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Logística à prova: pandemia exigiu o máximo no transporte de bens essenciais
Reportagem Seriada

Logística à prova: pandemia exigiu o máximo no transporte de bens essenciais

Este primeiro episódio do especial "Logística na pandemia: cargas que salvam vidas" faz um panorama do segmento com a intensificação do novo coronavírus no Brasil
Episódio 1

Logística à prova: pandemia exigiu o máximo no transporte de bens essenciais

Este primeiro episódio do especial "Logística na pandemia: cargas que salvam vidas" faz um panorama do segmento com a intensificação do novo coronavírus no Brasil
Episódio 1
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No momento em que as fronteiras fecharam e as normas de quarentena e distanciamento estaduais foram decretadas, a vida nas grandes cidades desacelerou. Ruas praticamente vazias foram o "novo normal" durante a fase mais crítica da pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Mas, para que os decretos fossem cumpridos e o vírus combatido, ganharam destaque atores nem sempre percebidos da logística de transporte.

Considerado serviço essencial, este segmento permite que o mercado não pare de atender a população. E, em meio à crise, demandas específicas seguiram o caminho contrário no mercado e o consumo cresceu em torno de medicamentos e alimentos. A logística se voltou quase por completo para servir à pandemia e, também, em boa medida, ao ambiente virtual, com a demanda maior no e-commerce. 

De acordo com dados da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC & Logística), o impacto do coronavírus no transporte rodoviário de cargas já pôde ser sentido logo no início do isolamento. Pesquisa contínua revela que na primeira quinzena (entre 23 e 29 de março), a demanda geral caiu 26,9% em relação a igual período do ano passado. No entanto, entre os segmentos, as cargas relacionadas ao varejo supermercadista e industrial farmacêutico tiveram altas de 23% e 0,84%, respectivamente.

Edson Carillo, vice-presidente de Educação da Associação Brasileira de Logística (Abralog), ressalta que o medo do desabastecimento assustou a população, que correu aos supermercados. Essa possibilidade, porém, não esteve perto de ser concretizada, pois a relação oferta e demanda fez com que o preço de alguns produtos aumentasse significativamente, o que afastou consumidores de alguns produtos.

 


Sobre as lições que a pandemia trouxe ao setor de logística, Carillo diz que a digitalização dos processos é a principal. "Além do fato de os protocolos de segurança terem mudado o modelo logístico pela descentralização forçada em função do trabalho remoto, e o maior fracionamento das encomendas, em decorrência na quebra de demanda".

O impacto da pandemia nos demais segmentos, a começar pelo transporte de passageiros até o de bens considerados não essenciais, foi forte. Segundo dados da Confederação Nacional do Transporte (CNT), em mais de quatro meses de pandemia, a queda de demanda está na casa dos 75%. Isso reflete diretamente no caixa das transportadoras, que encontram dificuldades de obtenção de crédito junto aos bancos.

Mas, com o processo de retomada gradual da atividade econômica, os ânimos se renovam. De acordo com a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), o Dia dos Pais deve movimentar R$ 18 bilhões no varejo. Isso pode ser considerado um indício positivo para o crescimento do fluxo de cargas no País.

 


Na avaliação do presidente da CNT, Vander Costa, o otimismo do setor aumenta, mas também a consciência sobre o grande impacto da crise. "Este é o momento para aproveitarmos aquilo que foi positivo e garantir que esse "novo normal" seja marcado por um sistema de transporte de qualidade, eficiente e adequado às realidades locais e por uma logística ágil e confiável. Tudo isso se reflete em ganhos para a economia e, consequentemente, para a sociedade."

Preço do frete variou pouco

A queda da atividade econômica impediu que o setor fizesse alterações na tabela de preços(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE A queda da atividade econômica impediu que o setor fizesse alterações na tabela de preços

Apesar de aumento da demanda para transporte de cargas para alguns segmentos, principalmente os relacionados ao setor de saúde, o valor do frete pouco variou no mercado cearense. Isso é o que afirma o membro do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Heitor Studart.

Ele explica que a queda da atividade econômica impediu que o setor fizesse alterações na tabela de preços do frete do transporte rodoviário, mas ressalta que ainda assim a demanda caiu mais de 55% em maio e 47% em junho. O que segurou queda maior foi a cadeia de suprimento alimentar, a de medicamentos e a do agronegócio.

"Por incrível que pareça, o preço do frete ficou estável. Mesmo porque não havia essa demanda toda. A expectativa é que a demanda continue crescendo em julho e que em agosto já estejamos próximos de voltar à capacidade normal no rodoviário", destaca.

Studart frisa que os números de cabotagem (navegação entre portos do País) no Brasil aumentaram muito neste primeiro semestre, continuando uma tendência, bem como a demanda por exportação. Sobre o modal aéreo, o transporte de cargas sofreu um baque. Para além das importações da saúde, vindas da China, a redução dos voos de passageiros afetou ainda a movimentação nos porões das aeronaves.

Como o valor do frete pode ser calculado a partir do modal utilizado

  • Igor Pontes, doutor em Logística pela Aix-Marseille Université e professor da Escola de Negócios da Faculdade CDL nas áreas de Logística e Economia, explica que a relação de custos no valor do frete varia dependendo do modal utilizado no transporte.
  • Ele exemplifica o caso de uma suposta carga movimentada entre São Paulo e Fortaleza. Se no modal rodoviário o frete pode custar entre R$ 10 mil e R$ 20 mil, a lógica de custo menor no transporte, que suporta as maiores cargas, é posta à prova.
  • Igor revela que o transporte marítimo de cabotagem tem custo menor, já que tem capacidade de carga muito superior ao dos caminhões. Já o aéreo depende muito do tipo de produto e tamanho do carregamento, além de peso e valor. Este é o meio de transporte mais recomendado para urgências (como de medicamentos e produtos de alto valor agregado).

Ferrovias: potencial desperdiçado no Brasil

Ferrovia ligará os estados do Piauí, Ceará e Pernambuco(Foto: Delfim Martins/ Blog do Planalto)
Foto: Delfim Martins/ Blog do Planalto Ferrovia ligará os estados do Piauí, Ceará e Pernambuco

País de dimensões continentais, o Brasil é observado por estudiosos como ponto fora da curva ao seguir durante décadas investindo no transporte rodoviário de cargas, o que, aliado à falta de infraestrutura, fez com que os custos aumentassem.

Opção mais do que viável para a logística de transporte brasileira é o ferroviário. Desde o custo menor de manutenção até o volume de cargas suportado gera superávit de custo-benefício. No entanto, segundo Heitor Studart, membro do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado (Fiec), a movimentação de cargas pelos trilhos no Ceará se manteve estável com o transporte de combustível, grãos e minérios. A principal linha liga os portos do Pecém e Mucuripe, em Fortaleza.

Mas, o atraso da ferrovia Transnordestina desperdiça um grande potencial logístico no Estado. "Falta solução política para a situação. A maioria dos recursos foi viabilizada, porém, entraves, em especial políticos, impedem que a obra avance", avalia Studart.

Igor Pontes acredita que a Transnordestina é um projeto essencial para o Nordeste ao criar desenvolvimento econômico no entorno da ferrovia. "Uma infraestrutura de transporte atrai negócios. Não é uma ferrovia "que liga o nada a lugar nenhum" como já foi depreciado antes", complementa.

Diante de todos os desafios, o coordenador do Centro de Estudos em Transportes, Logística e Mobilidade Urbana da Fundação Getúlio Vargas (FGV Transportes), Marcus Quintella, afirma que houve uma comprovação de competência dos operadores logísticos no Brasil, pois, em meio à pandemia, o setor soube lidar com os gargalos estruturais e o abastecimento foi garantido.

No entanto, falta velocidade no desenvolvimento de soluções estruturais. "O que temos de ver é que ainda temos a infraestrutura de transportes que não atende à pujança do País e à potencialidade da nossa economia. Isso compromete o crescimento econômico brasileiro", comenta.

TRANSNORDESTINA

Com projeto iniciado em 2002, o início das obras da Transnordestina em 2006 previa gastos de até R$ 5,42 bilhões. A ideia era concluir as obras e iniciar a operação em 2013, mas em 2016 apenas 600 km dos 1.753 km haviam sido concluídos. Em 2019, após três anos de paralisação, as obras voltaram com novo investimento de R$ 257 milhões efetuados pela controladora Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).

REGRA LOGÍSTICA

Antiga regra logística versa que até 500 km é recomendável realizar o transporte por via terrestre. Isso equivale praticamente ao percurso entre Fortaleza e Natal-RN (525 km). Em países com infraestrutura desenvolvida é impensável encarar os 3.116,8 km entre a capital cearense e São Paulo. No entanto, essa viagem é um dos percursos mais comuns para as transportadoras.

Confira todos os episódios do especial

EPISÓDIO 1 - Como a logística mudou com a pandemia do novo coronavírus
EPISÓDIO 2 - A organização da logística para evitar desabastecimento na pandemia
EPISÓDIO 3 - A movimentação cargas que chegam via mar foi intensificada na pandemia
EPISÓDIO 4 - O setor aéreo teve de se adaptar para atender a demanda na crise de Covid-19

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