Você conhece ou já ouviu falar de Tereza de Benguela? Ela viveu no século XVIII e ficou popularmente conhecida entre o povo quilombola como Rainha Tereza, pela luta contra a escravização. Em 2014, foi instituído, por lei, o 25 de julho como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
Tereza de Benguela foi a líder do Quilombo do Piolho, também conhecido como Quariterê. A comunidade ficava localizada próxima às margens do rio Guaporé, no estado de Mato Grosso, e fazia fronteira com a Bolívia. Tornou-se chefe do lugar após a morte do ex-líder e esposo, José do Piolho, que foi assassinado por soldados.
Historiadores não sabem dizer ao certo suas origens. Há quem acredite que ela nasceu no Brasil. Outros defendem que ela nasceu em Angola.
De acordo com dados da Biblioteca Setorial do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas (Cecult), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), os documentos da época apontavam que no local eram cultivadas plantações de banana, feijão, mandioca, milho, dentre outros.
De acordo com o cientista social Hilário Ferreira, “durante o período em que ela assumiu, o quilombo desfrutou de grande prosperidade e passou ileso às tentativas de ataques dos portugueses”.
“Somente em 1770, que uma expedição portuguesa conseguiu conquistá-lo, assassinando alguns quilombolas, e fazendo com que outros fugissem”, afirma.
Ela recebeu o título de rainha em função de ser companheira de José Piolho — que era titulado como rei — e passar a liderar o Quilombo do Piolho nessa região.
É importante destacar que a estrutura administrativa e política que Tereza construiu no quilombo não era do desconhecimento dos africanos. “Vizinho ao reino de Angola, existia a Confederação do Congo, onde a democracia era um regime muito vivenciado e praticado”, afirma Hilário.
Ainda de acordo com a biblioteca setorial, Tereza mantinha o sistema de defesa com armas trocadas com os brancos, ou roubadas das ilhas próximas. Assim como Palmares, os quilombos de certa forma negociavam com os brancos.
“Os objetos de ferro utilizados contra a comunidade negra que lá se refugiava, eram transformados em instrumentos de trabalho, visto que dominavam o uso da forja”.
Hilário afirma que dessa região vieram muitos metalúrgicos.
Ele também explica que o termo “Benguela” está ligado a uma cidade ao oeste de Angola. O historiador cita que o lugar aparece bastante em documentações coloniais e do Império. É possível que ela tenha vindo dessa província, por isso o nome ‘Tereza de Benguela’.
Não existe uma unanimidade sobre o fim de Tereza. Segundo Hilário, alguns historiadores acreditam que ela morreu nos combates de 1770; outros creem que ela conseguiu fugir do ataque e viver mais alguns anos.
A data em homenagem a Tereza Benguela foi aprovada pela então presidente Dilma Rousseff e veio como reconhecimento à luta da Rainha Tereza, assim como sua memória e resistência.
“Sua história não difere muito de outras mulheres negras africanas escravizadas na América Latina. No entanto, dentro da produção historiográfica e da atualidade, vemos o crescente número da violência contra as mulheres. Do ponto de vista histórico, há além do apagamento da população negra, o da mulher negra na luta contra a escravidão”, afirma Hilário.
Ainda segundo ele, a memória de Tereza, na região em que ela viveu, ainda é bastante viva e se reproduz da história oral.
“Nada mais importante do que ressignificar, trazendo à tona a memória dessa mulher negra, que durante duas décadas reinou um quilombo. Onde em sua maioria teve homens a sua frente”.
Diante dessa afirmação do historiador, podemos perceber como é importante a criação dessa data em um país onde as maiores vítimas de violência sejam mulheres negras.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, do ano de 2021, 61,8% das vítimas de feminicídio eram negras.
Criada em junho de 2014, a Lei 12.987/2014 celebra em 25 de julho, o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, que tem como propósito dar visibilidade à mulher negra, que até os dias de hoje enfrenta a desigualdade de gênero, salarial, o racismo e o sexismo.
Em paralelo à data nacional, também é comemorado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, que foi instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1992, durante 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, realizado em Santo Domingo, na República Dominicana.
De acordo com Dediane Souza, da Coordenadoria de Diversidade, acessibilidade e cidadania cultural da Secretaria da Cultura do Estado (Secult), a data — referente aos dias internacional e nacional — representa um momento muito importante, pois traz à tona a memória de Tereza de Benguela e a importância da intersecção entre gênero e raça.
“Quando a gente passa a pensar na importância dessas mulheres — no passado e presente — para o futuro, a gente traz à tona um grande debate: o da desigualdade que elas se encontram nesses contextos de sociedade”.
Para ela, a data tem total importância no marco das lutas feministas e do movimento negro numa perspectiva de não só comemorar, mas também denunciar o contexto de desigualdade que essas tantas mulheres ainda se encontram.
Especial OP+ para marcar o Dia da Consciência Negra traz a história de mulheres negras apagadas da história nacional, causando um silenciamento irreparável. Preta Tia Simoa, Tereza de Benguela e Maria Firmina dos Reis foram apenas algumas das vítimas deste apagamento