Falta de transparência e diálogo, contratações por fora de editais e desorganização são alguns dos aspectos que, conforme artistas e produtores relataram ao Vida&Arte, marcam a programação do Ciclo Carnavalesco de Fortaleza de 2023. É a primeira realização oficial da festa conduzida pela gestão de Elpídio Nogueira, titular da Secretaria da Cultura (Secultfor) que assumiu a pasta em 2021 com a eleição do prefeito José Sarto (PDT). Na avaliação das fontes ouvidas, o trato da Prefeitura de Fortaleza com o Carnaval é sintomático acerca da gestão da Secultfor, marcada por crises em eventos que já faziam parte do calendário cultural da Capital.
Em dezembro de 2022, a pasta lançou três chamadas públicas do Ciclo Carnavalesco 2023, incluindo uma de credenciamento de atrações artísticas para apresentações nos festejos promovidos pela Prefeitura. No entanto, somam-se relatos sobre falta de informações acerca do andamento do processo e, ainda, sobre contratações de atrações de forma direta e independente do edital para a programação do primeiro fim de semana do Ciclo oficial, que começou na sexta, 20.
"A gente esperava as fases — habilitação, resultado preliminar, resultado final — e o que teve até agora foi, basicamente, nada", compartilha Renata Monte, produtora do Bloco Mambembe, antigo Bloco das Travestidas, que já se apresentou em diversos Ciclos Carnavalescos. Outra presença tradicional do Carnaval da Capital, a banda Os Alfazemas também ressalta o cenário de indefinição. "A gente se inscreveu, cumpriu prazos, comprovou tudo, mas não saiu o resultado final. Eles estão fazendo do jeito que querem fazer", divide o vocalista Adriano Uchôa.
Tanto o bloco quanto a banda afirmam ter sido procuradas pela produtora licitada pela Prefeitura para negociação de contratação por fora do edital. Em ambos os casos, os cachês inicialmente oferecidos foram menores que os previstos na chamada pública, que baseia os recursos a partir de pontuação obtida no processo.
A situação de indefinições vem dando insegurança a artistas e produtores de projetos inscritos nas chamadas, que vem repercutindo o caso nas redes sociais da Prefeitura e da Secultfor, apontando dificuldade de comunicação com a pasta e demandando os resultados dos editais do Ciclo Carnavalesco.
Também nas redes, o vereador Gabriel Aguiar (PSOL) afirmou que o mandato dele tomou ações após recebimento de "denúncia" por parte de artistas. "Quando a gente olha os editais, está faltando muita informação e muita transparência. A gente está oficiando a Secultfor buscando informações e esclarecimentos a respeito dessas denúncias", publicou na noite de quinta, 19. Também do PSOL, o deputado estadual Renato Roseno avaliou o caso como uma evidência "do tratamento diferente que é dado pelo poder público aos artistas 'de fora' e aos 'locais'". "É preciso adotar isonomia e garantir melhores condições de trabalho aos nossos", demandou.
Questionada pelo Vida&Arte, a Secultfor afirmou em nota que os editais do Ciclo Carnavalesco 2023 "seguem fluxo protocolar e necessário, para que seja amplo, isonômico e transparente" e que estão na fase de habilitação jurídica. A pasta ainda afirma estar promovendo "programação complementar aos editais, com objetivo de entregar à Cidade uma festa que se espalha por diversos bairros durante cinco fins de semana".
"A Secultfor tem decepcionado os artistas, não que houvesse expectativa muito grande com a gestão que assumiu, mas existe um completo abandono e isso não é só sobre o Carnaval. A gente vê o que aconteceu com o Festival de Teatro, com o Salão de Abril, o completo descaso com que os artistas foram tratados", lembra Renata.
Adriano define a situação como de "incompetência" e "má gestão", avaliando o secretário Elpídio Nogueira como "uma pessoa despreparada, que não entende de cultura". O artista lembra que, na gestão anterior, do ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT), "a instituição do Pré-Carnaval estava crescendo". "É um atrativo muito forte, movimenta turismo, economia local. Se não tem interesse em fazer algo novo, copia pelo menos o que estava dando certo", critica.
"É o primeiro carnaval pós-pandemia, todo mundo muito ansioso, e a Prefeitura vem de dois eventos muito grandiosos — dois dias de réveillon, Férias na PI — então existia expectativa para que o carnaval fosse à altura deles. Está sendo o completo oposto disso", avança Renata. "O que a gente precisa é tentar entender o que está acontecendo, qual o motivo dessa falta de transparência. Não houve diálogo, pronunciamento. O que complica é o silêncio da Secultfor", resume Renata.
Perguntas e resposta
1- A programação do Ciclo Carnavalesco foi divulgada sem o edital do período ter sido finalizado. Por que isso ocorreu?
2- Para este primeiro fim de semana de programação, as atrações convocadas são as atrações habilitadas no edital?
3- De que forma as atrações que se apresentarão neste fim de semana foram contratadas?
4- Este modelo de contratação se tornará parâmetro para a composição de programação na Secultfor? De que forma isso se relaciona com o processo que historicamente é feito por edital?
5- Qual a situação atual exata do edital do Ciclo Carnavalesco e quais as previsões concretas para divulgação do resultado final?
6- Quando os grupos e artistas que serão selecionados no edital irão se apresentar no Ciclo Carnavalesco?
A Secultfor respondeu às perguntas enviadas pelo Vida&Arte com uma nota única. A resposta pode ser conferida abaixo:
"A Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza (Secultfor) informa que os três editais públicos referentes ao Ciclo Carnavalesco de 2023, lançados em 07 de dezembro de 2022, seguem fluxo protocolar e necessário, para que seja amplo, isonômico e transparente.
Todo o trâmite pode ser acompanhado no portal da Central de Licitações da Prefeitura de Fortaleza (CLFor). Cumprindo os prazos legais, atualmente, os editais estão na fase de habilitação jurídica.
Além disso, a Secultfor promove programação complementar aos editais, com objetivo de entregar à Cidade uma festa que se espalha por diversos bairros durante cinco fins de semana."
O podcast Vida&Arte é destinado a falar sobre temas de cultura. O conteúdo está disponível nas plataformas Spotify, Deezer, iTunes, Google Podcasts e Spreaker. Confira o podcast clicando aqui