Além de um desafio, a pandemia do novo coronavírus se mostrou um poderoso catalisador para a popularidade de líderes mundiais dos mais distintos espectros políticos. Medidas impopulares, mas necessárias, colocaram à prova a capacidade administrativa de gestores e mediram a força de suas articulações políticas e sociais.
Enquanto parte deles viu na crise uma oportunidade para fomentar um legado, outros encontraram um muro que barrou projetos e pôs em xeque, inclusive, o próprio futuro na vida pública.
A pandemia trouxe à tona a velha lógica de que um inimigo em comum tende a gerar união popular em torno de um objetivo. Com isso, até opositores ficam mais propensos a reduzir críticas para construir soluções.
Na vida pública, a condução das políticas não precisa ser baseada exclusivamente em critérios de aprovação popular. Mas o índice demonstra o desempenho desses homens e mulheres em momentos que pedem sobretudo liderança.
Para o bem ou para o mal presidentes e primeiros-ministros tiveram a percepção de suas respectivas imagens alteradas perante suas populações e eleitorados.
O caso mais emblemático de um líder que perdeu o rumo durante a pandemia é o do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que, no início de 2020 caminhava a passos largos rumo à reeleição amparado por bons índices econômicos e de popularidade. No começo da pandemia sua aprovação mantinha-se nos 49%, uma das melhores de seu governo.
Entretanto, a insistência em uma atuação negacionista durante a maior parte da emergência sanitária fez com que sua popularidade despencasse na medida em que novas crises (econômica, racial e institucional) eram somadas ao cálculo político. O então presidente optou por negar a existência do desafio que se impunha justamente no ano da quase certa reeleição.
Trump usou o desempenho econômico pré-pandemia como escudo para livrar-se das consequências de ir contra a ciência e a favor do falso dilema entre "salvar vidas ou salvar a economia". A estratégia o fez deixar a Casa Branca com a menor aprovação de sua presidência (34%), segundo pesquisa do Instituto Gallup.
Num polo oposto ao de Trump, o mundo rendeu-se a primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, 39. Da pequena ilha no Pacífico Sul, com cerca de cinco milhões de habitantes, ela conduziu a crise com precisão e sem se exceder em otimismo ou pessimismo.
Com índices de popularidade históricos, Ardern teve desempenho considerado exemplar por diversos líderes e puxou para si os holofotes para tornar-se exemplo para o mundo. Garantindo, inclusive, a reeleição ao cargo em outubro do ano passado graças à condução que teve durante a pandemia.
Num ambiente majoritariamente masculino como a política, os feitos de Ardern têm peso dobrado. A neozelandesa adotou postura de que governar com mão firme não significa, necessariamente, ser autoritário.
Optou pela habilidade de conscientizar uma nação dos motivos que geram as decisões de quem governa. Além disso, Jacinda mostrou o que a política tem a ganhar quando abre as portas para mulheres e as estimula a ocupar posição de liderança.
Caso singular é o do presidente argentino Alberto Fernández, que começou a pandemia com altíssimo nível de aprovação, perto de 70% em meados de abril, após medidas que fizeram do país um dos com menor índice de casos e mortes na América Latina.
Entretanto, os números dispararam e as críticas a Fernández também. Somando a crise econômica ao desgaste do isolamento, ele terminou o primeiro ano de governo com aprovação perto dos 50%, mas com rejeição em 47%.
Começar uma gestão na Argentina é sempre um desafio; com ou sem pandemia. O discurso da "herança maldita" é recorrente e tem força no país.
Presidentes costumam culpar o desempenho de administrações anteriores pelas falhas em seus próprios projetos. Foi assim com os Kirchners e com Macri, por exemplo, mas Fernández fugiu à regra.
Tendo a popularidade testada diariamente, o peronista não hesitou em colocá-la em segundo plano quando necessário e assumiu a responsabilidade de administrar um país rachado politicamente e endividado muito antes do coronavírus.
O ano de 2020 exigiu que Fernández fosse um equilibrista num contexto que, sem pandemia, já era complexo. O saldo, em seu primeiro ano no poder, tende a ser positivo dadas as condições.
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Houve ainda quem corrigiu a trajetória. Os questionados primeiros-ministros britânico, Boris Johnson, e de Israel, Benjamim Netanyahu, viam suas respectivas popularidades despencarem em contextos distintos. Ambos perceberam a tempo os benefícios políticos de levantar a bandeira da vacinação.
Com estratégia negacionista similar à de Trump, Johnson, que iniciou mandato há menos de dois anos, reviu a postura após ser infectado pela Covid-19 e foi voz ativa na manutenção de medidas sanitárias no Reino Unido. Atualmente o britânico vai ganhando popularidade à medida que a imunização avança.
Netanyahu, investiu em uma campanha de vacinação tão bem-sucedida que fez de Israel o país que mais vacina proporcionalmente no mundo.
Em meio a julgamentos por corrupção, fraude e abuso de poder, a vacina deu a ele sobrevida para disputar novamente o cargo nas eleições de março deste ano.
Série de reportagens que marca um ano da pandemia de Covid-19 no Brasil