidos)? Falta de confiança no voto. Então lá, o pessoal votou e potencializaram o voto pelos correios por causa da tal da pandemia e houve gente que votou três, quatro vezes, mortos votaram", disse Bolsonaro, sem apresentar provas.
A hipótese de que mortos votaram já foi desmentida pelas autoridades eleitorais do partido Republicano, o mesmo de Trump, e não há indício de que as pessoas votaram mais de uma vez - até porque a eleição americana não é vencida no voto popular. Tribunais de dezenas de Estados negaram recursos feitos com base em alegações de fraudes levantadas por Trump.
Em conversa com apoiadores, @jairbolsonaro disse que "a falta de confiança [no voto] levou a esse problema que tá acontecendo lá" nos Estados Unidos.
— Eleições EUA (@EleicoesEUA) January 7, 2021
O presidente brasileiro disse que "aqui no Brasil, se tivermos o voto eletrônico, vai ser a mesma coisa". pic.twitter.com/tjGaaUDcT6
"Se nós não tivermos o voto impresso em 2022, uma maneira de auditar o voto, nós vamos ter problema pior que os Estados Unidos", afirmou o presidente brasileiro, em frente ao Palácio da Alvorada.
A pressão pelo voto impresso é recorrente nas falas de Bolsonaro. Em 9 de março do ano passado, ele disse que apresentaria provas de que as eleições de 2018 foram fraudadas, o que nunca fez. Embora tenha ganhado, ele diz acreditar que poderia ter vencido no primeiro turno.
Presidente da Corte eleitoral, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou ontem, por meio de nota, que lida apenas com "fatos e provas". "Eventuais provas, se apresentadas, serão examinadas com toda seriedade pelo tribunal", declarou, em resposta às afirmações de Bolsonaro.
Já o vice-presidente do TSE, ministro Edson Fachin, disse que a invasão do Capitólio deve colocar em alerta a democracia brasileira. Ao destacar a realização das eleições de 2022, afirmou que "quem desestabiliza a renovação do poder ou falsamente confronta a integridade das eleições deve ser responsabilizado em um processo público e transparente".
O ministro do Supremo Alexandre de Moraes disse que os Estados Unidos "certamente" saberão responsabilizar os responsáveis pela invasão. "Milícias presencias ou digitais, discursos de ódio e agressões às instituições corroem a democracia e destroem a esperança em um futuro melhor e mais igualitário."
Ao comentar as declarações do presidente, Maia disse que elas indicam que o mandatário não aceitará uma eventual derrota nas próximas eleições.
"Como Trump, me parece que Bolsonaro é um jogador que não admite uma derrota e ele já vai organizando o campo das ameaças com dois anos de antecedência." Segundo o parlamentar, a fala se soma a outros "ataques às instituições", como o Congresso e o Supremo.
"É um ataque direto e gravíssimo ao TSE e seus juízes. Os partidos políticos deveriam acionar a Justiça para que o presidente se explique", afirmou Maia.
Parlamentares da oposição também criticaram o presidente. Líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ) disse que todos devem trabalhar para "preservar a democracia". "As ameaças de Bolsonaro continuam, agora reforçadas pelo péssimo exemplo de Trump."
Líderes das bancadas do PT nas duas Casas protocolaram representações contra Bolsonaro no TSE e na Procuradoria-Geral da República.