Com o terceiro maior consumo influenciado pelas redes sociais do mundo, o Brasil é palco também para um novo movimento neste setor, no qual os presidentes (ou chiefs executive officer, os CEOs) estão usando do conhecimento e do poder que possuem para serem também influenciadores digitais.
A participação deles em plataformas massivas já movimenta R$ 79 bilhões em marketing de influência apenas em terras brasileiras, segundo um estudo elaborado pela Getty Images.
Números não faltam para comprovar que a atuação dos executivos nas redes sociais para além de fins corporativos gera negócios. A pesquisa "Quem te influencia", da MindMiners e da Youpix, indica que "3% dos entrevistados afirmam confiar nas recomendações de influenciadores, e 6 em cada 10 seguidores já compraram um produto ou serviço com base nessas sugestões."
Mas o que é preciso para se destacar no País de maior número de influenciadores digitais, segundo atestou a Nielsen em 2022? Brenda Lezie, especialista em marca pessoal e redes sociais e CEO da Branding Digital, indica atitudes para gerar afinidade com o público.
"Executivos que desejam usar as redes sociais como parte de sua estratégia de branding devem priorizar a autenticidade e a consistência. Mostrar o dia a dia real da rotina empresarial, com seus altos e baixos, é essencial para criar uma conexão genuína com os seguidores", aconselha.
A humanização encontra apoio em pesquisas também. A Adobe demonstrou que 34% dos entrevistados boicotaram marcas pelo menos uma vez porque não se sentiram representadas nas propagandas ou ações das empresas.
Dado que o CEO tem relação direta com a marca da qual é o principal executivo, essa interação direta se revela uma ferramenta de marketing, capaz de fortalecer tanto as marcas pessoais quanto as empresariais.
“Quando um líder se torna influenciador, compartilhando suas ideias e valores nas redes, ele estabelece uma conexão direta entre a cultura da empresa e seus profissionais. O CEO fica mais acessível a todo mundo e, portanto, representa possibilidades reais de acesso e oportunidades. Esse engajamento gera um clima de inovação e colaboração, onde os profissionais se sentem mais conectados à visão da empresa, o que aumenta a produtividade e o desejo de contribuir para o sucesso coletivo.”, menciona a especialista em RH, psicanalista e Presidente do Instituto de Pesquisa e Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas (Ipefem), Ana Tomazelli.
A pesquisadora Elizabeth Saad, da Universidade de São Paulo (USP), destaca que 40% dos brasileiros foram impactados por influenciadores no momento de realizar compras. Além disso, 24 dos 100 Youtubers mais influentes do mundo são brasileiros, evidenciando a força e a presença desse País no universo digital.
Essas estatísticas não apenas ilustram a popularidade das redes sociais, mas também apontam para um novo paradigma no relacionamento entre marcas e consumidores, onde a autenticidade e a conexão humana desempenham papeis centrais.
Emília Buarque, presidente do Lide Ceará, vê essa ação de CEOs influenciadores como um movimento mundial de líderes que falam e representam os valores das marcas. Ela considera a produção de conteúdo por um CEO positiva, mas arriscada. Por esse motivo, muitos cuidados devem ser tomados.
“Existem muitos terrenos a se explorar e muitas nuances do modus social que precisa ser observado com atenção. Por exemplo, as questões de diversidade necessitam de um letramento necessário como forma de reparação aos danos praticados no passado, bem como a comunicação precisa ser fiel à ação para não parecer propaganda enganosa”, afirma.
Segundo a especialista, entre os pontos negativos para o profissional estão a administração do tempo e dos riscos, pessoais e profissionais.
“Obviamente, do ponto de vista pessoal, o influenciador ganha destaque em sua trajetória, e no âmbito do negócio, a tendência é influenciar nos resultados positivos das empresas. Porém, demanda tempo, dedicação e exposição, que algumas vezes ultrapassa o limite do profissional. “
“Para as empresas é uma tendência e existem pesquisas que comprovam resultados a partir disto. Uma delas cita que 84% dos consumidores querem que as marcas sejam fortes, confiáveis e que os mantenham informados. E 85% querem que as marcas usem sua força para educar a sociedade”, conclui.
Emília segue seu raciocínio, falando que seis em cada 10 funcionários globalmente indicam confiar mais em um CEO que usa as mídias sociais do que em um que não. E 65% dos compradores dizem que uma liderança inovadora mudou significativamente a percepção de uma empresa para melhor.
Para a empresária, não dá para contar somente com talento e espontaneidade na hora de montar um perfil de CEO. Tem que haver estratégia coordenada e lapidação ao longo do processo.
“A pergunta principal é: qual persona é mais adequada para o business da empresa? Daí em diante é montar uma estratégia e estar constantemente avaliando as direções a seguir”, afirma.
A presidente do Lide Ceará acredita que é necessário seguir estratégias para separar as opiniões pessoais das opiniões da empresa.
“É a linha é tênue entre ser fiel aos seus valores e aos da empresa para garantir uma verdade na comunicação, e entrar em terrenos que também possam comprometer sua reputação e dos negócios. Hoje, vemos vários casos de deslizes para demonstrar o quanto não é uma atuação tão fácil assim”, conclui.
O que fazer no papel de influenciador digital?
A CEO da Cia Sustentável, Christie Bechara, acredita que uma posição de liderança aliada à exposição das redes sociais tem que vir acompanhada de mídia training - treinamento feito por profissionais de comunicação com porta-vozes de empresas em geral -, pois um mínimo termo usado de forma errada pode trazer grandes consequências.
"É uma questão de postura, vestuário, escolha das falas e das linguagens. Com o crescimento da fama trazida pela internet, essas pessoas têm sede de engajamento, curtidas e visualizações. E o que as pessoas gostam? De polêmica", alerta.
Ela se mostra atenta às possibilidades positivas e também negativas da investida dela, como executiva, nas redes sociais visando o papel de influenciadora digital. "Antigamente, você podia 'comprar uma informação' e revertê-la. Hoje, não. Como diz o ditado, 'a flecha lançada não volta mais para o arqueiro", acrescenta.
Outro ponto que prega é o respeito pelas regras e confidencialidade da empresa que o CEO influenciador representa. "Todo gestor deve respeitar os critérios de compliance, o que inclui não divulgar informações confidenciais sobre o negócio ou a empresa que representam, ou até mesmo sobre fornecedores", cita.
Para entender o que o público busca em um perfil de um CEO influenciador, a líder da Cia Sustentável ressalta novamente a importância de um treinamento: "O media training deve ser uma prática constante, com análises dos conteúdos que geram engajamento e dos pontos que exigem atenção. Se um executivo tem sucesso ao abordar economia, por exemplo, ele deve seguir essa linha."
Para ela, "isso é essencial, pois o público tem preferências, e o porta-voz deve comunicar-se com ele de forma que também fortaleça a imagem da empresa" diz que "os algoritmos podem ajudar nisso, identificando temas de maior interesse."
Ao citar o exemplo das Lojas Americanas, Christie Bechara defende a ideia de que o CEO não deve ser a "palavra final" em momentos de crise.
"Em uma grande empresa, o CEO atua como um porta-voz diplomático, que representa os valores da organização. É por isso que esses profissionais são preparados para ocupar essas posições de forma ética e estratégica"
O impacto dos influenciadores nas marcas
Em datas comemorativas como a Black Friday, os influenciadores podem impulsionar as vendas de produtos segundo Rodrigo Soriano, especialista em marketing de influência.
O CEO da Airfluencers acredita que os famosos podem criar um senso de urgência e exclusividade em torno das promoções, o que impulsiona as conversões e antecipa as decisões de compra.
"Segundo pesquisas, 49% dos consumidores recorrem a influenciadores para orientá-los em decisões de compra durante a Black Friday. Esses criadores de conteúdo têm a capacidade de gerar tráfego qualificado para as lojas online, aumentar as taxas de conversão e, em muitos casos, esgotar produtos em poucas horas", afirma.
A Amazon, gigante no varejo e referência no e-commerce, usou influenciadores para impulsionar a venda de produtos na Black Friday 2022. O resultado foi um aumento 30% nas vendas de artigos selecionados em comparação a igual período no ano anterior.
Além das vendas diretas, o marketing de influência pode trazer benefícios, como atingir públicos específicos e estimular campanhas publicitárias.
"O conteúdo autêntico gerado pelos influenciadores ressoa mais fortemente com os clientes do que as campanhas tradicionais, tornando as promoções mais envolventes e eficazes. As parcerias permitem que as marcas alcancem públicos segmentados e construam relacionamentos de longo prazo com os consumidores, abrindo portas para futuras oportunidades de engajamento", afirma Soriano.
Universidade investe em formação para influenciador
A Universidade Tecnológica do Sudeste (Setu, na sigla em inglês) é uma faculdade irlandesa que passou a fornecer uma formação superior para aqueles que se interessem pela carreira de produtor de conteúdo.
A iniciativa partiu da professora Irene Mcormick, que descobriu que sua filha estudava com uma influenciadora digital e percebeu o prestigio que esses profissionais tem sobre os jovens.
Criação de vídeos, empreendedorismo, psicologia e narração de histórias, análise de dados e produção de podcasts são as matérias que fazem parte da base curricular do curso.
Para o professor Alexandre Ferreira da Silva, coordenador do tecnólogo de Influencer Digital da faculdade Cruzeiro do Sul, o mercado está cada vez mais impulsionado pelas inovações tecnológicas e exige que os profissionais se adaptem a esse novo cenário desafiador e às profissões do futuro.
O educador afirma que na graduação, o profissional aprende a criar conteúdos atrativos, compreender seu público-alvo, precificar seus serviços e a trabalhar com marcas, entre outros aspectos.
"É importante salientar a questão ética que é tratada em disciplinas específicas e que permeia outras", conclui.
Ferreira da Silva também acredita que a publicidade é o maior nicho de atuação para os formandos do curso, mas, utilizar o que é ensinado para impulsionar pequenos negócios é uma alternativa.
"Grande parte dos influenciadores digitais trabalham somente com 'publis'. Porém, existem casos em que o influenciador também trabalha em outra área, sendo até dono do próprio negócio."
"Assim, eles usam as redes para promover a própria marca e potencializar suas vendas por meio de sua influência," acrescenta.
A professora Renata Torquato, uma das responsáveis pelo Escritório de Gestão, Empreendedorismo e Sustentabilidade (Eges) da Unifor, acredita que o uso de ferramentas digitais, o aprendizado de tecnologias e estar presente nas redes sociais é um tema transversal a todas as profissões, não apenas à área de comunicação.
"Mesmo a pessoa que, originalmente, não é dessa área de comunicação ou de gestão, precisa se preparar, se adaptar, se estruturar e se desenvolver para poder entender e fazer parte desse universo digital."
No meio comercial, a professora acredita que as empresas necessitam de um meio para se manterem conectadas com os clientes. "A empresa, hoje, precisa ser um canal essencial para se mostrar, funcionando como uma vitrine, para exibir o produto, o serviço, explicar como ele funciona, quais são os diferenciais, quem são os clientes e qual é a proposta de valor."
Dicas para CEOs nas redes sociais
Autenticidade: compartilhe a verdade sobre sua rotina, sem criar uma imagem artificial.
Conteúdo em vídeo: com o vídeo sendo o formato preferido pelo público, este é o meio ideal para criar conteúdos mais impactantes e engajadores.
Interação com o público: responda e se envolva com seus seguidores, criando um relacionamento mais próximo e autêntico.
Regularidade: Mantenha uma frequência de postagens para engajar e manter a atenção do público.
Comunicação eficaz: invista em habilidades como linguagem corporal e locução para transmitir melhor sua mensagem.
FRASE
"Mesmo a pessoa que, originalmente, não é dessa área de comunicação ou de gestão, precisa se adaptar"
Renata Torquato, professora da Unifor
FRASE
"Todo gestor deve respeitar os critérios de compliance, o que inclui não divulgar informações confidenciais sobre o negócio ou a empresa que representam"
Christie Bechara, CEO da Cia Sustentável
NÚMERO
49%
dos consumidores recorrem a influenciadores para orientá-los em decisões de compra durante a Black Friday